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De antena ligada nas HQs, cinema-pipoca, RPG e afins

P de Pop e de 'Pluft' na Mostra

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Por Rodrigo Fonseca
Atualização:

RODRIGO FONSECA Filmes calcados na dimensão transcendente da imaginação infantil tendem a ser a maior diversão para qualquer evento que se proponha a dialogar com plateias mirins (e com seus pais) - o que é o caso da Mostra de São Paulo e sua relação com "Pluft, o Fantasminha". Vai ter um lugar de honra pro ensaio de Rosane Svartman sobre amizade na grade do evento paulistano, neste domingão. Vai ter exibição dele às 16h, no Circuito Spcine Ceu Perus. É uma narrativa que desafia a forma com que falamos de seres do Além. E o faz com muita doçura. Sua aguda metafísica nos leva a pensar sobre o passado. Gasparzinho já era camarada das histórias em quadrinhos há uns três anos quando o teatro brasileiro foi apresentado a Pluft, por Maria Clara Machado (1921-2001), em setembro de 1955. Foi amor ao primeiro assombro entre os dois. Um amor que agora vai contagiar a Mostra SP, consolidando as proficiências narrativas da roteirista e autora de novelas Rosane Svartman em sua vertente realizadora. Mais conhecida como "cineasta da palavra", à frente de uma filmografia que traduziu uma geração no fim dos anos 1990, em "Como Ser Solteiro" (1998), Rosane sempre fez filmes onde o bom diálogo arrematava suas reflexões sobre a arte de amadurecer, seja em que idade fosse. Deu pra gente a joinha de romcom "Mais Uma Vez Amor", em 2005, injetando brasilidade num módulo forjado por Meg Ryan e Goldie Hawn. Mas sempre se abriu a experiências irônicas no curta-metragem, como foi o caso de "O Cabeça de Copacabana" (2000), no qual a saliva era a argamassa dramatúrgica de seu dispositivo de observação de mundo. Em Rosane, sempre... ou quase sempre... é o verbo que sintetiza ação, transformação, indignação, descoberta. O "quase" é por conta de "Pluft, o Fantasminha", que é pura cinemática, lembrando os feitos dos Trapalhões nas peripécias dos irmãos Marx chamados Julião (Hugo Germano), João (Lucas Salles), Sebastião (Arthur Aguiar) para ajudar o Bem a vencer o Mal e espantar o temporal.

Tendo esses três (hilários em igual medida) como vetor de empuxo, Rosane patina pela pista do risco (leia-se de destreza) de maneira surpreendente. Sua volta às telas é graciosa do começo ao fim de uma enxutíssima narrativa, vitaminada pela ouriversaria de Fabiana Egrejas na direção de arte. Sua versão para o pilar sobrenatural do teatro infantojuvenil nacional parece uma "Sessão da Tarde" dos anos 1980. É meio Chaves (no lendário episódio do gato Satanás), meio Goonies, com orégano a gosto. Um orégano de efeitos visuais incomum ao nosso audiovisual, que injetam verossimilhança a um ensaio duplo sobre empoderamento. De um lado, uma menina, Maribel (Lola Belli, serelepe que só), aprende a ser senhora de seus medos, em uma casa povoada por espectros; do outro, o fantasminha do título, vivido por um Nicolas Cruz todo pimpão, aprende como perder seu pavor de gente. A tensão que os aproxima é uma sucessão de peripécias envolvendo uma figura vilã mais próxima do Racha-Cuca do que do Capitão Gancho: o pirata Perna-de-Pau. É um personagem com loops de humor e de selvageria, meio bronco e meio clown como todo bom malvadão do universo de dentes de leite, que transforma Juliano Cazarré num Seu Madruga com olho de vidro e cara de mau, testando todo o seu farto ferramental cênico. "Pluft" é dele! Mas há brilho de sobra pra José Lavigne, coautor do roteiro com Cacá Mourthé, que esbanja domínio sobre o código fabular das tramas para crianças no papel do Tio Gerúndio; e para Simone Mazzer. Esta emprega seus dotes de cantora para deixar as canções de Merluza, crooner de um bar de bucaneiros, grude em nossos tímpanos. Rosane fez mais do que uma boa adaptação. Foi muito além da verborragia. Ela fez fricção entre Tempo e Espaço nas franjas do lirismo. Exercício criativo de gente grande... pra gentes das mais variadas idades.

 Foto: Estadão

Entre as atrações mais potentes da Mostra neste domingo, valorize a sessão de "O Clube dos Anjos", de Angelo Defanti. Esbanjando elegância na direção de arte de Fernanda Carlucci, esta imersão na prosa de prosa de Luís Fernando Veríssimo consagra a potência estética da fotografia de Rui Poças numa "narrativa de gabinete", centrada em uma série de jantares suntuosos, indo de paella a picadinho. Na trama, um grupo de velhos amigos ve? os lac?os de amizade remendados num nababesco banquete proporcionado por um cozinheiro misterioso, interpretado por um mefistofélico Matheus Nachtergaele. A comilança desse povo é regada a temperos mortais, testemunhadas, em fluxos de pensamento e imagens de VHS por um taciturno personagem vivido por Otávio Müller. Onde ver: às 20h15, no Espaço Itau Augusta 1. A Mostra segue até o dia 2/11. Em sua reta final, uma das principais atrações do evento é a exibição do cult "Eu Te Amo" (1981) em tributo a Arnaldo Jabor, no dia 27, na Cinemateca Brasileira.

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