Foto do(a) blog

De antena ligada nas HQs, cinema-pipoca, RPG e afins

'Regra 34' fez Locarno vibrar

PUBLICIDADE

Por Rodrigo Fonseca
Atualização:

RODRIGO FONSECA Em pleno ar, num voo Paris x Galeão, quando o Brasil soube da vitória de Julia Murat na briga pelo Leopardo de Ouro, o P de Pop cantou a pedra da potencial (vertida em factual) consagração de "Regra 34", na Suíça, logo após sua projeção oficial, na quarta passada. Ao fim da exibição a crítica europeia louvou sua análise política e dua montagem, pontuando o detalhismo de sua direção de arte. Ao mesmo, "Big Bang", de Carlos Segundo, uma produção ambientada em Uberlândia, consolidava seu prestígio na seção Curtas de Autor. Assim como Julia, Segundo saiu de Locarno laureado. E vale destacar que foram agraciados com láureas imponentes os dois outros concorrentes de longa metragem que foram tão bem falados como o filme de Julia. De um lado, temos "Gigi la Legge", de Alessandro Comodin, da Itália, que ficou com o Prêmio do Júri. Do outro, há "Tengo Sueños Eléctricos", de Valentina Maurel, da Costa Rica, que recebeu os troféus de melhor direção, atriz (Daniela Marín Navarro) e ator (Reinaldo Amien Gutiérrez).

Amparado num boca a boca extremamente positivo (e caloroso) que conquistou em Locarno, em especial no gosto da imprensa suíça, germânica e britânica, "Regra 34", de Julia Murat, conquistou o Leopardo dourado no encerramento da 75. edição do festival suíço neste sábado, cercado de loas. Trata-se de um ousado (e necessário) estudo sobre os fantasmas do sexismo e do machismo na sociedade carioca, aplicável a todo o país, que explicita uma natureza sociológica no cinema de Julia Murat, sem deixar de lado traços marcantes de sua obra autoral. Dança-se em cena, como sempre se vê em seus longas, em situações de catarse. E essa dança é sempre uma metáfora de um ardor por liberdade. Há já uma torcida aqui por prêmios para a atriz Sol Miranda, que arrebatou elogios com atuação fina, estruturada a partir de um farto ferramental dramático, que fica ainda mais forte num duo com Bianca Comparato, em cena.

 Foto: Estadão

Sol vive uma estudante de Direito que embarca em práticas sexuais BDSM (prazer com dor) e encontra da asfixia uma curiosidade que fascina e põe em xeque suas novas formas de curtir sua libido. Ao levar um soco acidental de uma colega (papel de Bianca) em suas aulas de kung fu, ela fica ainda mais aberta à associação de atos dolorosos o sexo, como se deixar queimar pela ponta de um cigarro aceso. Mas a cena em que amarra um plástico bolha em seu pescoço carrega um simbolismo gigante nestes tempos de conservadorismo reinante. Há cinco anos, o longa anterior de Julia, "Pendular", saiu da Berlinale 2017 com o Prêmio da Crítica, votado pela Federação Internacional de Imprensa Cinematográfica (Fipresci). "Julia entra nesta seleção como expoente de uma grupo de cineastas autorais que realçam o próprio estilo, consolidando voz própria", avalisa o crítico suíço Giona A. Nazzaro, o curador e diretor artístico de Locarno, ao Estadão. "Ela é parte de uma geração jovem de artistas que já formaram conceitos formais, sempre se pondo ao risco". Uma sequência em especial de "Regra 34" causou alumbramento em Locarno: o momento em que um jurista (vivido por Rodrigo Bolzan) faz uma análise filosófica sobre os impases do Direito Criminal brasileiro e sua impossibilidade prática de servir à sociedade de maneira plural. A personagem de Sol está na plateia desse colóquo e sai dele com dúvidas que serão essenciais para o roteiro no jogo de espelhamento composto pela diretora numa reflexão sobre submissão, controle e autoafirmação. Locarno foi realizado de 3 a 13 de agosto, tendo sido inaugurado com uma projeçação de "Trem-Bala", com Brad Pitt. Vale destacar a láurea de júri popular dada ao comovente filme suíço "Last Dance".

Tudo Sobre
Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.