O saldo de recursos estrangeiros na B3 em novembro promete ser o maior deste ano e também para o mesmo mês desde 2020 após três meses consecutivos de retiradas. A virada foi induzida pelo alívio da pressão no cenário de juros dos Estados Unidos, sazonalidade e fatores internos, segundo especialistas ouvidos pelo Estadão/Broadcast.
Até quinta-feira, 23, a entrada de capital externo somava R$ 15,967 bilhões. Em novembro de 2020, a B3 recebeu cerca de R$ 31 bilhões em recursos estrangeiros, maior marca da série de dados mensais, iniciada em 1995. Em 2023, o saldo é de R$ 22,335 bilhões.
“O que explica é o Fed (Federal Reserve, o Banco Central americano)”, resume o diretor de investimentos da Nommos Beto Saadia, referindo-se à mudança das expectativas para a política monetária do banco central americano. Segundo ele, após inflação ao consumidor dos EUA estável em outubro ante setembro, o mercado “comprou” outra história. “Com a aposta em quando o juro vai cair, o dinheiro buscou mercados com taxas maiores, como o Brasil.”
O Bank of America (BofA) vê espaço para uma narrativa doméstica positiva daqui para frente, com as taxas dos EUA “finalmente descendo”, conforme relatório. Há certo alívio após o pico histórico dos retornos dos Treasuries em outubro. Na ocasião, a perspectiva de uma política monetária restritiva por longo período gerou saída de quase R$ 2,9 bilhões da B3, o pior resultado para o mês em três anos.
Em dólar, o Ibovespa sobe quase 14% em novembro, enquanto o índice da Bolsa do México avança 13%, cita o BofA. “O principal fator para o desempenho superior do Ibovespa foi o minério de ferro. Os mercados globais continuaram a subir devido às taxas mais baixas dos EUA”, comenta o banco.
O economista Pedro Paulo Silveira concorda que, “no relativo, o Brasil se destaca entre os emergentes, está bem”. “E também há uma percepção de risco global em queda”, afirma. O economista Silvio Campos Neto, da Tendências Consultoria, cita a China como um fator positivo. “Também ajuda, está tentando estabilizar sua economia”, diz.
Saadia, da Nomos, acrescenta que a balança comercial “absurda” é outra explicação para a forte entrada de recursos externos na B3. Até a terceira semana de novembro, o superávit comercial acumulado no ano é de US$ 86,512 bilhões. “Naturalmente isso traz fluxo”, considera.
Também internamente, a desinflação é uma boa notícia. Ao mesmo tempo, ainda que esse processo resgate o debate de torno da possibilidade de a Selic terminar o ciclo de queda abaixo de um dígito, ou seja, menos atrativa que uma taxa maior, o nível ainda é elevado e atrativo a investidores, e as condições do Brasil são consideradas melhores que as de seus pares.
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No cenário fiscal, apesar da manutenção pelo governo da meta de déficit zero em 2024, os desafios do País limitam o desempenho do mercado. “É um fator que causa apreensão, pode segurar o câmbio, a curva de juros e acabar batendo na própria Bolsa”, pondera o profissional da Tendências.
Silveira alerta que a preocupação com contas públicas permanece, ainda mais após o Ministério do Planejamento elevar sua projeção de déficit primário para R$ 177,4 bilhões em 2023, ante estimativa anterior de -R$ 141,4 bilhões. “O mercado precisa digerir a realidade fiscal. Esses números podem deixá-lo mais cauteloso. Mas não mudam a perspectiva de alta do Ibovespa e do fluxo”, acredita o economista.
Cenário interno
Enquanto monitoram o andamento, no Congresso, das medidas para aumentar a arrecadação e zerar o déficit das contas públicas, os investidores têm dúvidas em relação ao fato mais recente: o veto do presidente Lula à desoneração da folha de pagamento a 17 setores da economia. A questão é se o Congresso derrubará.
“Talvez a história não seja encerrada a partir desse veto, pois sabemos que há bastante pressão dos setores envolvidos nessa matéria. Além do mais, houve revisões nas projeções de déficit. A vitória foi manter a meta fiscal, foi um sinal positivo”, avalia a economista-chefe da Veedha Investimentos, Camila Abdelmalack.
Campos Neto, da Tendências, considera que no curto prazo, há espaço para ingresso de fluxo estrangeiro. “Mas talvez não em larga escala.”