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A meta de inflação

Lula pode repetir o erro de Dilma ao defender uma meta de inflação mais elevada

colunista convidado
Foto do author Affonso Celso Pastore
Por Affonso Celso Pastore

Em um surto de populismo, Lula abriu uma campanha para ridicularizar a independência do Banco Central e elevar a meta de inflação. Sua proposta supõe que, com uma meta mais alta, os juros reais seriam mais baixos, o que aceleraria o crescimento. Além de ignorar que o BC não fixa a taxa real de juros, e sim a taxa nominal, esquece que se chega à taxa real subtraindo da taxa nominal de juros a inflação esperada, e que esta somente gravitará em torno da meta de inflação caso o BC tenha plena liberdade de fixar a taxa nominal de juros.

O ataque à independência do BC é também um ataque à sua capacidade de manter a inflação ancorada à meta. Mais grave ainda é ignorar que inflações da magnitude da que atualmente existe no Brasil decorrem da expansão da demanda agregada, para a qual contribui uma política fiscal expansionista. Há um conflito fiscal-monetário, e a atitude responsável de um presidente em início de mandato seria resolvê-lo atacando o excesso de gastos públicos com a implantação de um arcabouço fiscal que garantisse a sustentabilidade da dívida, e desse ao BC o respaldo para baixar os juros.

Ao defender uma meta de inflação mais elevada, Lula pode cometer o mesmo erro de Dilma. Foto: Wilton Junior/Estadão Foto: WILTON JUNIOR

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Contudo, em vez de orientar seu governo para a execução de políticas públicas voltadas para o bem comum, prefere elevar o tom do discurso típico de um populista em campanha eleitoral. Podemos perdoá-lo por desconhecer a teoria econômica, mas não por ignorar nossa própria história. Por exemplo, entre 2005 e 2012 os juros reais caíram devido aos superávits primários, parte dos quais ocorridos durante seu segundo mandato. Já a partir de 2013, a opção de Dilma pelo “gasto é vida” fez ressurgirem os déficits, o que elevou as taxas reais de juros. Uma nova queda de juros reais ocorreu após a aprovação do teto de gastos, e um novo ciclo de aumento teve início com os sucessivos furos no teto.

Ao ignorar nossa própria história, se esquece que em 2011 Dilma convenceu o BC a operar com meta implícita de inflação mais alta, com resultado idêntico ao do aumento da meta oficial. A combinação dessa “mágica” com a política fiscal expansionista levou à desancoragem das expectativas e ao arrocho monetário que provocou a extensa recessão de 2014/16.

O alerta emitido pelos dados é de que há em marcha um forte crescimento das taxas esperadas de inflação. Se não quiser repetir o desastrado experimento de Dilma, Lula terá de entender que elevar a meta de inflação equivale a apagar o fogo com gasolina. Cabe aos dois ministros que, junto com o presidente do BC, compõem o Conselho Monetário Nacional rejeitar essa proposta.

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