Com o envelhecimento crescente da população, a assistência aos idosos, em especial aos que têm dificuldade de mobilidade e de comunicação e são dependentes de terceiros até para a realização de tarefas do dia a dia, vem se tornando um problema dramático no País, que até agora não foi enfrentado para valer pelos governantes.
Diante dos altos custos de contratação de cuidadoras particulares e dos preços exorbitantes cobrados por residenciais especializados, que oferecem alimentação e assistência médica aos moradores, o cuidado dos idosos, principalmente dos que perderam a autonomia, acaba muitas vezes ficando sob responsabilidade de algum membro da família, mesmo em núcleos familiares de classe média e até média-alta. E, se a situação já é complicada nestes casos, nas faixas de menor renda, então, nas quais os familiares têm de sair para trabalhar e deixam os idosos sozinhos durante boa parte do dia ou da noite, nem se fala.

Foi pensando nos idosos mais carentes e nos que vivem praticamente sozinhos sem autonomia total que a prefeitura de Belo Horizonte implementou o programa Maior Cuidado, que foi um dos destaque da edição de 2024 do Mapa da Contratualização, produzido pela Comunitas, uma organização dedicada à melhoria da gestão pública. Também teve um papel relevante na decisão de implantar o programa a demanda crescente pelo acolhimento de idosos em abrigos, cujo custo chega a cerca de R$ 10 mil por pessoa, conforme informações da prefeitura.
Criado em 2011, o programa está disponível nas regiões dos 35 Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) existentes na cidade, cada um reunindo cerca de 5 mil famílias. Mas, segundo estudo realizado pelo município, seriam necessários mais 120 CRAS para o programa atingir todas as áreas de vulnerabilidade social. Ainda assim, trata-se de uma inciativa que vem alcançando resultados auspiciosos, com o atendimento de cerca de 8 mil idosos até agora, de acordo com dados da prefeitura, dos quais apenas 6% acabaram encaminhados para unidades de acolhimento institucional.
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Pelas características idealizadas para o programa, pelo perfil que os profissionais da área precisam ter e pela alta rotatividade de trabalhadores que a atividade costuma registrar, a prefeitura optou pela realização de uma parceria com uma organização da sociedade civil (OSC) – o Grupo de Desenvolvimento Comunitário (GDCOM) – para a prestação do serviço, após a realização de um edital de chamamento público no qual ela saiu vencedora.
Com um custo de cerca de R$ 500 mil por mês ou R$ 6 milhões por ano, conforme os números da prefeitura, a parceria envolve o cumprimento de metas pela OSC, que tem de produzir relatórios periódicos sobre os atendimentos para avaliação da eficácia do programa. Segundo José Crus, ex-subsecretário de Assistência Social e hoje analista de políticas públicas da prefeitura, o custo per capita do programa, cuja capacidade de atendimento é de cerca 800 idosos, fica em quase R$ 700 por mês, o equivalente a apenas 7% do valor que a prefeitura gastaria por pessoa num abrigo.
O programa, que opera em conjunto com a área de saúde do município, prevê a realização de atendimento domiciliar pela OSC e funciona de forma proativa, com a identificação dos idosos que estão com vínculos fragilizados e em situação de vulnerabilidade nas áreas cobertas pelo serviço. “Uma OSC tem muito mais flexibilidade para realizar o cuidado no domicílio, que é muito complexo. Imagine se isso fosse feito por servidores, com a rotatividade que um programa desses tem de profissionais? Como é a prefeitura conseguiria resolver isso com agilidade respeitando as regras de contratação do setor público?”, afirma Crus.
Pelos termos da parceria, o atendimento varia de vinte a trinta horas semanais por idoso, conforme as necessidades de cada um. Durante esse período, os cuidadores, a maioria dos quais são mulheres, ajudam os idosos a sair da cama, comer, fazer a higiene pessoal, tomar medicamentos e realizar atividades diárias. Quando possível, de acordo com Crus, há casos também em que os cuidadores acompanham os idosos até a porta de casa, para eles poderem ver o movimento na rua, ou até uma praça ou jardim nas proximidades.
Situações adversas
Os cuidadores, conforme o contrato de parceria, têm de passar por curso de 200 horas antes de atender os idosos, para ter o conhecimento necessário e realizar o atendimento com qualidade e segurança. Além disso, eles também passam por um teste de aptidão, para avaliar suas habilidades e suas capacidades de interação com os idosos e de enfrentar situações adversas durante o atendimento.
Considerando que, hoje, no Brasil, os idosos estão praticamente deixados à própria sorte, principalmente nas faixas de menor renda, o programa Maior Cuidado, operacionalizado por meio de uma parceria da prefeitura de Belo Horizonte com uma OSC, já é um alento e tanto.