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‘Quem apresentar atestado médico falso vai responder criminalmente’, diz presidente do INSS

Alessandro Stefanutto projeta que o governo pode economizar R$ 10 bilhões em 2024 com medidas de combate à fraude e quer baixar o tempo de espera na fila de concessão de benefícios para 30 dias

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Atualização:
Foto: Roneymar Alves/Ascom INSS
Entrevista comAlessandro Stefanuttopresidente do INSS

BRASÍLIA - O presidente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Alessandro Stefanutto, afirma que o governo será “duríssimo” com quem apresentar um atestado falso para obter um benefício previdenciário. Os fraudadores terão de responder criminalmente pelo ato ilegal. “Nós temos bala na agulha para quem apresentar resultado falso responder criminalmente. Nós não vamos tolerar”, alerta.

Stefanutto projeta que o governo pode economizar R$ 10 bilhões em 2024 com medidas de combate à fraude. Em entrevista ao Estadão, ele afirma que o atendimento nas agências será reforçado e traça metas para reduzir o prazo para o segurado ser atendido na fila. Até o fim deste ano, ele espera reduzir o prazo de permanência na fila de pedido de benefício do INSS para 45 dias - em novembro, a média era de 56 dias. Em 2024, a meta é cair para 30 dias.

Ele conta que o INSS está antecipando as perícias, mas muitos segurados não querem ser atendidos antes para receber um valor maior. “Eles dizem: ‘Fui orientado pelo meu intermediário a não falar’. Às vezes, o número do contato é do escritório do intermediário. Muitos se apropriam do segurado para arrancar dinheiro”, diz.

Alessandro Stefanutto afirma que o governo será 'duríssimo' com quem apresentar um atestado falso para obter um benefício previdenciário. Foto: Roneymar Alves/Ascom INSS

A seguir, os principais trechos da entrevista.

Como está o programa de enfrentamento da fila do INSS?

O importante da fila não é se tem um, dois, três milhões (de pedidos), mas o tempo em que essas pessoas são atendidas. Às vezes você vai num restaurante e está vazio, mas o prato demora duas horas. E tem restaurante que está cheio, mas o prato chega a tempo e quentinho. Embora o número da fila tenha diminuído, para nós está aquém do que eu gostaria. Mas o mais importante é o tempo (de espera); e nisso realmente a gente tem avançado.

A fila deve dar um pouco menos de 1,6 milhão (de pessoas) neste mês. Eu recebo, por mês - um pouco mais, um pouco menos -, 1 milhão, 900 mil. Se eu pegar o prazo de 45 dias, que é um mês e meio, a minha fila vai estar em 1,350 milhão. Então, eu até estou próximo. Mas esse número não me anima e nem me incomoda. O que me incomoda é o tempo médio para a concessão, que está em 56 dias - o nível mais baixo em três anos. Nós vamos trabalhar, até 31 de dezembro, para chegar em 45 dias.

O sr. tem metas para 2024 do prazo de atendimento?

Chegar em 30 dias em dezembro do ano que vem. Por que 30 dias? Em 45 dias, a pessoa fica sem renda ainda. O mais importante é a mudança de modelo de perícia. Mesmo com a medida de enfrentamento da fila, que é emergencial, de tiro curto, as pessoas não podem viver de programa de enfrentamento. Temos de arrumar as coisas de tal sorte que elas funcionem.

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Como fazer isso?

Estamos evoluindo para um modelo de atestado, o Atestmed, para aqueles benefícios de curta duração, como o antigo auxílio-doença, que hoje se chama auxílio incapacidade. Esses benefícios ocupam 60% da minha agenda de perícia. Em no máximo 15 dias, o benefício está sendo concedido. Com o Atestmed, estou conseguindo fazer cruzamentos dos atestados e agora estamos instalando inteligência artificial.

Nessa nova realidade de uso de inteligência artificial para análise de 100% dos atestados, como fica o papel do perito?

Esse modelo está sendo utilizado para a perícia inicial do primeiro benefício de auxílio incapacidade. Todo auxílio por incapacidade por até 180 dias, em algum momento, será obrigatório só o uso de atestado (o Atestmed). Hoje, é facultativo. A pessoa pode optar pelo atestado ou fazer a perícia. Quem prefere perícia, e eu não quero aqui falar de todos, quer que demore.

Por quê?

Para receber mais salários. Às vezes, está orientado por intermediários que querem uma porcentagem. Então, quanto mais tempo demorar, melhor (para eles). Com essa medida do atestado médico, conseguimos diminuir a necessidade de perícia. Tinha um déficit de perícia e agora eu tenho um superávit. Eu tenho mais perícia disponível do que eu uso todo mês. Com essas perícias sobrando, vamos adiantar as perícias das pessoas. E acionamos o nosso canal de contato 135 para fazer o que a gente chama de chamada ativa. E pasmem: um número importante não quer adiantar. Eles dizem: ‘Fui orientado pelo meu intermediário a não falar’. Às vezes, o numero do contato é do escritório do intermediário. Muitos se apropriam do segurado para arrancar dinheiro.

Quais as consequências?

Isso é resultado de uma política de afastamento da população do órgão. O que nós estamos querendo é aproximar, para as pessoas sentirem confiança de se conectar diretamente ao INSS. Se o nosso serviço está ruim, sempre vai aparecer alguém dizendo “eu corto a fila”. Eu tive um gerente de Barreiras, na Bahia, que me falou que tinha 24 perícias marcadas numa agência e ninguém apareceu. Ele descobriu que um determinado intermediário agendava pessoas com CPFs reais e ficava vendendo vagas para terceiros dizendo que conseguia (vaga). De madrugada, ele cancelava e entrava com o pedido. Conforme aprofundamos a troca do modelo, começamos a ver desdobramentos que não imaginávamos. Nós já temos uma perda natural de perícias, de 25% de pessoas que não comparecem. Não sei dizer a razão. Essa média diminuiu, quando passamos a ligar para as pessoas para avisar. Estamos fazendo uma prova de conceito com a Claro, e podemos fazer com qualquer outra empresa de telecom, para avisar as pessoas e adiantar as perícias.

Há fraudes também na ação de peritos e servidores do órgão?

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A fraude praticada por funcionários, que também é minoria - seja de peritos ou de servidor administrativo -, é tratada de diversas formas. O INSS é o órgão que mais demite na Esplanada. Eu não me orgulho disso, que fique claro. Se alguém ligar e denunciar, vamos apurar. Recebemos denúncias diariamente que são apuradas. O que vai me ajudar - e quando eu defendi o Atestmed - é que, além de eu facilitar a vida do cidadão, vamos poder diminuir fraudes. A inteligência artificial pega a letra da médica, o nome do hospital, o carimbo. Isso muda totalmente. Não é bravata: nós temos bala na agulha para quem apresentar resultado falso responder criminalmente, e cada vez mais.

Como isso será feito?

Todos os casos que nós identificarmos nós vamos mandar para Polícia Federal. Eu conversei pessoalmente com o delegado-geral da Polícia Federal, que é o Dr. Andrei (Rodrigues). Nós estamos combinando o fluxo, eu já remeti os primeiros casos (de fraudes detectadas). Nós não vamos tolerar, passar a mão na cabeça ou ter aquela cultura de tolerância. Vamos ser duríssimos com aquele brasileiro que está pondo a perder o atestado, até por uma questão didático-pedagógica. Pegou, é criminal. É capaz até de a pessoa ter prisão preventiva decretada e ser presa. A pessoa tem de entender que está fraudando o erário público.

O INSS pretende continuar pagando um bônus para os peritos fazerem o trabalho deles?

O perito tem um papel muito importante, desde que as coisas sejam feitas em condições normais de temperatura e pressão. Uma perícia feita seis meses depois não é uma perícia; é um exame documental. Eles não vão ser extintos. A carreira é importante. Para as atividades simples, eu não preciso mobilizar um perito. Para as atividades complexas, a perícia é fundamental, como a aposentadoria por invalidez e BPC para pessoas com deficiência.

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O pagamento do bônus aos peritos vai continuar?

Estamos fazendo o bônus e tem ajudado porque temos um estoque grande. O estoque vai se estabilizar e não vamos mais precisar de bônus. O bônus mostra que o sistema está doente. A fila é um sintoma de uma doença, que é: estruturalmente, eu não estou dando conta. Não queremos, de forma alguma, permanecer eternamente com bônus, mas hoje é um mal necessário.

Os ministérios da Fazenda e do Planejamento contam com o combate a fraudes, baseado num estudo do TCU, para economizar com despesas do INSS no ano que vem. É possível?

Fizemos uma remessa (de dados) para a lei orçamentária dizendo que nós temos potencial de economizar R$ 10 bilhões. Dentro desse valor, está a devolução de gente que morreu. Nós melhoramos muito o pós-óbito. Hoje, se a pessoa morreu, raramente fica recebendo. Tem um grupo de trabalho exatamente para apontar exatamente as medidas. Uma delas é o Atestmed. Ele já está demonstrando que estamos tendo menos gastos. Quando tiver a inteligência (artificial), vamos economizar ainda mais. Eu não gosto do termo pente fino, porque brasileiro não é piolho para ficar sendo pego. Acho que é desrespeito quando se fala assim dos brasileiros. Eu não vejo como primeira medida uma revisão de chamar todos. Eu acho que é um esforço enorme, um desgaste da população, e que não tem o efeito esperado. Vamos economizar dinheiro e investir em inteligência.

A economia poderá ser maior do que R$ 10 bilhões?

Pode ser mais se fizermos outras medidas. Por exemplo, nós temos potencial de aumentar nossos ganhos com a folha de pagamentos. Nós leiloamos a nossa folha de pagamentos e vamos leiloar no ano que vem de novo. Os bancos pagam para a gente para pagar o benefício. Vencem a cada cinco anos e temos de leiloar. Cada banco paga uma quantidade para a gente. Recebemos por ano R$ 6 bilhões dos bancos. Nós acreditamos que isso pode ser melhorado. Estamos contratando a UFRJ para fazer o estudo da folha. Tanto a licitação quanto talvez uma renegociação implica em ganhos. A folha do INSS é de 39 milhões de brasileiros.

Quais são os planos para melhorar as agências?

Nós pensamos em fazer um reforço de pessoal nas agências por meio de estagiários de terceirização, qualificados, não é terceirizado que vem cru. Humanizar (o atendimento) passa por entregar rápido o benefício da pessoa, porque mais de 30 dias é desumano; estamos caminhando para ficar abaixo dos 45 dias. E tornar o atendimento mais pessoal, presente, também é importante para a humanização. Meu pai não entra no “Meu INSS”. Ele diz: “Não consigo, vocês têm de melhorar isso”. Um homem de 87 anos, que mexe no celular e conversa pelo WhatsApp. No próximo ano, vamos fazer alterações para que a nossa linguagem seja própria para as pessoas que usam de forma básica a internet, sem prejuízo das agências.

Muitos segurados querem ter o contato presencial na agência, até por dificuldade de se conectarem com o mundo digital...

Todo mundo vai ter uma história com o INSS, porque ele atende 39 milhões de brasileiros que recebem o benefício em dia e tem mais 60 milhões que são contribuintes. Existem 100 milhões de brasileiros com relação com o INSS. Então, é natural que tenha casos positivos e negativos. Por que nós conseguimos com o Atestmed, em dois meses, pôr de pé e fazer os atestados pularem de 300 para 11 mil por dia? Nós facilitamos o acesso. É uma senha mais simplificada. Nós percebemos que temos de fazer melhorias no “Meu INSS”, mas também retomar o atendimento em todas as agências. O Atestmed é feito em todas as agências para ter o benefício. Quem não consegue fazer pelo atendimento eletrônico pode fazer nas agências. As agências estão esvaziadas. Tínhamos 43 mil servidores em 2010, 2011, e hoje temos 19 mil. Com a pandemia, se agudizou a digitalização do atendimento, o que é muito bom; mas nós temos um público diverso. Recebemos um milhão de pessoas por mês nas agências. No “Meu INSS”, temos 60 milhões de acessos sem repetir usuário. Mas eu tenho plena convicção de que temos de voltar a atender nas agências também; ainda que de outra forma. O mundo mudou. Temos 1.600 agências. O nosso servidor hoje não é mais aquele que estava na porta da agência, dava um carimbo, assinava alguma coisa. Ele hoje faz matéria de altíssima complexidade.

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