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Estatais de saneamento pedem ao governo para prorrogar contratos sem licitação, apesar de veto

Pauta foi defendida em reunião na Casa Civil pela Associação Brasileira das Empresas Estaduais de Saneamento; extensão desses contratos é vetada desde 2020 pelo marco legal do saneamento

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Por Amanda Pupo (Broadcast)
Atualização:

BRASÍLIA - O governo Lula debateu nesta semana com associações de empresas de saneamento a possibilidade de estatais de água e esgoto prorrogarem os chamados “contratos de programa”, fechados sem licitação entre as companhias estaduais e as prefeituras. A pauta foi defendida em reunião na Casa Civil pela Associação Brasileira das Empresas Estaduais de Saneamento (Aesbe).

O assunto, por sua vez, não foi dado como encerrado ou maduro, e um novo encontro com as entidades está programado para a próxima semana. A extensão desses contratos foi vetada no marco legal do saneamento, em vigor desde 2020, comando reforçado depois na regulamentação da lei.

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Ao Estadão/Broadcast, a ex-ministra e secretária executiva da Casa Civil, Miriam Belchior, classificou o clima da reunião como “muito bom e construtivo”, mas ponderou ter sido apenas uma primeira agenda, “com abordagem inicial de vários temas entre o setor público e o privado”. “Eles vão preparar propostas concretas a serem discutidas na próxima semana”, afirmou.

O presidente da Aesbe, Neuri Freitas, disse que, se aceitas pelo governo, as prorrogações poderiam ser liberadas por meio de decreto, sem alterar a legislação. Na prática, a ideia é permitir que os contratos das estatais sejam reequilibrados para comportar mais investimentos e atender às metas de universalização cobradas pelo marco legal. Para acomodar isso, a recomposição do contrato via extensão de prazo seria permitida - prática hoje vedada por um dos decretos que regulamentam o marco legal. A extinção dessa regra, junto de outros ajustes, tem potencial de dar uma “segunda chance” a centenas de negócios de estatais que teriam de sair dos municípios por não conseguirem comprovar capacidade de investimento, como exige a nova lei.

A apenas 32 km do Congresso, Favela do Sol Nascente, no Distrito Federal, não tem tratamento de esgoto. Foto: Dida Sampaio/Estadão  Foto: Dida Sampaio/Estadão

A Aesbe já briga para emplacar essa proposta há algum tempo, mas, durante o governo Bolsonaro, não houve espaço de negociação. Segundo Freitas, o assunto foi levado pela entidade em reunião na Casa Civil realizada na terça-feira, 31, com a presença do ministro Rui Costa, de Miriam Belchior, do ministro das Cidades, Jader Filho, e de representantes da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon).

“Ainda não estamos com 100% de alinhamento. Mas considero que vamos conseguir chegar num alinhamento. Não sei em que termos, mas acho que conseguiremos. Porque, deixando como está, vamos acabar deixando os municípios nesse tipo de situação prejudicados”, disse o presidente da Aesbe. Segundo ele, a ideia é que o setor e o governo se reúnam semanalmente para “afunilar” e tomar uma decisão sobre as propostas postas em mesa pelas entidades.

Outro ponto importante debatido na reunião, sobre o qual existe um consenso entre as empresas públicas e privadas, é a derrubada do limite de 25% do valor do contrato para as estatais de saneamento fecharem parcerias público-privadas (PPPs). Como mostrou o Estadão/Broadcast, essa demanda é levantada pelas empresas desde a campanha eleitoral e também pode ser atendida por decreto.

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O governo é simpático à ideia. O ministro da Casa Civil, que é ex-governador da Bahia, já deu indicativos de que quer destravar as PPPs no setor. A diferença entre esse instrumento e as concessões está no modelo de operação. No caso da concessão, a estatal sai da jogada, e um novo prestador dos serviços é escolhido em leilão. Já a PPP tem maior apelo entre governadores e políticos, uma vez que a empresa pública é mantida, e a iniciativa privada entra na operação como um parceiro.

Na visão da Aesbe, o fim do limite de 25% para as PPPs complementa a defesa pela prorrogação dos contratos atuais. O presidente da Aesbe diz que a combinação poderá ser usada, por exemplo, para atender a blocos regionais de saneamento, nos quais se equalizariam os prazos dos contratos entre os municípios e a estatal. Já os recursos para a universalização seriam arranjados por meio de uma PPP com a iniciativa privada ou pela captação de financiamento via bancos públicos - outra pauta discutida com o governo nesta semana.

Nesse modelo, as estatais conseguem se manter na prestação dos serviços, sem que o poder público faça licitação para escolher um novo operador – arranjo que não é bem visto por quem apoiou a aprovação do marco legal do saneamento. O questionamento que se faz é por qual razão se daria mais uma chance às estatais, após o predomínio dessas empresas por décadas não ter levado o País à universalização do atendimento de água e esgoto.

“O que estamos propondo é abrir as diversas possibilidades para que os Estados encontrem a melhor solução que caiba na realidade de cada região”, disse Freitas, para quem o governo anterior adotou uma política de “exclusão” das empresas públicas.

Fim do limite a PPPs

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O presidente da Aesbe diz acreditar que, em relação ao fim do limite para as PPPs, o setor será atendido pelo governo. “Sentimos que o governo está muito sensível a realizar essas modificações com a ideia de acelerar. A fala do ministro Rui Costa foi bem clara. Precisamos de propostas que acelerem no País os investimentos no saneamento, e uma delas é essa retirada da limitação”, disse Freitas.

No Congresso, o antigo Ministério da Economia insistiu pela limitação em 25% sob o argumento de que a proliferação de PPPs elevaria a ineficiência do setor. O objetivo era impedir que as estatais se mantivessem como atravessadoras nos negócios, com impacto na tarifa. A título de exemplo, se o privado estabelece que é possível oferecer o metro cúbico de água por R$ 2, para o cliente final esse preço poderá ser maior, de R$ 3, já que R$ 1 pode ser absorvido pela empresa pública.

Freitas, da Aesbe, rejeita as críticas. Ele defende que o modelo funciona porque a estatal atende a regiões que não são atrativas para a iniciativa privada, o que exige a existência do subsídio cruzado como fonte de investimentos para atender a cidades pouco lucrativas. O presidente da entidade ainda alega que a prática não gera necessariamente sobreposição de custos. “Na verdade, estou deixando de ter custo com diversos fornecedores para ter só com um”, disse.

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