NOVA YORK - O que pensam os dirigentes do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) sobre os recentes dados da inflação nos Estados Unidos? Qual a expectativa para os preços à frente? Como a inflação e o ritmo de crescimento da maior economia do mundo devem impactar a política monetária americana? Quando os juros vão começar a cair? Em qual patamar as taxas devem estacionar no futuro? Essas são algumas das dúvidas que formam o pano de fundo para a reunião do Fed, que termina nesta quarta-feira, 1.
Maio era visto como o mês do início dos cortes dos juros nos EUA em meio à euforia dos mercados quanto à tendência desinflacionária no país. O ânimo do começo do ano, porém, caiu por terra com dados recentes dos preços nos EUA acima do esperado e reforçaram a tese do ‘higher for longer’, ou seja, juros altos por mais tempo. Assim, o Fed deve novamente deixar tudo como está, com as taxas americanas permanecendo no patamar de 5,25% e 5,50% ao ano, o maior desde 2001, na sexta manutenção seguida dos ‘Fed Funds’, os títulos públicos americanos.
Com a decisão de manutenção dos juros majoritariamente precificada - e sem a divulgação de projeções econômicas nesta reunião -, o grande foco de atenção dos mercado estará nas falas do presidente do Fed, Jerome Powell, durante a coletiva de imprensa, que acontece 30 minutos após o fim do encontro.
“Com três meses de dados ruins da inflação em mãos, Powell deve sinalizar que o Fed precisa esperar e o tempo dependerá dos dados. Pode ser três meses, seis ou muito mais”, diz o economista-chefe do Santander para os EUA, Stephen Stanley, em entrevista ao Estadão/Broadcast.
De acordo com ele, tanto a postura de Powell quanto os sinais dados pelas projeções econômicas da última reunião do Fed, que manteve a indicação de três cortes de juros neste ano, devem sair de cena. “A mensagem que ouvimos nas últimas reuniões, de que o Fed não está cortando os juros, mas pode fazê-lo provavelmente em breve, deve sumir de vez”, prevê.
Dados piores da inflação americana em janeiro e fevereiro já haviam feito dirigentes do Fed endurecerem o tom em suas últimas falas antes de entrarem em período de silêncio por conta da reunião desta semana. O número fechado do trimestre veio acima das expectativas e ajudou a embaralhar mais as projeções do mercado, que reforçou a tese de que os juros americanos vão ficar onde estão por mais tempo que o previsto.
Na sequência, o índice de preços de gastos com consumo (PCE, na sigla em inglês) dos EUA avançou a 0,3% em março ante fevereiro, em linha com as projeções da casa americana FactSet. O núcleo do indicador, que exclui itens voláteis como os preços de alimentos e energia, também veio dentro do esperado por operadores, acalmando um pouco as expectativas em Wall Street. O PCE é a medida preferida de inflação do Fed.
Agora, os mercados precificam chances de mais de 57% de o Fed cortar os juros até setembro deste ano, conforme levantamento da plataforma do CME Group.
Mas outras correntes têm crescido. O Bank of America tirou junho da mesa e transferiu a sua expectativa de um primeiro corte para dezembro. Já o Santander vê o Fed cortando os juros só em novembro e, na pior das hipóteses, somente em 2025, como alguns dirigentes do Fed tem mencionado. O Citi, por sua vez, migrou sua projeção de primeiro corte de junho para julho.
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Há, inclusive, ponderações sobre o risco de aumento de juros nos EUA. Para o Bank of America, isso aconteceria em dois cenários: aceleração da inflação principal e do núcleo ou diante do aumento das expectativas para os preços no país. “Quanto mais tempo a inflação permanecer elevada, maior será a probabilidade de as expectativas de inflação a longo prazo subirem”, diz o time de economistas do banco americano, liderado por Michael Gapen.
Balanço de ativos em foco
Economistas e operadores afirmam que o debate dos dirigentes do Fed deve girar mais em torno da desaceleração do balanço de ativos da autoridade do que propriamente quanto à política monetária. Inflado durante a pandemia para suportar a travessia do mercado pela crise, o saldo vem sendo reduzido e chegou a US$ 7,4 trilhões, segundo dados mais recentes do BC dos EUA.
A primeira discussão sobre o tema ocorreu no último encontro, em março. Na ocasião, Powell disse que o objetivo é desacelerar o ritmo de redução do balanço “razoavelmente em breve”. Ele, porém, evitou ser mais específico.
Stanley, do Santander, entende que o tema deve ganhar espaço importante na reunião, com potencial de ser um bom influenciador nos mercados. “Pessoalmente, acho que a decisão final sobre isso provavelmente ocorrerá em junho, mas poderá muito bem ocorrer nesta semana”, diz, acrescentando que uma das preocupações do Fed é não reduzir o balanço em demasia.
A Oxford Economics reforça o coro diante da expectativa de alguma novidade por parte do Comitê Federal de Mercado Aberto (FOMC, na sigla em inglês) quanto à desaceleração da redução do balanço de ativos do Fed nesta reunião. Para a consultoria, o volume mensal será cortado pela metade, para US$ 30 bilhões, começando em junho.
O Fed divulga a sua decisão de política monetária nesta quarta-feira, dia 1º, quando os mercados no Brasil estarão fechados por causa do feriado do Dia do Trabalho, às 15 horas, horário de Brasília. Trinta minutos depois, Powell concede a tradicional coletiva de imprensa para comentar os principais pontos do encontro.
O que pensam os dirigentes do Fed
Austan Goolsbee (não vota): “Até agora, em 2024, esse progresso na inflação estagnou”
Neel Kashkari (não vota): “Precisamos esperar para ver, ser pacientes o quanto for necessário, até nos convencermos de que a inflação está voltando para 2%”
Raphael Bostic (vota): “Juros nos EUA terão de permanecer em um nível restritivo e poderão começar a cair somente no fim de 2024″
John Williams (vota): “Definitivamente não sinto urgência em cortar taxas de juros”
Loretta Mester (vota): “Em algum momento, à medida que ganharmos mais confiança, começaremos a normalizar a política de volta a uma postura menos restritiva, mas não precisamos fazer isso com pressa”
Jerome Powell (vota): “Os dados recentes claramente não nos deram maior confiança e, em vez disso, indicam que é provável que demore mais tempo do que o esperado para alcançar essa confiança (para cortar os juros)”
Philip Jefferson (vota): “Será apropriado manter a atual postura restritiva da política por mais tempo”
Mary Daly (vota): “A pior coisa a fazer é agir com urgência quando a urgência não é necessária”
Jeffrey Schmid (não vota): “Com a inflação ainda acima dos 2% e os mercados de trabalho ainda apertados, é apropriado que a política monetária permaneça restritiva”
Susan Collins (não vota): “Não temos uma bola de cristal em termos de como as coisas vão sair”