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Economia e políticas públicas

Opinião|De onde veio o alívio no mercado?

Ativos brasileiros tiveram melhor desempenho nos últimos dias e visão geral é que isso derivou de relativo desanuviamento nas perspectivas de inflação e juros nos Estados Unidos. Mas Livio Ribeiro, da BRCG e do IBRE-FGV, vê uma história um pouco mais complicada.

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Há um alívio no mercado de ativos brasileiros, com o Ibovespa hoje perto de 130 mil pontos, depois de ter caído abaixo de 125 mil em abril, e o dólar a R$ 5,07, após chegado a R$ 5,27 em meados do mês passado. [a coluna foi escrita em 7/5, terça-feira]

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A explicação dominante no mercado é de que a melhora vem de fora. Mais especificamente, deriva do principal fator que tem movido os mercados globais recentemente, que são as perspectivas interconectadas sobre o mercado de trabalho, a inflação, a taxa de juros básica e os juros de mercado nos Estados Unidos.

Nessa visão, este ano houve uma deterioração forte nessas expectativas (no sentido de se esperar mais inflação e menos corte de juros na economia americana), mas o chairman do Federal Reserve (Fed, BC dos EUA), na reunião de 1º de maio, adotou um tom mais suave do que o antecipado.

Ele sinalizou, por exemplo, que não deve haver aumento dos Fed Funds, o juro básico americano, como uma fração mais alarmada do mercado chegou a cogitar.

É verdade que, tomando-se o que se via no final do ano passado e hoje, o cenário inflacionário e de juros permanece bem pior. Ninguém mais cogita de seis a sete cortes de 0,25 ponto percentual (pp) dos Fed Funds em 2024, começando ainda no primeiro semestre.

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Porém, comparado ao que se enxergava tão recentemente quanto 25 de abril, quando a rentabilidade do título de dez anos do Tesouro americano de dez anos bateu em 4,7% (hoje está em 4,45%), a atmosfera de desanuviou relativamente.

Essa melhora foi reforçada pelos números do mercado de trabalho dos Estados Unidos divulgados na sexta-feira (3/5) que, de maneira geral, vieram menos fortes do que se supunha. As bolsa americana reagiu com um expressivo rali ao discurso de Powell seguido dos números do mercado de trabalho.

No Brasil, a bolsa subiu e o dólar caiu, mas a melhora no front dos juros foi menos impressionante. Como exemplo, a rentabilidade da NTN-B com vencimento em 2026, que atingiu um pico recente de 6,3% 25 de abril, esta hoje em 6,2%, um recuo, mas não muito expressivo, considerando que no início de abril estava em torno de 5,75%.

Uma interpretação para esse comportamento do juro é que as expectativas fiscais e inflacionárias no Brasil se deterioram em abril. No primeiro caso, com a mudança das metas de primário a partir de 2025, que enfraqueceram o ajuste fiscal prometido quando o novo arcabouço fiscal foi lançado. No segundo, por dúvidas crescentes sobre como será a gestão da política monetária pelo Banco Central depois que o atual presidente, Roberto Campos Neto, sair no final do ano.

O economista Livio Ribeiro (BRCB e IBRE), no entanto, vê problemas na narrativa acima. O pesquisador tem um modelo que tenta segregar os fatores externos dos internos nas mexidas do câmbio no Brasil. O fator doméstico é dado como resíduo após se medir o efeito do fator externo.

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Ele considera que a visão do mercado aproximadamente dá conta do ocorrido de 30 de abril em diante. Mas nota que houve um movimento anterior de apreciação do real, de R$ 5,28 em 16/4 para R$ 5,19 em 30/4 no qual, segundo seu modelo, o fator doméstico preponderou.

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Ele nota que nesse último período, o DXY (câmbio do dólar contra cesta dos parceiros comerciais dos EUA) ficou praticamente parado, o índice CRB de commodities teve leve queda (o que em tese desfavorece o real), o título de dez anos do Tesouro americano quase não se mexeu e o diferencial de juros (entre o juro de um ano dos EUA e o do Brasil) caiu ligeiramente (quando sobe tende a reforçar o real). Já o CDS, medida do risco Brasil, caiu de 261 para 243,2, um movimento mais forte que os outros mencionados anteriormente.

"Eu não consigo explicar toda essa queda do CDS do Brasil em função do que aconteceu lá fora nesse período [16-30 de abril], sobra um resíduo", diz Ribeiro. De forma simplificada, no modelo do economista é esse resíduo que é considerado o "fator doméstico".

Ribeiro não se aventura a tentar uma explicação sobre que fundamento ou expectativa possam ter melhorado internamente no Brasil na segunda metade de abril. Mas apenas aponta que seu modelo torna o cenário um pouco mais complexo do que a narrativa dominante do mercado.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)

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Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 7/5/2024, terça-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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