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Fundos verdes ainda são menos de 1% do mercado no Brasil

No entanto, registram crescimento significativo por pressão dos gestores e dos próprios investidores

Embora ainda represente pequena fração do universo de investimentos no Brasil, fundos verdes registram crescimento significativo em razão de pressões por parte de gestores e do próprio investidor. Segundo especialistas, a pandemia da covid-19 colocou uma lente de aumento para problemas estruturais do País e do mundo por causa das questões social e ambiental.

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Com a demanda em alta, as instituições financeiras ampliaram essa modalidade em seus portfólios. A Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) identificou até o momento 167 fundos com algum foco em investimento sustentável ou ESG (sigla em inglês para ambiental, social e governança corporativa), embora menos da metade tenha de fato o selo verde. Do total, 44 foram criados no ano passado.

Até fevereiro, os fundos de ações com viés de sustentabilidade e governança somam patrimônio líquido de R$ 1,07 bilhão, 30% a mais do que no fechamento do ano passado e o dobro de 2019, informa Carlos Takahashi, diretor e coordenador do Grupo Consultivo de Sustentabilidade da Anbima.

Takahashi, diretor da Anbima e presidente da BlackRock: patrimôniode fundos cresceu 30% este ano Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Outra categoria de investimento, o de ETFs ESG (fundos negociados na Bolsa de Valores) passou de R$ 105,2 milhões em 2019 para R$ 277 milhões no primeiro bimestre deste ano. Esse produto ainda não tem sido muito explorado pelos bancos na versão sustentável, mas a Itaú Asset Management tem duas opções em seu portfólio, além de quatro fundos que, juntos, somam R$ 173,1 milhões.

A Itaú Asset tem sob sua gestão R$ 770 bilhões de ativos de 3,2 milhões de clientes. Renato Eid, responsável pela área de estratégia e integração ESG, afirma que o banco atua com estratégias de sustentabilidade desde 2004, mas admite que o crescimento da demanda só se intensificou nos últimos dois anos.

Segundo Eid, independentemente de ter o selo verde, a gestora de recursos analisa todos os ativos da carteira de olho nos aspectos sociais e de ESG. “O caminho que construímos é de fazer a integração (dos fundos) e aumentar gradativamente a prateleira com selo ESG.”

Enquanto Europa e EUA estão muito avançados na jornada dos investimentos sustentáveis, no Brasil ela ainda é embrionária, mas os gestores de fundos começam a enxergar suas vantagens e a criar produtos dedicados, afirma José Tibães, líder na área de fundos da XP Investimentos. 

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A XP entrou no segmento em meados do ano passado e em dez meses lançou 20 fundos com viés ESG, atendendo demanda dos próprios clientes. “É o maior portfólio do mercado e a ideia é ir suprindo toda a lacuna da prateleira de produtos, ter fundos de todas as classes para fazer a transição”, informa Beatriz Vergueiro, responsável pela área. Um dos fundos é o Trend de Liderança Feminina, com portfólio de 170 empresas cujo critério era ter mulheres em suas lideranças.

A linha ESG acumula mais de R$ 800 milhões investidos entre fundos ativos, passivos, internacionais e locais, ou 5% de uma carteira total formada por mais de 400 fundos. “Mas o número deve ser crescente no longo termo”, avisa Beatriz. A corretora também investiu R$ 100 milhões para incentivar novas gestoras a atuarem na segmento ligado à sustentabilidade.

XP: 20 fundos com viés ESG em dez meses Foto: XP Investimentos

Performance melhor em crises Takahashi, da Anbima, confirma que o universo de investimentos sustentáveis tem aumentado substancialmente, mas representa hoje menos de 1% do patrimônio líquido total dos fundos de ações no País. Segundo ele, que também preside a BlackRock no Brasil, análises de mercados que operam esse tipo de fundo há vários anos mostram que aqueles com critérios ESG apresentam performances semelhantes aos dos tradicionais. “Porém, eles se comportam muito melhor em períodos de crise, sofrem ou oscilam menos e desvalorizam menos.”

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Ele acredita que, no futuro, todos os investimentos serão sustentáveis. “Estamos falando de práticas óbvias, como cuidar das mudanças climáticas adequadamente, e faz mais sentido investir e ajudar empresas a fazer processos que não emitam gases poluentes, que tenham diversidade etc”, diz Takahashi.

Maria Paula Cantusio, analista de ESG da área de Research do Santander, afirma que, até poucos anos, o interesse maior pelos fundos sustentáveis vinha de investidores institucionais, mas hoje há muita procura também por parte de pessoas físicas. “Taxas foram reduzidas para adequação mais ampla do mercado, e tornou-se mais acessível”, afirma.

“Tem crescido muito a procura por clientes principalmente no varejo em razão da pandemia, que colocou luz grande sobre o assunto devido à questão social”, acrescenta Luzia Hirata, analista de Sustentabilidade da Santander Asset Management.

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O Santander tem um fundo com a vertente ESG desde 2001, criado na época pelo ABN/Real, que depois foi incorporado pelo banco espanhol. Chamado de Ethical, o fundo de renda variável foi relançado no ano passado com abordagem mais global para atender uma nova demanda no mercado. O banco tem também o Ethical Previdência e mais dois fundos com parceiros internacionais que, segundo Maria Paula, “têm performado 3% a 4% melhor que a Bovespa”. 

Um problema não só no Brasil, mas lá fora também, é que não há regulamento específico sobre critérios para ser considerando fundo ESG. Luzia diz que a Europa está trabalhando nisso e Anbima começa a dar seus passos. Takahashi informa que a associação constituiu no ano passado um grupo consultivo de sustentabilidade com representantes da indústria de fundos e mercados de capitais.

A ideia, diz ele, é fazer um amplo mapeamento sobre os fundos sustentáveis no Brasil pois, os dados de hoje, tanto em quantidade como valores, representam só uma parte dessa indústria. “Ainda é um mercado bastante fragmentado, inclusive lá fora, e há poucas informações, poucos dados e precisa de mais transparência nas informações, mais clareza dos critérios.”

Pandemia acelerou interesse

A Bradesco Asset Management (Bram) tem oito fundos com carimbos ESG, o primeiro deles lançado em 2007, o segundo em 2011 e seis no ano passado. Por enquanto, eles contribuem com apenas R$ 350 milhões de uma carteira que tem R$ 530 bilhões em ativos. 

O superintendente executivo da Bram, Ricardo Eleutério, explica que, apesar do selo verde estar nesses oito fundos, 99,5% dos ativos tem cobertura do tema de sustentabilidade. “Antes de comprar qualquer ativo ele é avaliado por nosso time pelos critérios internos e damos nota de 0 a 100, levando em consideração todos os aspectos do tema ESG.”

Eleutério concorda que a pandemia acelerou o interesse pelos investimentos sustentáveis, pois “despertou a preocupação com o ambiental, governança, com o futuro”. Para ele, há uma demanda difícil de estimar, mas muito forte, de investidores institucionais (fundos de pensão, previdência privada e seguradoras) e pessoas físicas, principalmente a nova geração, preocupada com o que vai deixar aqui.

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