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Estado e minoritários devem agir sempre no melhor interesse da companhia estatal; leia análise

Governo das estatais deve ser protegido das condutas humanas que não tenham por objetivo o melhor interesse das sociedades

Por Fernando Dal-Ri Murcia

Os administradores das sociedades são contratados para gerir algo que não lhes pertence (patrimônio dos acionistas) ocupando, portanto, posição baseada em fidúcia e possuindo dever de lealdade (duty of loyaly) perante a companhia.

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No caso específico das empresas estatais, em especial as sociedades de economia mista, os deveres fiduciários dos administradores – conselheiros, diretores e membros de órgãos estatutários – são para com a companhia, independentemente do acionista que o indicou para o cargo. Em outras palavras, representantes do Estado e igualmente dos minoritários devem agir sempre no melhor interesse da companhia que, em certos casos, pode conflitar com os de determinado acionista.

Acontece que o ambiente corporativo é caracterizado pelo chamado conflito de agência, em que administradores podem ter incentivos para tomar decisões visando a maximizar seu próprio bem-estar, em detrimento do melhor interesse da sociedade. Note-se que esse cenário também é caracterizado pela existência de assimetria informacional, em que os executivos são insiders e possuem acesso privilegiado às informações, enquanto que os demais stakeholders não.

No âmbito das companhias abertas, a “má” governança implica necessariamente desconto de preço, perda de valor econômico em razão da relação clássica entre risco e retorno Foto: Thridman/Pexels

Nas estatais, as potenciais formas de expropriação são diversas e vão desde a fraude propriamente dita até a realização de investimentos em projetos com baixa rentabilidade realizados com finalidade distinta daquele de maximizar o valor da companhia no longo prazo. Isso implica naturalmente no mau uso do dinheiro público, já que o Estado é o acionista majoritário dessas sociedades. No limite, portanto, são os cidadãos que arcam com esse custo.

Neste contexto, emergem as políticas e práticas relacionadas ao governo das sociedades, conhecidas como governança corporativa (corporate governance). Elas tratam da estrutura e do processo de tomada de decisões da companhia. Do ponto de vista econômico, a governança lida com as formas pelas quais os provedores de capital de risco – acionistas e credores – se protegem contra a expropriação dos administradores e controladores.

No âmbito das companhias abertas, a “má” governança implica necessariamente desconto de preço, perda de valor econômico em razão da relação clássica entre risco e retorno. Isso porque os agentes econômicos precificam justamente o risco de expropriação em decorrência da utilização dos recursos pelos administradores em atividades que não visam ao melhor interesse da sociedade. Neste contexto, para financiar a companhia eles exigem retornos mais elevados, o que se traduz em um maior custo de capital e acesso mais restrito ao crédito. Diversas pesquisas no âmbito nacional e internacional evidenciam que empresas com práticas inadequadas de governança corporativa negociam com “desconto” perante os seus pares.

Assim, torna-se fundamental a defesa das práticas de governança das estatais brasileiras, até como forma de proteção da res publica. Para isso, faz-se necessário o estabelecimento de princípios, regras e procedimentos – acompanhados da adequada fiscalização e monitoramento pelos órgãos competentes.

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Boas práticas de governança nas estatais são necessárias independentemente do partido que se encontra no poder, da ideologia econômica dominante e/ou desse ou daquele indivíduo em específico. De fato, a ideia é justamente essa, qual seja uma “blindagem”: o governo das estatais deve ser protegido das condutas humanas que não tenham por objetivo o melhor interesse dessas sociedades.

Fernando Dal-Ri Murcia é Professor do Departamento de Contabilidade e Atuária da Universidade de São Paulo

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