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Governo prepara decreto para ampliar a produção de biometano no Brasil

Medida busca cumprir as metas de redução de emissão de metano definidas na COP-26; combustível, feito a partir de resíduos urbanos e rurais, pode ser usado para substituir o diesel na agropecuária

Por Denise Luna (Broadcast)
Atualização:

RIO - O governo prepara a publicação no início de março de um decreto para estimular a produção de biometano, o que vai ajudar o País a cumprir as metas de descarbonização firmadas na COP-26, informam fontes do setor. A expectativa é de que seja criado um crédito de metano que dialogue com o mercado de carbono, além de linhas de financiamento mais favoráveis e isonomia tributária entre os estados.

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O Brasil se comprometeu na 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, em Glasgow, Escócia, a reduzir as emissões de metano em 30% até 2030. O foco do programa será a substituição do diesel na agropecuária, setor responsável por 28% do metano jogado na atmosfera no Brasil. 

O País tem potencial de geração de biometano que vem dos resíduos urbanos (aterros sanitários) e rurais, especialmente de aves, suínos, açúcar e álcool, o que já foi batizado de "pré-sal rural" pelo ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, em referência às abundantes jazidas de petróleo no litoral.

Brasil pode produzir 30 milhões de metros cúbicos de biometano por dia até 2030. Combustível vem dos resíduos urbanos. Foto: Taba Benedicto/Estadão - 25/6/2020

Segundo a gerente executiva da Associação Brasileira do Biogás (Abiogás), Tamar Roitman, o Brasil tem condições de produzir 30 milhões de metros cúbicos de biometano por dia (m3/d) até 2030, mas atualmente a produção é de apenas 400 mil m3/d. Sem o decreto do governo, a projeção era de atingir 1 milhão de m3/d até 2025, mas agora esse volume deverá ser bem maior, "dependendo de como virá o decreto", disse a executiva.

"O ministro veio da COP querendo promover a descarbonização do agro, e ele já quer começar a tratar das metas e iniciativas que vão corresponder ao acordo assinado em Glasgow. Ele quer a descarbonização do agro via transporte, com a substituição do diesel por gás ou biometano", afirmou Roitman, que se reuniu com o Ministério do Meio Ambiente para mostrar as opções tecnológicas que existem no Brasil para a mudança da frota do setor.

Seria o primeiro programa de biometano para a agropecuária, segundo a executiva. Hoje, apenas 800 caminhões de uma frota nacional de 3,5 milhões utilizam gás biometano ou uma combinação de combustíveis (diesel, biometano e gás) – chamado de duo fuel. O cenário, porém, está mudando. A Scania foi a primeira a produzir caminhões a gás no Brasil. MWM e Iveco, anunciaram recentemente que também vão entrar no negócio. Além dos caminhões novos a gás, existe a opção de converter os motores para duo fuel ou ainda substituir apenas do motor a diesel por um motor a gás.

"A gente mostrou as possibilidades e que cada um tem seu preço, cada um tem um objetivo e função. Para a gente, o decreto deveria abrir a possibilidade de usar todas as tecnologias, ser bastante amplo", disse Roitman, ressaltando que o mundo caminha para valorizar os produtos feitos com baixa pegada de carbono, ou seja, o biometano poderia ajudar a manter a competitividade das commodities exportadas pelo Brasil.

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Criada em 2013, a Abiogás começou com oito associadas, e hoje contabiliza quase 100 de toda a cadeia do biogás/biometano, como comercializadoras, fornecedores de todas as etapas de equipamentos, fabricantes de veículos que usam biometano, empresas de purificação de gás e inclusive alguns consumidores, como a Unilever.

A executiva prevê algum tipo de fomento pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDES) que facilite a substituição da frota a combustível fóssil, diante do compromisso assumido pelo Brasil na COP26.

"O que a gente colocou para o Ministério - e não sabemos se vai vir - é buscar também algumas formas de incentivar a produção do biometano, como de alguma forma facilitar o licenciamento ambiental dessas plantas, não isentar, mas acelerar o licenciamento, de forma menos custosa”, explicou.

Roitman espera que o decreto traga algum incentivo que também reduza o custo dos empreendimentos, assim como poderia ser feito algum incentivo via redução de imposto de importação dos equipamentos, ou mesmo de ICMS. "Também gostaríamos de ver uma regra de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) para acelerar o desenvolvimento tecnológico, tanto para o desenvolvimento de veículos, como para a tecnologia da conversão, onde você pode aumentar a eficiência elevando o teor de biometano em relação ao diesel para os duo fuel", afirmou.

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Junto a essas medidas, a Abiogás também avalia com o BNDES a criação de um fundo garantidor para projetos de biogás/biometano, o que também pode destravar investimentos desse setor. "Existem linhas atrativas para a produção, mas a exigência de garantias pelos bancos ainda é muito alta. Por isso estamos colocando de pé, com o BNDES, esse fundo garantidor, que vai possibilitar esses investimentos", afirmou Roitman.

Cbios

De acordo com Carlos Jacob, presidente da ZEG Biogás, que produz biogás com resíduos de aterros sanitários e resíduos agroindustriais, a expectativa é de que o decreto estenda os Créditos de Descarbonização (Cbios) para os benefícios da produção do biogás/biometano, que hoje não são capturados.

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Ele explica que, atualmente, os Cbios só valorizam a substituição de outros energéticos, mas não captura os benefícios da produção de biogás e biometano do lado da gestão de resíduos e líquidos. Segundo a ZEG, o mercado de "créditos de metano" tem potencial para atingir R$ 200 bilhões anuais.

"Conseguir fazer um certificado vinculado a esse metano evitado na atmosfera e começar a negociar isso no mercado, ter uma valorização, e outros aspectos que podem aparecer nessa regulação, como a questão do financiamento. Isso, sim, ajuda no desenvolvimento da indústria", afirmou.

Segundo Jacob, a ZEG vai terminar 2022 com previsão de produzir 30 milhões de metros cúbicos (m3) de biometano e a estimativa chegar em 2030 com o volume de 1 bilhão de m3. Apesar da evolução, o executivo afirma que o volume corresponde a 2% do potencial do País.

"Temos todos os desafios de uma indústria que está começando a ganhar escala, arrumando a regulação, participando da discussão do mercado de gás, facilitando acesso aos dutos para injeção do biometano e precisando de muito capital. Qualquer iniciativa que venha valorizar o atributo ambiental e melhorar a atratividade dos projetos, como outras medidas regulatórias e de financiamento, só vai fazer o potencial crescer mais rápido", avaliou.

De acordo com o executivo, ao contrário de ser um concorrente, o estímulo ao gás natural é bom para gerar um passo intermediário, trazendo uma infraestrutura necessária para o combustível definitivo que vai substituir o fóssil, seja o biometano, seja o hidrogênio, ou mesmo os dois.

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