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Governo pede que pagamento de precatórios não afete meta fiscal; descumprimento não geraria sanções

Equipe econômica quer quitar fatura de R$ 95 bilhões e mudar forma de contabilizar as dívidas judiciais da União

Foto do author Mariana Carneiro
Foto do author Adriana Fernandes
Por Mariana Carneiro e Adriana Fernandes

BRASÍLIA - Na manifestação feita ao Supremo Tribunal Federal para mudar a forma de pagar os precatórios, apresentada nesta segunda-feira, 25, o governo Luiz Inácio Lula da Silva pede que a quitação de dívidas judiciais passadas, conta avaliada em R$ 95 bilhões, não seja considerada na meta de resultado primário (saldo entre receitas e despesas, sem contar os juros da dívida).

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No pedido enviado ao STF, a Advocacia-Geral da União solicita que “(o STF) determine que as ações referentes à execução orçamentária e financeira necessárias ao cumprimento da decisão postulada não sejam consideradas como eventual descumprimento da meta de resultado primário para fins da legislação aplicável”.

O governo torce para que o STF decida, de maneira favorável, ainda neste ano, para que o pagamento não afete a estreia do novo arcabouço e a meta prometida pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de zerar o rombo das contas públicas em 2024 -- que vem sendo vista com ceticismo pelo mercado financeiro.

Ao Estadão, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, afirmou que a medida “não impacta um real na discussão sobre a meta fiscal para o ano que vem”. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se comprometeu a zerar o rombo das contas públicas em 2024 - meta que vem sendo vista com ceticismo pelo mercado financeiro.

Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem a meta de zerar o rombo das contas públicas em 2024 Foto: Adriano Machado/Reuters

Segundo Ceron, o valor desembolsado “vai ser computado normalmente”, só que o pagamento desse montante não significará descumprimento da meta para fins de punição. Ou seja: não acioná os gatilhos de contenção de gastos previstos no novo arcabouço fiscal em caso de descumprimento da meta.

Em 2024, com a entrada em vigor do novo arcabouço, caso o governo descumpra a meta, sofrerá sanções previstas na norma, como a redução dos limites de gastos em proporção à variação das receitas.

“Preferimos que aconteça em 2023, por ter mais espaço na meta do (resultado) primário, para acomodar quase a totalidade deste pagamento”, disse o secretário do Tesouro. A meta deste ano autoriza um déficit de até R$ 216,4 bilhões, sendo que a estimativa atual para o rombo, segundo o último relatório da equipe econômica, é de R$ 141,4 bilhões.

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Para Gabriel Leal Barros, ex-diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado e sócio fundador da Ryo Asset, o pagamento “afeta o resultado primário e o governo está propondo que seja deduzido da meta para efeito de cumprimento”. “Como haverá descumprimento, estão pedindo que não seja contabilizado e não sejam punidos, que não sejam acionadas as sanções”, afirmou.

Espaço fiscal?

O secretário do Tesouro nega que o pedido do governo ao STF tenha o objetivo de ajudar Haddad a zerar o rombo das contas públicas no ano que vem e que o pagamento vá abrir espaço no Orçamento para novas despesas. Essa avaliação, porém, é contestada por parte dos economistas.

Barros, da Ryo Asset, afirma que a medida abre espaço para que o governo amplie gastos primários no futuro, uma vez que as despesas com o pagamento de precatórios também serão reclassificadas na contabilidade pública. O valor original devido pelo governo (principal) seguirá como uma despesa orçamentária, já os juros e encargos incidentes serão tratados como despesa financeira, fora dos limites do novo arcabouço fiscal.

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“Mesmo com essa extravagante proposta de mudança contábil, a meta de déficit zero do ministro Haddad em 2024 continua bastante desafiadora. De outra forma, ajuda a reduzir o gap (lacuna) para atingir a meta; mas, ainda assim, não resolve o problema de ela não ser crível”, avalia. Segundo ele, caso o STF não conceda essa suspensão, o governo não cumpriria a meta fiscal em 2024.

O coordenador do Observatório Fiscal do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da FGV, Manoel Pires, avalia que “uma eventual reclassificação da parte dos precatórios como despesa financeira pode abrir espaço para o governo no novo arcabouço fiscal para alocar outras despesas. “No caso do ano que vem, inclusive as despesas com Previdência Social, que parecem estar subestimadas”, afirmou. “Ainda temos que compreender todas as repercussões fiscais dessa intenção.”

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