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‘Cesta básica mínima pode ser estratégia de negociação do governo’, diz presidente da Abras

João Galassi defende a inclusão de apostas no Imposto Seletivo, dentro da reforma tributária, para compensar a inclusão de mais produtos alimentícios nas alíquotas menores

Foto do author Eduardo Laguna
Por Eduardo Laguna (Broadcast)
Entrevista comJoão GalassiPresidente da Associação Brasileira de Supermercados (Abras)

Frustrada com a lista de apenas 15 itens na cesta básica do projeto de regulamentação da reforma tributária, a Associação Brasileira de Supermercados (Abras) propõe o imposto seletivo sobre jogos como solução para que mais produtos tenham isenção ou paguem menos impostos.

O presidente da entidade, João Galassi, sustenta que a alíquota efetiva de tributos pagos pelos produtos vendidos em supermercados vai subir de 12% para 19% se não houver mudança na proposta encaminhada pelo Ministério da Fazenda ao Congresso. Só na carne, o aumento da alíquota, calcula a entidade, será de 50%, já que o produto não entrou na lista de alimentos que terão o imposto sobre valor agregado, o IVA, reduzido a zero. Foi incluído numa segunda lista, chamada pela equipe econômica de “cesta estendida”, com redução de 60% das alíquotas.

“Talvez, e aqui vou fazer uma provocação, seja uma estratégia de negociação do governo de levar uma cesta mínima ao Congresso”, avalia Galassi. Apontando incongruências do projeto com o decreto presidencial, editado em março, que lista dez categorias de produtos, incluindo as carnes, na Política Nacional de Segurança Alimentar, a associação dos supermercados se mobiliza com o agronegócio e a indústria de alimentos para pressionar o Congresso a ampliar a cesta básica.

Cesta básica deve ser um dos maiores pontos de discussão da reforma tributária Foto: Wilton Júnior/Estadão

Leia abaixo os principais trechos da entrevista:

A reforma tributária atende, em linhas gerais, as demandas do setor?

Houve uma frustração muito grande em relação aos artigos 8º e 9º (da emenda constitucional, que tratam da cesta básica e de regimes de tributação diferenciados). O Ministério da Fazenda está indo para um caminho e a presidência da República está indo para outro. A presidência apresentou um decreto recente incluindo, por exemplo, as carnes na cesta básica como um direcionamento de política de Estado. E o Ministério da Fazenda, na sua proposta de regulamentação, não incluiu as carnes na cesta (com alíquota zero). Espanta muito. A proposta apresentada pelo governo em produtos de limpeza (consumidos por famílias de baixa renda, que também tiveram redução de 60% do IVA) é algo assim assustador porque considera que a pessoa mais desfavorecida financeiramente só consome sabão em pedra ou água sanitária. É incompreensível. Para mim, isso é discriminação, porque considera que essas pessoas só vão poder consumir sabão em pedra.

Nesses casos, o cashback não vai atender bem as famílias de baixa renda?

O cashback (devolução de parte dos impostos) será em cima do CadÚnico (o cadastro único para programas sociais do governo federal). Ou seja, atende somente as pessoas que recebem até R$ 600 (valor base do Bolsa Família), com devolução de 20% dos impostos (na maioria dos casos). Temos 64% da população brasileira que é pobre, seja uma pobreza mais extrema ou uma pobreza menor. E uma classe média em que a renda familiar começa em R$ 2,5 mil. O governo apresentou uma cesta mínima cheia de vieses ideológicos e que, na minha opinião, não segue nem o texto da emenda constitucional nem o próprio decreto presidencial.

Qual é a proposta da Abras para ampliar a cesta básica sem aumentar a alíquota base do IVA?

Da cadeia de abastecimento até o varejo, passando pela indústria de alimentos, com a Abia (Associação Brasileira da Indústria de Alimentos), além de todo o agro, temos um alinhamento de pensamento e ideias. Vamos levar uma condição para a população brasileira poder aumentar seu poder aquisitivo no consumo de alimentos em um país que aprovou uma reforma tributária que considera a diversidade regional e cultural da alimentação, assim como garante a alimentação saudável e nutricionalmente adequada. Ou seja, estamos trabalhando em duas pontas: segurança alimentar e combate à obesidade. Temos hoje uma média de impostos na carne em torno de 7% e o governo quer levar para 10,5%. Isso representa em torno de 40% a 50% de aumento na carne, dependendo do valor (final) do IVA. Nossa proposta é imposto seletivo sobre jogos. Não estamos falando de impostos sobre o cigarro para combater o vício? A mesma coisa vale para a questão dos jogos.

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O secretário extraordinário da reforma tributária, Bernard Appy, tem dito que, na média, as alíquotas dos produtos que entraram na cesta básica e na cesta de alimentos estendida vão ficar mais baixas.

Não é verdade. Se as proteínas forem para 60% (redução de 60% das alíquotas), teremos um aumento de 40%. Se forem isentas, teremos uma redução dos impostos nas proteínas. Porém, o todo ainda continua sendo um imposto acima do que o setor recolhe hoje.

Com a proposta de imposto seletivo sobre as ‘bets’ seria possível incluir quais produtos na cesta básica?

Seria um adicional que poderia ser utilizado para o benefício da população brasileira em mais produtos, incluindo a carne, na cesta básica ou na redução de 60%. Não faz sentido fazer uma proposta que vai contra o próprio decreto do governo que instituiu uma nova cesta básica. Como se justifica isso? A justificativa dada é que vai aumentar a alíquota máxima. Não existe isso. É só fazer a conta do que se paga hoje e do que se vai pagar.

O sr. diz que com a alíquota de 26,5% do IVA, como está prevista no projeto de regulamentação da reforma, é possível ter uma cesta básica com mais produtos?

Total. Do ponto de vista dos impostos recolhidos hoje, não está havendo redução. Nenhuma. Vamos aumentar os impostos da carne. Outro exemplo, pães com castanhas, nozes, chia, uma série de produtos voltados à alimentação saudável, foram colocados na alíquota cheia. Tapioca está fora da cesta (com alíquota zero). Cadê a regionalidade? Talvez, e aqui vou fazer uma provocação, seja uma estratégia de negociação do governo de levar uma cesta mínima ao Congresso. Até torço para que seja isso, porque há tanta incoerência que não me permite fazer um comentário elogioso quando se trata da questão dos alimentos (colocada no projeto de regulamentação).

E qual será a estratégia da Abras na interlocução com governo e Legislativo?

O Congresso aprovou quatro alíquotas: plena, redução de 30% (sobre serviços de profissionais liberais), redução de 60% e zero. O trabalho é encaixar os produtos dentro das alíquotas.

Qual é o impacto da proposta atual do governo na carga tributária do setor?

Numa cesta que tínhamos apresentado, com produtos elegíveis distribuídos em 33% (do total) para cada alíquota — zero, intermediária (com redução de 60%) e plena (26,5%) —, a alíquota efetiva de tributos no setor de supermercados seria de 12,4% na média (ante os atuais 12% em IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS). Mas a proposta do governo, com 66% dos produtos na alíquota plena, leva os impostos para 19%.

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