Por Mateus Moreira, professor de Biologia do Ensino Médio da Escola da Vila e responsável pelo SustentaVila
São Paulo registra o mês de fevereiro mais seco dos últimos 38 anos
[...]. Falta de chuvas tem piorado a situação dos reservatórios que abastecem
a população [...]. Especialistas acreditam que
é possível que falte água nas casas ainda este ano. (G1, 28/2/2022).
Petrópolis teve chuva de um mês em poucas horas. [...] Em apenas
três horas, choveu mais do que o esperado para o mês de fevereiro
inteiro [...] foram registrados 259,8 milímetros de chuva durante o dia
todo -- sendo 250 mm (milímetros) entre 16h20 e 19h20 [...]. Foi a
maior tempestade da história de Petrópolis, desde que se iniciaram as
medições, em 1932. A equipe Técnica e Científica da Polícia Civil, que
atua no Instituto Médico Legal (IML) mantém o registro de 233 vítimas
fatais. (UOL, 17/2/2022).
SP registra 37,3 oC nesta quarta, terceira maior temperatura da história
da cidade [...]. Na semana passada, a cidade teve a segunda maior
temperatura da história, com 37,4 oC. Maior marca foi registrada em
outubro de 2014, com 37,8 oC, segundo o Inmet. (G1, 7/10/2020).
Notícias como estas são cada vez mais frequentes nos noticiários. Não é por acaso: temos observado recordes de altas e baixas temperaturas, de grandes volumes de chuvas, secas históricas no Pantanal devido à alteração no regime de chuvas e vazantes, entre muitos outros fenômenos climáticos que impactam direta e indiretamente as comunidades locais e a biodiversidade. Vimos, em fevereiro de 2022, o robusto grupo de pesquisadores que contribuem para o IPCC trazendo notícias nada animadoras. IPCC é a sigla em inglês para o Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (Intergovernmental Panel on Climate Change), que foi criado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e pela Organização Meteorológica Mundial em 1988, com o objetivo de fornecer aos formuladores de políticas avaliações científicas regulares sobre a mudança do clima, suas implicações e possíveis riscos futuros, bem como para propor opções de adaptação e mitigação. Em seu último relatório, trouxe diversos pontos de preocupação, todos centrais nos debates globais, dentre os quais podemos destacar:
- os impactos e os riscos das mudanças climáticas estão se tornando cada vez complexos e difíceis de se gerenciar;
- os riscos para pessoas, espécies e ecossistemas vão aumentar rapidamente com as temperaturas mais altas, gerando, com frequência, impactos climáticos irreversíveis;
- desigualdade, conflitos e desafios de desenvolvimento aumentam a vulnerabilidade aos riscos climáticos;
- a adaptação é essencial. Soluções viáveis já existem, mas mais apoio precisa chegar às comunidades vulneráveis;
- alguns impactos das mudanças climáticas já são severos demais para pensar em adaptação. O mundo precisa agir com urgência para lidar com as perdas e danos.
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Mas qual o papel da escola nesse contexto? Como o ensino e o currículo estão lidando com um tema tão atual, tão complexo e tão incerto? A escola está preparada e organizada para essas novas demandas?
Apesar de a educação ser vista como uma importante ferramenta no combate das causas e ameaças das mudanças climáticas, especialistas em educação e a comunidade como um todo ainda possuem uma percepção limitada do que deve ser discutido sobre o tema em associação à educação.
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Por afetar a humanidade nos contextos social, ambiental, cultural e econômico, a educação para as mudanças climáticas tem forte caráter interdisciplinar e globalizador. Diante disso, é injusto e um equívoco o tema ficar a cargo do(a) professor(a) de ciências, biologia ou da área de ciências naturais, como tradicionalmente acontece. Todas as áreas do conhecimento devem promover juntas e de modo complementar uma educação para as mudanças climáticas abrangente e realmente interdisciplinar, já que o tema interliga o passado, o presente e o futuro da história da humanidade, interferindo na vida humana nos níveis pessoal e global.
Boa parte da estrutura educacional atual não atende sequer aos anseios da dimensão ambiental, que requer cooperação, solidariedade, bom uso da natureza, formação cidadã plena e efetiva, e acaba se restringindo de modo excessivo ao cientificismo tecnológico. Na Escola da Vila, viemos revisitando nosso currículo para que, desde a Educação Infantil até o Ensino Médio, ampliemos os projetos interdisciplinares nos quais esses componentes sejam fortalecidos na relação dos estudantes com seu ambiente e com práticas responsáveis de ação e cidadania.
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Educar de forma estrita e unicamente tecnicista fragiliza a universalidade do conhecimento e compromete a formação de uma cidadania global. Nesse contexto, a busca pela formação de um cidadão engajado e crítico em seus atos muitas vezes se perde, pois processos ambientais, climáticos e antrópicos exigem a interdisciplinaridade do conhecimento ancorada em uma racionalidade ambiental. Caso contrário, estaremos contribuindo para o aumento de uma tecnologia direcionada a extrair ininterruptamente os recursos naturais a uma velocidade cada vez maior, com o objetivo de atender a demandas de consumo crescentes. Como resultado dessa formação consumista ambientalmente insustentável, a sociedade inverte os valores passando a viver para produzir e consumir, alienando-se numa forma de vida que a impede de enxergar os perigosos efeitos das mudanças climáticas em andamento.
Nesse sentido, a criação de núcleos de estudantes para a promoção da conscientização nas escolas e do ativismo propositivo em ações socioambientais faz enorme sentido por integrar jovens numa jornada de posicionamento frente a um tema universal e de extrema urgência. O @vilapeloclima nasceu com os jovens do Médio na Vila, e se entrelaça com outros coletivos que nos mostram o papel que a juventude estudantil deve ocupar nessa agenda.
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A inserção de tópicos das mudanças climáticas nos currículos deve gerar discussões coletivas em processos sociais e ambientais mais amplos, permitindo o desenvolvimento de aspectos éticos, econômicos e ecológicos, buscando promover consciência e motivação para fomentar estratégias direcionadas para diminuir a pressão ambiental. A integração entre saberes científicos, ambientais e tradicionais precisa estar inserida no processo educacional. Isto é essencial para a mitigação e a adaptação.
Estamos prontos para promover a educação para as mudanças climáticas?
REFERÊNCIAS
São Paulo registra fevereiro mais seco dos últimos 38, diz Inmet. G1, São Paulo, 28 fev. 2022. Acesso em: 12 mar. 2022.
Petrópolis teve chuva de um mês em poucas horas. UOL, São Paulo, 17 fev. 2022. Acesso em: 12 mar. 2022.
SP registra 37,3ºC nesta quarta, terceira maior temperatura da história da cidade. G1, São Paulo, 07 out. 2020. Acesso em: 12 mar. 2022.
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