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'Nunca me imaginei professor', diz brasileiro que concorre ao prêmio de melhor professor do mundo

Anúncio do Global Teacher Prize 2018 será neste domingo, 18.

Por Isabela Palhares
Atualização:

Aos 15 anos, com a mãe doente e o pai desempregado, Diego Lima começou a cursar o magistério (capacitação que era obtida dentro do antigo segundo grau) para ajudar financeiramente em casa já que recebia uma bolsa. O trabalho na área da educação, no entanto, o encantou e desde então nunca mais saiu das escolas. Ele é o único brasileiro finalista do Global Teacher Prize 2018, da Varkey Foudation. O vencedor do prêmio será anunciado neste domingo, 18.  "Minha mãe tinha câncer e morreu quando eu tinha 16 anos no meu quarto. Como eu não queria ficar sozinho em casa durante a tarde, por causa das lembranças, fui até uma escola e pedi um estágio. Comecei a ajudar uma professora da antiga 1ª série a alfabetizar as crianças, fiquei fascinado ao ver a transformação daqueles alunos quando começavam a ler e escrever", recorda. Essa primeira experiência fez com que ele decidisse por cursar Pedagogia e depois prestar concurso para ser professor em prefeituras do interior paulista.

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+++ Professores voltam a protestar contra reforma da Previdência municipal Em 2012, Lima foi convidado para ser diretor da escola municipal Darcy Ribeiro, em São José do Rio Preto, na época conhecida pelos casos de violência e alta taxa de evasão. "Quando a secretária de educação me fez o convite, eu fiquei com receio de assumir esse compromisso. Mas me lembrei que quando estava na faculdade uma professora dizia como poderíamos transformar realidades". Nos primeiros dias à frente da escola, Lima não foi bem recebido pelos alunos, que fizeram uma "guerra" com os alimentos da merenda. O professor conta que, para a surpresa dos estudantes, pegou um microfone e disse que não iria embora e queria escutá-los e entender porque não gostavam de estar na escola. "Acredito que foi nesse momento que comecei a ganhá-los, eles não estavam acostumados a alguém querer ouví-los". Lima ouviu dos alunos que a escola era feia e muito punitiva. "E eles tinham razão, havia 60 suspensões por mês. O prédio estava depredado, sem pintura", conta. A partir dessas duas reclamações surgiram ideias para mudar a realidade do colégio. 

+++ Ato contra previdência de SP acaba com 3 feridos Foi criado um mural para que os alunos pudessem dar suas sugestões, críticas e elogios. O grêmio da escola foi reestabelecido e foram criadas assembleias para que os estudantes pudessem decidir sobre os assuntos escolares. Com tintas e material de construção doados por outros colégios da cidade, os funcionários e pais de alunos fizeram um mutirão para fazer uma manutenção na unidade. Na tentativa de entender o mau comportamento dos alunos, Lima diz também ter criado um questionário em que perguntavam quais eram os sonhos e necessidades dos jovens. Das respostas, ele e os professores perceberam que os "indisciplinados" na maioria das vezes enfrentavam situações difíceis em casa. "Isso nos sensibilizou demais", conta. Foi criado então um programa de tutoria, em que cada professor passou a cuidar de uma turma, com uma preocupação que vai além do desempenho escolar.  Outro problema grave no colégio era a evasão escolar, dos cerca de 1.100 alunos, 202 abandonaram os estudos em 2013. Com a tutoria, os professores passaram a visitar pessoalmente a casa dos jovens que tinham três faltas consecutivas para conversar com a família. 

+++ Mais inovação, mais desigualdade? A compreensão sobre a origem da indisciplina dos alunos também permitiu a implementação da mediação de conflitos, os estudantes do 9º ano foram treinados para identificar, mediar ou comunicar a direção sobre os casos de bullying e brigas. "Percebemos que nem sempre os conflitos têm início na escola. Elas começam na festinha do final de semana, no shopping, no bairro, nas redes sociais, mas explodem dentro da escola que é onde passam a maior parte do tempo juntos", diz. Com a melhora na convivência, Lima conta que o ambiente se tornou acolhedor para novos projetos, como o "Pare para ler" onde a toda a escola para por 15 minutos para ler um livro, revista ou gibi. Também foi criado o clube de astronomia e um show de talentos todas as sextas-feiras. 

+++ Educação e democracia. O que vem primeiro? Ainda assim, Lima reconhece que ainda tem muitos desafios, especialmente, em relação à defasagem de aprendizado dos alunos. A escola alcançou em 2015, a nota 4,7 no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), indicador calculado com base no desempenho dos estudantes em português e matemática (obtido pela Prova Brasil) e no fluxo escolar (taxa de aprovação). A nota superou a meta projetada para aquele ano, mas ainda está distante do valor que o Brasil usa como referência de qualidade, 6, e muito abaixo da média estadual que é de 6,2. Os dados da Prova Brasil mostram ainda que apenas 30% dos alunos do 9º ano da escola aprenderam o considerado adequado em em português e apenas 12%, em matemática. "A escola está longe da perfeição, muito ainda precisa ser feito, mas acho que começamos a trilhar esse caminho", diz o professor.

* A jornalista viajou a convite da Fundação Varkey

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