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Elas têm a última palavra

Não se engane: são as mulheres que decidem os itens que devem ou não ser consumidos pela família

Por Ciça Vallerio
Atualização:

Elas estão com a bola toda e são cada vez mais reverenciadas pela publicidade e por empresas. É fácil de entender o porquê: as mulheres são responsáveis por 80% das decisões de compras no comércio em geral, estimam especialistas da área. Haja poder. Diversas pesquisas endossam essa força feminina, que interfere - muito mais do que a dos homens - na escolha do carro, imóvel, mobiliário, pacotes turísticos, eletroeletrônicos, planos de saúde, itens do supermercado e até no consumo do vinho! Até a escolha da cueca sobrou para a mulher. Conforme dados de mercado da marca LYCRA®, o setor de moda íntima masculino teve crescimento anual de 15%. Não foram os homens que impulsionaram as vendas - mas sim as mães, esposas, namoradas e afins, fatia que representa 75% das compras. A produtora artística Patricia Kisser, de 37 anos, escolhe os modelitos que entram no guarda-roupa do marido e também no dos filhos. Além de trabalhar e cuidar da casa e da prole, Patrícia determina tudo o que entra em sua casa. "Ele é músico, viaja bastante, mas também não está nem aí para nada", alfineta. "Como sempre fui muito ativa, resolvo as coisas mais rapidamente e acabo assumindo as compras." Com o marido em turnê pela Europa, Patricia está com um pepino para resolver: vender os três carros e comprar um zerinho. O que aparentemente parece uma tarefa prazerosa, virou um imbróglio. "Meus filhos querem um tipo, mas meu marido pediu um carro que coubesse a guitarra e os amplificadores", conta. "Tem coisa que é difícil decidir sem ajuda, nessas horas gostaria que ele participasse mais." As montadoras estão de olhos focados em consumidoras como Patricia. Sabem, por exemplo, a partir de pesquisas, que atualmente as mulheres influenciam na compra de 70% dos carros e são responsáveis diretamente pelo consumo de 40% dos modelos zero quilômetro. Há 10 anos, respondiam por apenas 25% das compras de carros da Volkswagen, mas, em 2006, esse índice saltou para 51%, de acordo com dados da empresa. Na Ford, mais de 50% dos modelos EcoSport vendidos são para mulheres. É sabido que, enquanto o homem procura performance no carro, a mulher é atraída pelo design e, principalmente, por pequenos detalhes como porta-objetos e espelhos. O EcoSport caiu nas graças das motoristas porque, além dos inúmeros espaços para acomodar qualquer tipo de tralha, oferece um compartimento refrigerado para guardar iogurtes, sucos, mamadeiras, sanduíches. Outro item que as seduziu foi o esconderijo para bolsa, localizado embaixo do assento do passageiro, que levanta como uma tampa. FIEL DA BALANÇA Dados da Abras - Associação Brasileira de Supermercados apontam que a mulher escolhe 80% dos itens que vão para o carrinho de compras. É o que acontece na casa de Mariana Cogswell, diretora geral de planejamento da agência de publicidade Talent e mãe de duas filhas. Ela é responsável pela escolha dos mantimentos do dia-a-dia, enquanto o seu marido se responsabiliza por itens "finos", ou comidinhas do tipo gourmet. Apesar da participação (meio tímida, diga-se) do companheiro, ela pede sua ajuda quando fica em dúvida diante de uma escolha. Como a cor que deve pintar uma parede, por exemplo. "Enquanto mulher pondera sobre as inúmeras variáveis, o homem vai lá e diz apenas se gostou ou não", fala Mariana. "Para eles, decidir muita coisa é um estresse, mas eu amo isso, gosto de escarafunchar produtos, novidades e ofertas." Como esposa e profissional da área de publicidade, ela entende muito bem a diferença de comportamento na hora do consumo. Idiossincrasias que estão relacionadas, em boa parte, às diferenças biológicas entre os sexos. Na opinião de Mariana, os homens são mais objetivos e voltados para a solução de problemas, enquanto as mulheres são mais seletivas e motivadas pelo cuidado com a prole. O mercado, no entanto, às vezes deturpa tais diferenciais. "O problema é que a publicidade ainda está muito presa a estereótipos e a clichês que não conseguem nos sensibilizar", observa. "O público feminino se sente mal compreendido e mal representado." A empresa de pesquisa Uma a Uma, especializada em comportamento de consumo feminino, estuda as diferenças de gênero na hora da compra. Denise Gallo, uma das sócias, avisa que as empresas nacionais começam a notar as nuances que envolvem as escolhas delas. "Muitas perceberam como é importante investir na riqueza de detalhes para instigar a mulher", diz. "Mas ainda há o equívoco comum entre as marcas: imaginam que, para atrair esse público, basta colocar umas florzinhas no anúncio ou a foto de um bebê loirinho, pintar a embalagem de rosa e oferecer um batom de brinde." Estudos científicos mostram que a percepção extra-sensorial das mulheres interage muito mais com os vários estímulos. É como se a audição, olfato, paladar e tato funcionassem ao mesmo tempo. Enquanto o homem é mais preciso e focado, a mulher tem melhor visão periférica, ou seja, consegue "enxergar" em 360 graus, sendo mais atenta aos detalhes. "É o que explica a diferença, por exemplo, da riqueza de descrição que uma mulher faz de uma festa", diz Renata Petrovic, outra sócia da Uma a Uma. "Enquanto o marido apenas se restringe a dizer se a festa foi legal ou não." UMA FEIRA ESPECIAL Consciente desse filão de mercado, a empresária Malu Sevieri, de 21 anos, trouxe para São Paulo a versão da feira Só para Mulheres, que há três anos faz sucesso em Goiânia. Será realizada entre os dias 31 de agosto e 2 de setembro, no Anhembi. São esperadas cerca de 30 mil visitantes, ávidas por novidades de diversos segmentos: de beleza a moda, passando por gastronomia e planos de saúde. Com entrada gratuita, a mulherada vai encontrar, além dos estandes com expositores, uma extensa programação de palestras. "A idéia não é apenas vender o peixe, mas oferecer às mulheres um espaço onde possam experimentar os produtos", avisa Malu. "Elas gostam de sentir, provar e testar antes da compra. Em Goiânia, as visitantes se sentem tão à vontade que andam pela feira com toucas prateadas, enquanto esperam a hidratação nos cabelos (aplicada gratuitamente) fazer efeito." A construção civil também tem se curvado ao poder feminino. Quando a Tecnisa percebeu que 90% das compras de seus imóveis têm a palavra decisiva das suas clientes, a construtora criou um movimento denominado "mulherização". Agora, o tratamento voltado para essa parcela dos consumidores (que vale ouro) é diferenciado. Como as mulheres são detalhistas, imóveis de visitação passaram a contar com absorventes e ganchos para bolsas nos banheiros e, em cada cômodo, um sistema faz exalar aromas. No quarto do casal, o cheirinho é de frutas cítricas; no da criança, tuti-fruti; na cozinha, há o aroma de um bolo saindo do forno. A Tecnisa ainda oferece mimos para elas. Mas o pulo do gato está no departamento de assistência técnica, que colocou apenas engenheiras para atender os clientes. Como Kelly Harabagin Ferro, de 32 anos, uma das profissionais responsáveis pela área. Kelly atende sobretudo aos chamados femininos (que são a maioria, por sinal) para resolver pequenos problemas do apartamento. "A construtora oferece cinco anos de garantia justamente para sanar pequenos vazamentos, microfissuras, que, em geral, são percebidas pelas mulheres", fala a engenheira. "Por ser mulher e também detalhista, o nosso atendimento é diferenciado e a cliente se sente mais à vontade para reivindicar e receber uma outra mulher em seu próprio apartamento." O resultado? A empresa aposta que, assim, consegue conquistar uma consumidora fiel, que fará propaganda boca a boca. A Tecnisa sabe que 22% do total das suas vendas são por indicação, e 70% dessas recomendações partem de suas clientes mulheres.

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