Angélica, 50 anos: ‘Foi bom, mas não aproveitei tudo. Viveria tudo outra vez, até os perrengues’

Sai neste domingo no Globoplay a série ‘Angélica: 50 & Tanto’. Quatro dias antes de completar meio século, ela fala ao ‘Estadão’ de alegrias, arrependimentos e futuro: ‘Os próximos 50 vêm com mais sabedoria’

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Foto do author Daniel Silveira
Foto: Suzanna Tierie/Globo
Entrevista comAngélicaApresentadora

No próximo dia 30 de novembro, uma das maiores estrelas da televisão brasileira completa 50 anos de vida. Para celebrar, Angélica vai comandar um programa em que recebe mulheres para falar de suas histórias. Angélica: 50 & Tanto entra para o catálogo do Globoplay neste domingo, 26, com todos os cinco episódios, o primeiro deles aberto para não assinantes. O programa também vai ganhar exibição na íntegra no GNT e um corte a cada domingo no Fantástico.

Série 'Angélica: 50 & Tanto' mistura documentário com bate-papo entre a apresentadora e convidadas sobre temas que perpassam pelos seus 50 anos de vida e quase 50 de carreira. Foto: Suzanna Tierie/Globo

No programa, além de comemorar meio século de vida e revisitar sua carreira, que começou aos quatro anos de idade, a estrela da TV, esposa de Luciano Huck, abre as portas de sua casa para um bate-papo com outras artistas. No primeiro episódio, focado em trabalho, a loira recebe Sandy, Fernanda Souza e Maísa. Todas elas foram estrelas mirins e passaram por problemas semelhantes, mesmo que tenham idades tão diferentes.

O programa, que tem criação e direção de conteúdo de Chico Felitti, direção artística de Isabel Nascimento Silva e produção executiva de Luísa Barbosa e Renata Brandão, é gravado na casa de Angélica, na sala de estar da apresentadora. “Ele tem isso da sororidade, de colocar um monte de mulher dividindo suas dores e se amparando ou se curando juntas”, conta a artista em entrevista ao Estadão. “É o que a gente pode dar para as mulheres se unirem, estarem mais próximas nas suas dores”, continua.

Toda mulher já viveu algum tipo de assédio. Achei legal começar (a série) com isso porque é minha história, que eu tenho tanto orgulho. Não tenho como não falar das mazelas e das questões que me trouxeram até aqui. A gente não pode normalizar coisas como essa.

Além da conversa, a série traz registros da história de Angélica desde seus primeiros trabalhos como modelo, passando pela sua carreira como cantora e apresentadora. “Eu tenho muito material, muita imagem, coisa que eu nem lembrava. Virar um documentário seria muito fácil, mas não era a ideia”, explica. “Estou num momento em que quero falar, ouvir, entender e me colocar. Acho que o 50 & Tanto tem que representar toda minha história, mas também o que eu estou vivendo hoje, o que eu quero daqui para frente”, complementa.

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Leia a entrevista abaixo, editada com cortes para facilitar a compreensão.

Marina Ruy Barbosa, Paola Oliveira e Anitta também foram convidadas do programa 'Angélica: 50 & Tanto'. Foto: Alex Santanna/Globo

Olhando sua trajetória, o que você leva de aprendizado desses 50 anos de vida e quase 50 de carreira?

É muita história. Revisitando agora, até por causa dos 50 & Tanto, revivi coisas que nem lembrava, nem sabia que tinha feito. Esses 50 anos foram muito intensos, de trabalho, vida pessoal... Às vezes, quando você tem uma coisa muito intensa, acaba não aproveitando. Isso começou a me incomodar bastante algum tempo atrás, foi aí que eu parei um pouco para olhar tudo e comecei a refletir. A sensação é de quando a gente vai na montanha russa, que você vai e depois quer ir de novo. Porque foi tão bom, mas não aproveitei tudo. Viveria tudo outra vez para aproveitar o que não aproveitei e para olhar de outra forma coisas que eu nem olhei, até perrengues. Porque não existe essa vida linear. Altos e baixos, emoções, isso é a vida. E a minha foi assim, todos os momentos em que ela me botava à prova, saí muito mais forte. Tenho muito que agradecer.

Se você pudesse reviver algo, o que seria?

Difícil, mas na hora que você falou veio a maternidade. Estou vendo meus filhos crescendo e nasci para ser mãe, gosto muito, sei que sou boa mãe, é uma coisa que faço muito naturalmente. E não só dos meus filhos, gosto de cuidar de todo mundo, a maternidade me aflorou isso. Não vou ter mais filho, mas tenho saudade de amamentar. Hoje, vivi uma emoção muito grande com meu filho, que está se graduando (Joaquim Huck, o mais velho do casal tem 18 anos). Então passou um filme na minha cabeça, de reviver momentos deles pequenos, na escola, adaptação, Dia das Mães, festinha, amiguinhos. Adoraria viver de novo toda aquela fase com eles pequenos - que é perrengue, não é fácil.

E de trabalho, foram tantos e tão legais. Gostava muito do contato com o público. Apesar de ter parado de cantar e de fazer show por saúde - não tinha mais condição física, tive pânico - gostava do palco, shows, viagens. Conheci cada cantinho do Brasil assim. Essa troca era muito potente.

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Foi tão bom, mas não aproveitei tudo. Viveria tudo outra vez para aproveitar o que não aproveitei e olhar de outra forma as coisas que nem olhei, até perrengues.

Você falou do seu filho está graduando (com 18 anos). E falou de maternidade. Está preparada para ser avó?

Nem fala disso, pelo amor de Deus! Tá doido? (risos) Eu já sou tia avó, minha afilhada Bela é a coisa mais linda, que fez aquela surpresa para mim no Domingão (com Huck), e eu quase morri de coração... Quero que eles (os filhos) vivam muito! Quero ser avó, claro, vó é mãe com açúcar, acredito nisso, mas eles têm muita coisa para viver. É muito sério botar um filho no mundo, ainda mais nesse mundo, tem que ter muita segurança e estar ali inteiro.

Vivi a maternidade num momento importante da minha vida, em que tive que priorizar ser mãe, mas tive sorte porque trabalhava num lugar que me apoiou. Levava meus filhos para o trabalho, amamentava eles ali, pude viver a maternidade inteiramente. Tive privilégios que a grande maioria não tem e sei que é difícil.

E eu acho que eu não vou ter mais filho, mas eu tenho saudade de amamentar.

No primeiro episódio de ‘50 & Tanto’ você fala que a saída para não envelhecer é estar viva. Como é que você viu surgir as rugas e marcas de expressão? E como viu as pessoas perceberem isso?

O mais difícil é lidar com expectativa, com o que as pessoas estão acostumadas a ver... Sempre fiz análise e trabalhei muito minha cabeça. Vivi muito mais a cobrança, de forma negativa, quando era adolescente, quando você ouve muito o que os outros falam e quer agradar... Quando fui envelhecendo foi muito natural. Eu sempre me cobrei por trabalhar na televisão. Se aparecia uma ruga, vamos cuidar da ruga, meu corpo mudou, preciso fazer mais musculação. Não vinha das pessoas, o fato de ter começado tão nova e as pessoas terem me visto crescendo também tem o lado bom, tem respeito e carinho.

Prestes a completar 50 anos, Angélica celebra quase o mesmo tempo de carreira ao lado de mulheres em um programa íntimo, gravado na sala de sua casa. Foto: Alex Santanna/Globo

Claro que nas redes sociais existe aquela pessoa que vai destilar ódio, mas eu nem leio. Isso diz muito mais sobre ela do que sobre a gente. Sempre me cuidei e continuei me cuidando, mas cada vez mais acho que quando a gente está bem por dentro, olhamos para o espelho e ficamos satisfeitos com o fora também. A tal da luz interior que as pessoas tanto falam, ela existe.

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No primeiro episódio você recebeu Sandy, Maísa e Fernanda Souza, quatro mulheres de gerações diferentes que cresceram diante das câmeras. Como foi isso para você?

Quando eu falo que ficava mais à vontade em frente às câmeras do que por trás delas não é uma coisa boa. ‘Como assim, estou mais à vontade aqui? A frente das câmeras é outra vida!’ Começar tão cedo funcionou para mim e para elas, cada uma vivendo a dor e a delícia de ser quem é. Não tem como passar ileso por tanta pressão, cobrança, numa idade em que você não tem maturidade emocional para segurar tanta maldade.

Eu sempre fiz análise e trabalhei muito a minha cabeça.

Às vezes você tem que se posicionar de uma forma que ainda não tem maturidade, mas faz, é um esforço. E acho que esse esforço que a gente fez deixa algumas marcas. É a nossa história e é linda. As marcas, a gente trabalha hoje, briga contra elas. Tive que me retirar, parei de cantar, fui me conhecer.

Durante sua vida, você foi alvo de fofoca, histórias, revistas falando sobre seus relacionamentos. Como isso te afetou?

Fui levando... Meu pai e minha mãe são muito próximos e sempre tive uma boa proteção, mas, claro, se eu estava na frente de uma câmera, tinha que responder. Nem sempre foi fácil, algumas coisas não eram apropriadas para uma menina pequena. Acho que nunca fui perseguida de forma cruel. Essa coisa ruim de botar uma pessoa muito jovem ali numa situação esquisita é constrangedora. Vivi muito coisa de namorado, não podia terminar um namoro e já tinha um monte de gente na porta da minha casa. Essa coisa de fugir, sair de peruca em carro, disfarçada para não me seguirem para poder jantar com alguém. Pelo fato de ter começado muito nova, as pessoas tinham cuidado, elas idealizaram uma princesa do Brasil. Inclusive a imprensa.

Você já tinha falado sobre assédio que sofreu na França e começa a série falando que um produtor queria que seu nome artístico fosse Lolita, e que também sofreu assédio quando nova. Como foi resgatar essa história?

O processo de gravação foi muito intenso. O Chico Felitti tinha que investigar coisas como essa que eu nunca tinha falado, que nunca quis mexer. É como uma sessão de terapia. Você vai ao terapeuta e quando mexe em alguma coisa, aquilo te bagunça um pouco. Por isso considero esse projeto como um ciclo se fechando. Fechou a tampa encerrando com coisas boas, dores, memória...

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Não tem como você passar ileso por tanta pressão, tanta cobrança, numa idade em que você não tem maturidade emocional para segurar tanta maldade.

Angélica sobre a exposição e pressão que artistas mirins sofrem

Nem lembrava muito dessa história, contei para ele na entrevista, ele achou muito forte, mas é engraçado como eu normalizava isso. A gente sempre foi ensinada a normalizar para tocar a vida, e hoje temos mais voz, posso falar isso nesse projeto, e se repercutir, vou ter a internet para explicar mais. E pode virar uma pauta feminista importante, outras mulheres podem se identificar e curarem suas feridas.

Me senti à vontade para falar isso por ser um programa muito especial, na minha casa. Me senti protegida em poder falar disso com mulheres que viveram coisas semelhantes. Porque toda mulher já viveu algum tipo de assédio. Eu achei legal começar com isso porque é minha história, que eu tenho tanto orgulho, não tenho como não falar das mazelas e das questões que me trouxeram até aqui. A gente não pode normalizar coisas como essa. E eu, durante muito tempo, normalizei por sobrevivência. Por outro lado, hoje é muito libertador.

Recentemente a gente viu a história da Larissa Manoela com a família. Em algum momento da sua história rolou essa conversa com seus pais ou de alguma forma você se sentiu lesada ou por eles ou por terceiros?

Lesada por terceiros, sim! Não tinha como não, naquela época era tudo muito mais complicado com relação a essa parte empresarial. Minha família me protegia, cuidava e supervisionava, mas eles não estudaram para isso (para gerir uma carreira). Então pediam ajuda para pessoas que nos lesaram em vários momentos. E aí meus pais brigavam por mim com terceiros. Mas em nossa relação familiar, eu acredito que eles sentiram muito o momento quando também não tinham mais como lidar, quando começaram a ficar cansados, aí colocaram minha irmã para ajudar. Minha família era como uma proteção de todo o resto, um escudo em todos os sentidos: financeiros, empresariais, emocionais... A família é o que segura a tua onda ali.

Então eles pediam ajuda para pessoas que nos lesaram em vários momentos. E aí meus pais brigavam por mim com terceiros.

Angélica sobre ter sido lesada por algumas pessoas ao longo da vida. Apresentadora disse que família sempre esteve ao lado dela.

Em um tempo de redes sociais, você e Luciano protegem os seus filhos de tanta exposição?

Eles têm (Instagram) fechados porque você tem que ter muita maturidade e estofo emocional para segurar uma onda de rede social hoje. A gente está aprendendo também. É muito esforço para eles terem que lidar com isso, tem outras coisas, tem que ter infância, tem que ter adolescência e lá na frente segurar essa onda.

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A gente tem cuidado. Fomos colocando eles frente as câmeras de uma forma muito devagar. Quando eles eram menores a gente não expunha muito e agora eles têm mais autonomia. Até porque a gente sempre foi muito de sentir o que eles eram capazes de segurar. Sempre tivemos cuidado com isso porque somos pessoas públicas e eles nasceram dentro disso. Acho justo as pessoas quererem saber, mas eles não são as pessoas públicas. Ou não eram. A gente sempre preservou o máximo que conseguimos.

Acho que os próximos 50 vêm com muito mais sabedoria no sentido de não ter ansiedade, tenho segurança daquilo que gosto, do que não gosto, do que preciso fazer ou não.

Como é que você pensa quando fala de futuro, dos próximos 50 anos...

Nos meus primeiros 50 anos nada foi muito planejado, foi tudo acontecendo, sempre fui meio Zeca Pagodinho, deixando a vida me levar. Os próximos 50 vêm com muito mais sabedoria no sentido de não ter ansiedade, tenho segurança do que gosto e não gosto, do que preciso fazer ou não. Porque eu tenho uma história e essa história não vai mudar, ninguém vai apagar, ela está ali, é rica e é boa. Os projetos terão sempre um propósito no sentido de honrar todo o público que eu já conquistei, que seja uma coisa boa para essas pessoas, que vai ter uma verdade muito grande, porque estou tendo tempo para parar, pensar, escolher, viver. Acredito que qualquer coisa que venha a acontecer profissionalmente agora vou estar vivendo aquilo muito mais por inteiro, aproveitando muito mais.

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