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Dicas de decoração para deixar sua primeira morada mais bonita e aconchegante

Opinião|Adquira um móvel de segunda mão e leve um punhado de história para casa

Hábitos de consumo baseados em economia circular e sustentabilidade impulsionam garimpo por mobílias que já têm memória

Foto do author Anelisa Lopes
Atualização:

Quem nunca passou em frente a uma casa anunciando que a "família vende tudo" e se sentiu instigado a entrar? Anos atrás, me vi diante uma senhora aos prantos, se desfazendo de uma uma casa de quase 1.000 m2 no Pacaembú, pois havia vendido o terreno a uma construtora e iria para um apartamento dez vezes menor. Cômodos e cômodos repletos de pratarias, móveis, porcelanas e, claro, toda a história de uma família retratada nas peças. No fim, um sorriso tímido saiu do seu rosto na hora de eu ir embora, carregada: "minha querida, tenho certeza de que cuidará muito bem das minhas poltronas". Sim, e elas estão comigo até hoje. Não as vendo, não as empresto e não me desfaço delas. É como se parte da vida daquela senhora tivesse se fundido à minha.

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(ANELISA É JORNALISTA E DESIGNER DE INTERIORES. PERFIL NO INSTAGRAM: @anelisalopes)

Configurações de negócio como esta, somadas a questões econômicas, sociais e ambientais, vêm desenhando um mercado com um potencial gigantesco. A compra e venda de itens com um passado vai além da proposta de benefício financeiro próprio. Para uns, são definidos como usados, second hand ou pre owned. Para outros, como herança de família ou mobiliário de arte. Independentemente da sua definição, este formato - que, infelizmente, ainda enfrenta certa resistência no Brasil por remeter aos brechós, ou porque o consumidor brasileiro ainda espera algo novo na compra de um usado - tem ganhado cada vez mais adeptos.

"Este tipo de movimento sempre existiu, com carros e roupas, por exemplo. A questão é que houve uma mudança cultural após a pandemia, em razão da inflação em outros países, como na Europa e nos Estados Unidos. Isso transforma o poder aquisitivo e, consequentemente, hábitos de consumo", explica o especialista em design de consumo Mauricio Queiroz. De acordo com a publicação Consumidor Moderno, o mercado global de segunda mão deve quase dobrar até 2027 e chegar aos US$ 350 bilhões. A expectativa é que haja um crescimento três vezes mais rápido que a média do mercado global de vestuário em geral. Em 2022, o segmento fechou com um faturamento de US$ 177 bilhões, 28% mais alto que o ano anterior. Por aqui, uma das principais plataformas direcionadas a este tipo de transação abrirá sua primeira loja física, com destaque para um setor de "peças que pertenceram a famosos".

A cadeia circular e suas benfeitorias para o meio ambiente também está entre os pilares deste modelo de negócio. O descarte de produtos de curta vida útil é um ponto que vem sendo tratado com outros olhos pela geração Z. Além de fomentar a reutilização de um item que tenha sido reprocessado ou reformado, diminuindo o impacto na cadeia ambiental, o fator exclusividade por meio do garimpo também é uma vertente positiva para os que vieram após a década de 90.

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Se esta forma de revenda em geral tem se mostrado um negócio da China, a busca por produtos de alto valor agregado, com atestado de procedência, curadoria e garantia tem formado profissionais especializados no assunto. Quando existe o fator raridade, o valor do usado pode superar o de um novo. E acaba virando uma peça de colecionador que envolve toda uma cadeira para legitimar sua origem.

Em operação digital há seis anos, o Bossa Nossa Casa surgiu de uma forma orgânica e descompromissada a partir de uma página de rede social. "Identificamos uma demanda reprimida de móveis de segunda mão no mercado. Este modelo de negócio sempre existiu com o família vende tudo. Levamos para o digital com uma curadoria mais refinada", define Camila Nascimento, fundadora da marca ao lado do seu marido Guilherme Assumpção.

O processo de oferta e aquisição é feito de forma online, com frete garantido pela empresa - se for o caso, existe a indicação de prestadores de serviço para limpeza e restauro, por exemplo. As famílias cadastram os itens no site, os quais passam por uma avaliação. "Hoje entendemos quais peças têm demanda. E não são só de design assinado, mas tudo aquilo que façam os olhos dos clientes brilhar e estejam carregadas de boas histórias", conta Camila. A clientela é formada por amantes e entusiastas de arte e design, que valorizam a estética e a qualidade de uma peça independentemente do estilo.

Marcas consolidadas no mercado de design e decoração também têm direcionado suas estratégias para o reuso. A Prototype, por exemplo, restaura itens de clientes para revenda. A Breton, por sua vez, criou o Breton Circular, que surgiu da dificuldade que o cliente tinha em desapegar do móvel em bom estado. "Geralmente, são casos de mudanças e ciclo de vida, chegada de filho, renovação na decoração ou casamento. A plataforma tem como objetivo não só democratizar a marca para outros consumidores ou impulsionar a sustentabilidade no mercado de mobiliário de alto padrão, mas também oferece cashback de 10% para clientes que venderem seus móveis", define a diretora de marketing da marca Giselle Rivkind.

 

 

Móveis co design assinado ganham nova história com consumo circular (foto: reprodução internet)  

 

Mobiliário modernista na Galeria Teo (foto: arquivo pessoal)  

Um pedaço da memória na sala de jantar - idealizada pelo empresário e galerista Teo Vilela Gomes e sua irmã Lis, a Casa Teo abriga itens que datam do século XVII até os anos 80. O garimpo por memórias, no entanto, não parou por aí. Há quase dois anos, a Galeria Teo, que compartilha a mesma rua da loja, surgiu do desejo de concentrar o mobiliário modernista brasileiro (a ideia é sempre ter uma exposição na parte inferior), publicando, assim, o patrimônio cultural nacional, que passou a ganhar identidade própria por meio de nomes como Sergio Rodrigues, Jorge Zalszupin e Joaquim Tenreiro décadas atrás.

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Como naquela época as peças eram fabricadas em pequena escala de forma praticamente artesanal, a busca de um cliente por completar um jogo de cadeiras, por exemplo, pode levar anos. Por lá,  os artigos podem passar por diferentes oficinas de restauro, com equipes especializadas em madeira, tapeçaria, ferro, entre outros. Também existe a possibilidade de o cliente personalizar o móvel, desde que as interferências pessoais não mudem a estrutura do móvel, que deve permanecer intacta.

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Em um projeto de interiores, a transformação vai além de obra ou de bater perna em lojas. Preservar a memória, criar histórias e trazer ensinamento por meio de um móvel ou item de decoração é o que torna uma proposta única e imprime a sensação de pertencimento ao cliente.

NOVIDADES NO CIRCUITO

Releituras para o acrílico - em parceria com a CBCrill, a Diagonale, especializada em acrílico, apresentou a iO Design, marca que vai oferecer mobiliário produzido a partir deste material em composição a outros, como metal e madeira. A primeira coleção traz a assinatura de designers como estúdio Lattoog, Plataforma4 e Caroline Ficker.

Opinião por Anelisa Lopes

Anelisa Lopes (@anelisalopes) é mãe, designer e jornalista. Após atuar por quase duas décadas como jornalista no segmento automotivo, decidiu estudar design de interiores para converter sua paixão por decoração em uma nova carreira. Hoje, faz consultorias e projetos para transformar espaços e vidas.

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