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Um blog com estilo

Mas é tão difícil assim vender sapato?

Por Renata Reps
Atualização:

O que a gente vê exposto nas lojas de roupas e calçados hoje já passou por muito mais teoria do que qualquer um de nós, meros compradores, possa imaginar. Que o diga o estilista Walter Rodrigues, que além de criar peças para sua marca pessoal, tem a árdua - porém prazerosa, como ele faz questão de destacar - tarefa de coordenar o Núcleo de Inovação e Design da Associação Brasileira de Empresas de Componentes para Couro, Calçados e Artefatos (Assintecal).

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O nome do cargo é complicado como suas atribuições. O grupo de 22 designers de várias partes do Brasil é responsável por prever as tendências que ditarão a moda dos pés daqui para a frente. Quando digo daqui para a frente quero dizer pensar hoje no que será tendência para o verão de 2012. Trabalho que, aliás, a equipe já está finalizando. "Nós não temos bola de cristal. Na verdade, fazemos uma aposta com base em muita pesquisa e depois de ler muito, assistir a vários filmes e ficar de olho no que está acontecendo pelo mundo", explica Rodrigues.

Mas o fato é que toda coleção de calçados tem três partes que podem ser muito diferentes entre si. No último domingo, o estilista deu uma espécie de consultoria para lojistas que compareceriam à 42ª Feira Internacional da Moda em Calçados e Acessórios, a famosa

Francal

. Acontece todo ano. Antes da caça ao tesouro começar, eles devem compreender muito bem as estratégias de compra para cada loja, sempre visando ao maior lucro possível e, consequentemente, menor prejuízo. Não é nada fácil. Os empresários precisam conhecer muito bem seu público-alvo, de que gostam as pessoas que frequentam suas lojas, quanto tempo elas costumam demorar no local, como elaborar uma vitrine atraente, se o endereço da casa implica diferenciação do público... Os primeiros a saber de tudo isso são os fabricantes dos componentes de calçados (materiais, acessórios para sapatos, etc) e os dos próprios calçados. No ano anterior, durante o Fórum de Inspiração da Assintecal, eles já ficam sabendo das tendências para começarem a produzir. Depois é a vez dos lojistas. Sim: nós, consumidores, somos os últimos a saber das novidades. Triste, porém, verdade. Assim, o grupo do Núcleo de Inovação pensa em três conceitos separados. O primeiro, em que estão 60% das lojas e dos produtos dentro de uma loja, é a base da pirâmide. Aquilo que está pronto para vender, que é seguro e de compra praticamente garantida. O segundo diz respeito a 30% da coleção (e das marcas existentes no mercado): é o mais interessante que está no catálogo, aquilo que serve para explicar melhor o que o estilista quis dizer, uma espécie de ponte entre o conceito 1 e os 10% finais, que são a perfumaria. O extravagante. O que resulta de ousadia.

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"A cada coleção, pensamos em conceitos que se enquadrem a cada um desses grupos. A porcentagem nunca muda e sempre é válida para análise de mercado", explica Walter. Para este verão, então, o que você pode esperar em 60% das marcas é muita cor, objetos repaginados, transformação de tecidos de roupas para sapatos, mistura de materiais como couro, pano e piton. Laminados sintéticos que parecem couro de cobra verdadeiro, portanto, estarão em alta. E a cartela de cores não poderia ser mais viva: amarelo, vermelho, rosa e uma cor só no sapato inteiro dominarão as lojas. No conceito de 30% das grifes, entretanto, o que predomina é um olhar para trás, um resgate da herança do artesanato - mas sem folclore, trazendo o passado para a contemporaneidade. O feito à mão, o trançado e os teares manuais, portanto, ganham destaque aqui. Na cereja do bolo - os 10% reservados aos mais ousados - ficam as cores mais inusitadas das florestas brasileiras, os elementos da natureza que estão ao nosso lado e em que não reparamos. As asas de borboletas, as flores raras, elementos trazidos de uma atenção maior a experiências pessoais. A mistura de todos os conceitos torna-se a originalidade de marcas totalmente

made in Brazil

. Praia, carnaval, artesanato, flora e fauna serão os temas do verão 2010 por aqui. E os preços não estão totalmente vinculados a essa categorização. Um estilista revolucionário pode buscar peças e tecidos de brechós para fazer composições superbaratas, ainda que utilizadas por apenas 10% das pessoas. E muita gente chega a se assustar com preços de algumas peças em grandes lojas de departamento. "Quando você estuda toda esta lógica, percebe que o mercado se enquadra completamente nela", explica Walter Rodrigues, assumindo sua posição entre a fatia mais fina da briga. Uma briga boa, é verdade. Mas, de fato, entender bem como ela funciona pode tornar nossas idas às lojas muito mais conscientes.

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