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Experiência com primeiro jogador daltônico no futsal brasileiro inspira liga a assistir condição

Matheus Sacon impactou positivamente o esporte nacional durante sua passagem pelo Brasil; veja como uma pessoa com daltonismo enxerga as cores

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Foto do author Murillo César Alves
Por Murillo César Alves
Atualização:

Matheus Sacon, de 34 anos, foi um dos destaques da Liga Italiana de Futsal na última temporada, quando foi vice-campeão com o Olimpus Roma. Natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, o fixo se destaca, além das quadras, por sua condição de saúde: ainda na infância, foi diagnosticado com protanopia, um tipo de daltonismo que se caracteriza por não enxergar a cor vermelha. Quando atuava no Brasil, ele se tornou o primeiro jogador da Liga Nacional de Futsal (LNF) com a condição oftalmológica, de acordo com a própria entidade.

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Ítalo-brasileiro, atuou nas categorias de base de clubes gaúchos e passou pelo Botafogo, Assoeva e Magnus antes de lançar sua carreira na Europa. Durante sua trajetória no País, ficou marcado pela sua condição, que causou situações inusitadas entre companheiros e treinadores. Por não diferenciar as cores vermelha e verde, tinha dificuldades nos jogos e, principalmente, nos treinamentos, onde os coletes eram semelhantes.

Ao Estadão, Sacon lembra que descobriu sua condição ainda na infância, nos primeiros anos da escola, quando utilizava cores diferentes das demais crianças. “Minha mãe foi chamada à escola quando eu confundia as cores dos mapas, dos Estados brasileiros... tinha um pouco de vergonha no começo.” Desde seu início no futsal, ele passou por essa confusão nas cores do uniforme, mas desde os 15 anos também não tem problemas em falar sobre sua situação.

Matheus Sacon foi o primeiro jogador daltônico na Liga Nacional de Futsal. Foto: Divulgação

“Teve jogos que não conseguia diferenciar tons mais escuros do vermelho, mas as competições e os times em que eu joguei sempre tiveram uma preocupação em me ajudar”, conta. Foi pensando nisso que a Liga Paulista da categoria, por exemplo, incluiu em seu regulamento a questão das cores e tonalidades dos uniformes, para que não houvesse confusão para os atletas daltônicos. A Uefa, que organiza o futebol profissional na Europa, também já se atentou para a questão e o Campeonato Italiano de Futebol baniu uniformes inteiramente verdes das equipes a partir da temporada 2022/2023. Além de atletas, como Sacon, os espectadores com essa condição tammbém são impactados.

Em 2018, quando se sagrou campeão mundial com o Magnus, Sacon e sua condição impactaram positivamente a organização da Liga Paulista de Futsal (LPF). Além de ser o único jogador daltônico da Liga Nacional à época, a competição em São Paulo se preocupou em incluir regras e medidas que auxiliassem o atleta na prática esportiva – além de se atentar com a parcela da população que carrega essa mesma condição.

“Imediatamente solidários ao fato (do daltonismo), lembro que fizemos contato com o Matheus para melhor apurar e entender o que efetivamente acontecia. Foi quando soubemos que cerca de 7% da população era afetada pelo daltonismo. Então, afirmamos a ele que, enquanto estivesse aqui (atuando na LPF), não teria mais a dificuldade da distinção de cores nas partidas”, pontua Laercio da Graça, CEO da LPF. A principal iniciativa foi a mudança das cores das camisas e dos uniformes de treinos.

Mesmo após sua ida ao futsal paranaense em 2019, a Liga decidiu manter essa preocupação com os uniformes nos anos seguintes. “Em um gesto contínuo, passamos dentro do possível a administrar os uniformes que cada equipe usaria para facilitar a prática do esporte e aos telespectadores portadores da condição”, diz o dirigente. “Passou a constar em regulamento a obrigatoriedade de uniformes claros e escuros para as partidas, além de orientar que as equipes não joguem com cores listradas.”

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“Os clubes geralmente me procuram para saber se os uniformes escolhidos vão atrapalhar a minha visão durante o jogo. Outras vezes, eles acham que certos tons, por serem diferentes, não serão confundidos por mim, mas ocorre o contrário”, diz o jogador. Então, antes dos jogos, passou a ser comum que os times se informem sobre a combinação dos uniformes, se eles iriam interferir na visão de uma pessoa daltônica.

Longe das quadras, Sacon passou por um momento curioso no último mês. Após ser destaque do Olimpus Roma no vice-campeonato da temporada na Itália, ele soube que foi dispensado da equipe em uma live. O dono do time, Daniele D’Orto, não chegou a comunicar o jogador do fim do contrato. Ele descobriu o fato por meio de seus companheiros de time, que lamentara sua saída.

Sacon já recebeu contato de clubes do Brasil, que desejam contar com ele ainda neste ano. O atleta deseja continuar na Europa, mas analisa as ofertas.

O que é daltonismo?

De acordo com o Ministério da Saúde, o daltonismo, também conhecido como discromatopsia, é um distúrbio da visão que interfere diretamente na percepção e distinção das cores. Há diferentes tipos e geralmente a condição está ligada à hereditariedade, a partir da transmissão do cromossomo sexual do tipo X.

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“Existem casos em que o daltonismo pode ser adquirido devido a lesões oculares, doenças oculares ou uso de certos medicamentos. Algumas possíveis condições relacionadas são diabetes, Alzheimer, parkinson e leucemia”, aponta Fabiano de Abreu Agrela, Pós PhD em Neurociências, biólogo e especialista em genômica membro da Royal Society of Biology no Reino Unido.

Além da protanopia que Sacon carrega ao longo de sua vida, há outros tipos de daltonismo: deuteranopia, em que há a dificuldade em identificar a cor verde; tritanopia, deficiência na percepção do azul e verde; e, em casos mais raros, o acromático, no qual o indivíduo enxerga apenas tons de preto e branco. Sem cura, há alternativas para que o portador dessa condição consiga identificar as cores. “O principal método usado nesse tipo de caso é o uso de lentes de contato ou óculos com lentes próprias para daltônicos, que ajudam a enfatizar as cores que cada indivíduo tem dificuldade em enxergar”, aponta o médico.

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