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Nada de fortuna, fama ou estádios lotados; conheça a dura realidade da 4ª divisão paulista

Longe da badalação das altas rendas, atletas e clubes lutam para se manter

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Por Alison Negrinho
Atualização:

Fama, estádios lotados, carrões e altos salários. Este é o sonho da maioria dos jogadores de futebol, mas que poucos conseguem alcançar. A realidade tende a ser mais cruel e, por vezes, desanimadora. Em São Paulo, longe da badalação das altas rendas e dos grandes estádios, acontece a Segunda Divisão do Campeonato Paulista,encerrada mês passado. Apesar do nome, a competição é disputada pelos times do quarto nível do Estado, em sua maioria, com grandes dificuldades financeiras.

Ainda que em condições precárias, o torneio pode realizar diferentes objetivos. Garotos que estão começando e atletas mais experientes que acreditam que podem estourar. Clubes que creem na oportunidade de vender algum talento e fazer caixa. E veteranos consagrados que, relutantes em pendurar as chuteiras, seguem atuando e gerando marketing. São nestes cenários que se encontram as histórias de Vinicius, lateral-esquerdo da Portuguesa Santista, Itamar, artilheiro do Tanabi, Anderson Nóbrega, presidente do Taboão da Serra e Edílson Capetinha, consagrado atacante.

Consagrado, Edílson Capetinha disputou a Segunda Divisão pelo Taboão, do presidente Anderson Nóbrega Foto: Divulgação/ Taboão da Serra

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O SONHO "Ser jogador é uma vontade que começa cedo, a grande maioria das crianças no Brasil e no mundo querem isso e eu não fui diferente. Meu pai sempre me levava no estádio para ver jogo, desde pequeno eu não largava a bola. Desistir jamais. Todo jogador busca coisas melhores, trabalha para isso, então se você faz o que gosta, não tem porque desistir. Os obstáculos todos têm, acredito que grande parte dos atletas em algum momento da carreira pensou em parar, fazer outra coisa. Quando você pensa nisso, lembra de todas as dificuldades que já passou, tudo que enfrentou, daqueles que disseram que não iria conseguir", contou Vinicius, volante de origem, mas que jogou improvisado e, aos 23 anos, acabou campeão da Segunda Divisão desta temporada, com a Portuguesa Santista.

O campeonato é composto quase em sua totalidade por jovens, já que são permitidos jogadores até 23 anos. As exceções ficam por conta dos atletas inscritos acima do limite, - são autorizados três por equipe - caso de Itamar. Humilde e trabalhador, como ele mesmo se define, o atacante de 28 anos rodouo mundo da bola, chegou a largar a carreira, mas a vontade de brilhar falou mais alto.

Cria da base do Sport-PE, Itamar se aventurou em times do Portugal e Paraguai. A almejada estabilidade, contudo, nunca chegou. De volta ao Brasil, rodou pelo interior paulista e se desiludiu entre tantas incertezas. Foi então que se viu obrigado a parar, após o nascimento de sua filha.

Com 28 anos, Itamar foi um dos destaques da Segunda Divisão Foto: Fernanda Morais/ Tanabi

"Fui para uma empresa metalúrgica com meu irmão, onde fazia peças de carro. Durante os dois anos que fiquei parado recebi vários convites, mas rejeitei por decepção. Essa realidade do futebol é dura, ingrata e muitos acham que é tudo lindo. Com o nascimento da minha filha eu tinha obrigação de sustentar a casa, acordava de madrugada para trabalhar. Mas quando é pra ser, não tem jeito, vai ser. Eu não queria mais jogar e depois acabei voltando. Enquanto você tiver esperanças, precisa insistir. Meu sonho é ainda chegar em um time de elite. Nunca é tarde", disse Itamar, artilheiro do Tanabi no campeonato, com 16 gols.

Campeão da Copa do Mundo em 2002, melhor jogador do Mundial de 2000 pelo Corinthians e vencedor dos Brasileirões de 98 e 99 pelo clube alvinegro, Edílson Capetinha alcançou aquilo que todos os atletas buscam. Se acostumou a ser ovacionado e reconhecido por onde passa. Na dura realidade da Segunda Divisão, porém, se deparou com o outro lado do futebol.

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"A mídia não dá tanta atenção, o público não tem muito acesso e os clubes não possuem grandes condições de investimento, é extremamente complicado se manter. Foi diferente de tudo que vivi, mas foi uma boa experiência. A gente acaba servindo de exemplo, consegue passar muita coisa para os mais novos. Tem muito garoto bom nessas divisões menores, com uma força de vontade incrível", comentou o atleta de 46 anos que nesta temporada jogou pelo Taboão da Serra. O veterano é apenas mais um que prolongou a carreira, assim como Tuta (42 anos) e Túlio Maravilha (47 anos).DURA REALIDADE As dificuldades de se disputar a Segunda Divisão são difíceis de enumerar. Vão desde salários muito baixos, falta de patrocinadores e viagens desgastantes, a até mesmo alimentação inadequada e falta de material esportivo. A infraestrutura moderna, com hotéis de luxo, nutricionista e bons centros de treinamento, não faz parte da rotina destes atletas.

"Os clubes não tem muitas condições. É a realidade. A diretoria sempre deixava isso claro, a maioria não recebia, só com ajuda de empresários. As viagens são longas e a gente não tem um local bom pra descansar, porque falta dinheiro pra pagar o hotel, isso é complicado, porque é um campeonato com jogadores bons, com potencial", disse Itamar.

Buscando driblar tais dificuldades, as equipes investem no marketing, em ações fora das quatro linhas para atrair o torcedor, assim como conta o presidente do Taboão da Serra Anderson Nóbrega, que acabara de conquistar o acesso à Série A3.

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"É preciso pensar diferente dos outros, inovar. Nós trouxemos jogadores famosos, experientes, para conseguir atrair o torcedor. É necessário ser criativo, porque senão você fica sem condição nenhuma de cumprir um contrato. Como um clube pequeno, sem renda, vai pagar salário, mesmo que seja um mínimo? Não tem incentivo nenhum. No Taboão ainda conseguimos sobreviver por causa desse marketing", falou o mandatário, que completou.

"Uma hora os clubes menores vão acabar estourando, porque não existe calendário, você joga três, quatro meses e acaba. Para evitar custos acaba cortando as categorias de base, perdendo a chance de revelar atletas. Os times da quarta divisão não disputam a Copa Paulista e também não adianta abrir campeonato pro ano todo se o clube não tem incentivo, não tem como manter o jogador. Para se manter, você acaba tirando do próprio bolso."

Campeão pela Portuguesa Santista, Vinicius destacou o sonho de brilhar Foto: Douglas Teixeira/ Agenciabriosa.com.br

Edílson Capetinha se encaixa exatamente na função procurada por Nóbrega. O atacante atua em algumas partidas e possui papel relevante fora dos gramados.

"Hoje com isso de marketing, de mídia, as pessoas tem acesso muito rápido. Os dirigentes buscam investir nisso, trazer jogadores consagrados, que mesmo mais velhos, ainda estão em forma, se preparam e podem perfeitamente jogar. Eu aceitei por causa do projeto, não por dinheiro", revelou.

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