Análise: EUA têm 4,4% da população mundial e possuem 42% das armas

De 1966 a 2012, 31% dos autores de assassinatos em massa no mundo eram americanos, segundo estudo da Universidade do Alabama

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Por Max Fisher , John Keller e NYT
Atualização:

Por que os EUA têm tantos assassinatos em massa? Alguns especulariam que talvez seja porque a sociedade americana é usualmente violenta. Ou porque suas divisões raciais desafiam os limites da sociedade. Ou porque seus cidadãos não teriam a devida assistência em saúde mental sob um sistema previdenciário que sofre frequentes críticas no exterior.

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Embora sejam sensatas, essas explicações foram consistentemente desmascaradas por pesquisas em outras partes do mundo. A única variável que pode explicar a alta taxa de assassinatos em massa nos EUA é o número astronômico de armas do país. Os índices sugerem uma correlação cada vez maior e mais clara entre posse de armas e morte por elas.

Os americanos são 4,4% da população mundial, mas possuem 42% das armas existentes. De 1966 a 2012, 31% dos autores de assassinatos em massa no mundo eram americanos, segundo estudo de Adam Lankord, professor da Universidade do Alabama.

Ajustando-se as populações, apenas o Iêmen tem um índice maior de assassinatos em massa entre países com mais de 10 milhões de habitantes. E o Iêmen é o país que tem a segunda taxa mais alta de armas do mundo, depois dos Estados Unidos.

Em todo o mundo, concluiu Lankford, a taxa de posse de armas de um país está ligada ao número de assassinatos em massa. Assassinatos em massa são mais consequências do acesso de uma sociedade a armas que de seu nível básico de violência.

Vigília pelos mortos em Dayton Foto: Maddie McGarvey/NYT

Se a saúde mental faz a diferença, então os dados mostrariam que os americanos têm mais problemas de saúde mental que a população de outros países com menos assassinatos em massa.

Mas o gasto em saúde mental nos EUA, seu índice per capita de profissionais do ramo e a taxa de doenças mentais estão todos alinhados a outros países ricos.

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Evidências na cena do crime em Dayton Foto: Tom Russo/EFE EPA

Segundo um estudo de 2015, apenas 4% das mortes por armas de fogo nos EUA podem ser atribuídos a distúrbios mentais. Lankford diz que países com taxas mais altas de suicídios tendem a ter índices mais baixos de assassinatos em massa – o oposto do que se poderia esperar se problemas mentais fossem a causa maior de assassinatos em massa.

O índice de homicídios com armas de fogo nos EUA foi de 33 por milhão de habitantes em 2009, o que excede de longe a média de países desenvolvidos. Canadá e Reino Unido têm respectivamente 5 e 0,7 por milhão.

Os americanos às vezes veem os assassinatos em massa como expressão de problemas mais profundos em relação ao crime, noção alimentada em parte por filmes mostrando violência de gangues urbanas no início dos anos 90.

Mas os EUA não são hoje mais propensos a assassinatos que outros países desenvolvidos, segundo estudo de 1999 da Universidade da Califórnia em Berkeley.

Esses dados confirmam que nos EUA o crime é simplesmente mais letal. Um nova-iorquino tem tanta possibilidade de ser assaltado quanto um londrino, mas o nova-iorquino tem 54 vezes mais risco de ser morto no assalto.

Americanos fizeram vigília por vítimas do massacre em El Paso Foto: John Locher

Críticos do controle de armas apontam para um estudo de 2016, segundo o qual de 2000 a 2014 o número de mortes em assassinatos em massa nos EUA foi de 1,5 por milhão de pessoas. Na Suíça, o índice foi de 1,7 e na Finlândia, de 3,4, o que segundo eles, sugere que os assassinatos em massa nos EUA não são tão comuns.

Mas o mesmo estudo registra que no período houve 133 assassinatos em massa nos EUA, enquanto a Finlândia teve apenas 2, nos quais morreram 18 pessoas, e a Suíça, 1, em que morreram 14.

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Os EUA têm alguns dos controles mais frouxos sobre quem pode comprar uma arma e que armas podem ser compradas. A Suíça é o segundo país como a maior proporção de armas entre países desenvolvidos, cerca de metade da média dos EUA.

Sua taxa de homicídios por armas de fogo em 2004 foi de 7,7 por milhão de habitantes – alta, considerando-se a relação entre posse de armas e homicídios, mais ainda uma fração do índice dos EUA. A Suíça tem leis mais restritivas sobre porte e tipos de armas que se pode ter.

Ao lado de seus filhos Gael (D), de 6 anos, e Anderson, de 8 anos, Marlen Xiomara Moya chora enquanto espera para ser levada a um centro de processamento de pedidos de imigração em El Paso, no Texas Foto: Washington Post photo by Carolyn Van Houten.

Já os EUA são um de apenas três países – os outros são México e Guatemala – com uma concepção oposta: a de que as pessoas têm o direito inerente de possuir armas.

No Reino Unido, após um assassinato em massa em 1987, o país instituiu leis estritas de controle de armas. O mesmo fez a Austrália, após um incidente do gênero de 1996.

Mas os EUA viram-se repetidamente frente ao mesmo dilema e decidiram que um controle relativamente aberto da posse de armas é algo com que a sociedade tem de conviver.

Essa escolha, mais que as estatísticas ou as regulamentações, é que mantém o país isolado nesse campo. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ

*SÃO JORNALISTAS

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