Cenário: Em reunião fechada, Venezuela lança indiretas a Bolsonaro
Em reuniões fechadas entre embaixadores na ONU para tratar do fluxo de venezuelanos, a tensão entre os países da América Latina era evidente
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Por Jamil Chade e CORRESPONDENTE/GENEBRA
Atualização:
GENEBRA - Em reuniões fechadas entre embaixadores na ONUpara tratar do fluxo de venezuelanos, a tensão entre os países da América Latina era evidente. Nesta sexta-feira, o Estado foi o único jornal a ter acesso a um encontro privado entre os governos, momentos antes do lançamento do plano da ONU para socorrer a região e avaliado em US$ 738 milhões.
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Criticando o que ele chamou de manipulação da crise em seu país, o embaixador da Venezuela na ONU, Jorge Valero, lançou um ataque velado contra o governo de Jair Bolsonaro. Para ele, é “incompreensível” que países se apresentem como se estivessem “preocupados com a migração”, enquanto se recusam a aderir ao Pacto Global de Migração da ONU, assinado no início da semana.
O governo de Michel Temer enviou seu chanceler ao encontro no Marrocos para assinar o compromisso sobre migração. Mas horas depois, o futuro chanceler Ernesto Araújo comunicou pelas redes sociais que o Brasil irá se dissociar do texto. “Países da nossa região o recusaram”, insistiu Jorge Valero.
Procurados pela reportagem depois do encontro, diplomatas venezuelanos apontaram que o discurso tinha o governo Bolsonaro como foco. “Todos sabem de quem estamos falando”, justificou uma diplomata.
O governo brasileiro não pediu a palavra durante o encontro e não se pronunciou, mesmo diante do principal pacote de ajuda já criado pela ONU para a região. Fontes alegaram que, em um momento de transição entre dois governos, a missão do Brasil não havia recebido instruções de Brasília.
A imigração venezuelana para o Brasil em 20 fotos
1 / 20A imigração venezuelana para o Brasil em 20 fotos
Roraima
Cerca de 40 mil imigrantes vivem atualmente em Boa Vista, capital de Roraima. Em um ano, chegada de venezuelanos aumentou em 10% a população da cidade... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Travessia
Cerca de 700 imigrantes fazem fila diariamente na fronteira da Venezuela com o Brasil, próximo ao município de Pacaraima, em Roraima Foto: Werther Santana/Estadão
Caminho
Após atravessarem a fronteira, muitos venezuelanos caminham por dias pela estrada até a chegada em Boa Vista. Foto: Werther Santana/Estadão
Carona
Na foto, a família de Francisco da Encarnación tenta conseguir uma carona pela BR-174 atéBoa Vista Foto: Werther Santana/Estadão
Abrigo
Os cinco abrigos de Boa Vista estão superlotados. Na foto, o abrigo do bairro Pintolândia, no qualimigrantes vivem dentrode um ginásio e em tendas no ... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Descanso
Nos abrigos, imigrantes dormem em colchões dispostos no chão ou em redes improvisadas Foto: Werther Santana/Estadão
Rotina
Na foto, imigrantes penduram roupas em ginásio transformado em abrigo pela Defesa Civil de Roraima Foto: Werther Santana/Estadão
Em praças
Com os abrigos lotados, imigrantes montaram barracas improvisadas nas praças, mas não contaram com a ajuda do poder público. Na Praça Simon Bolívar, p... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Falta de estrutura
Comércio no entorno de praça cobra R$ 3 para venezuelanos utilizarem banheiros. Sem alternativa, muitos procuram matagais próximos para urinar e defec... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Superlotação
Dentre os abrigos,a pior situação é a do localizado no bairro Pintolândia, que acolhe apenas venezuelanos indígenas. O local tem capacidade para 370 p... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Refeições
Na foto, venezuelanos esperam na fila para receber comida noGinásioTranquedo Neves, transformado em abrigo pela Defesa Civil em Boa Vista Foto: Werther Santana/Estadão
Refeições com sobras
Com a chegada de mais refugiados à cidade e a falta de vagas em abrigos, os que vivem em praças começaram a buscar alternativas para comer. Inicialmen... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Fechamento de fronteira
A governadora de Roraima, Suely Campos (PP), se encontrou na quinta-feira com a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), relatora da aç... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Higiene
Venezuelanos acampados em praça de Boa Vista andam mais de dois quilômetros até o Rio Branco para tomar banho ou lavar roupas. Foto: Werther Santana/Estadão
Comércio improvisado
Ruas do entorno do abrigo Tancredo Neves viraram uma espécie de feira ao ar livre de venezuelanos, com venda de alimentos e cigarros e prestação de se... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Trabalho
O trabalho autônomo foi a opção encontrada por imigrantes que não conseguem emprego na capital de Roraima. Alguns vendem os poucos itens que trouxeram... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Precarização
Outra mudança no mercado de trabalho de Boa Vista trazida pela imigração foi a redução no valor das diárias pagas a profissionais autônomos. Com muita... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Nas ruas
Venezuelanos trabalham nos faróis lavando os retrovisores de carros para ganhar trocados em Boa Vista Foto: Werther Santana/Estadão
Prostituição
Moradores contam que a presença de garotas de programa nas calçadas se intensificou com o aumento da imigração venezuelana na cidade. Antes, dizem ele... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Violência
Com o aumento da população, Boa Vista viu o número de ocorrências criminais dobrar. Mas apenas 0,5% dos crimes foi cometido por venezuelanos, segundo ... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Valero, porém, não poupou críticas à iniciativa e alertou diante dos demais diplomatas contra a “utilização das pessoas para fins políticos”. O embaixador ainda acusou governos da região de “inflar os números de migrantes e refugiados para extorquir a comunidade internacional e receber recursos”.
Caracas teme que a qualificação da crise como uma emergência humanitária sirva como pretexto para uma eventual ação militar contra o presidente Nicolas Maduro.
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Durante o encontro, o venezuelano lembrou que, por anos, Caracas recebeu 5 milhões de colombianos por conta do conflito armado no país vizinho. “Nunca mendigamos recursos ao mundo”, criticou. O embaixador ainda se recusou a aceitar a qualificação dada pela ONU para a situação em seu país e indico que a “supostos crise humanitária” era exagerada pelos governos.
Para ele, é o embargo imposto pelo governo americano e pela UE que levou à atuação situação. “Denunciamos a guerra econômica. Ela está causando dor e morte. A saída de pessoas é resultado dessa situação”, insistiu.
Enquanto governos como o da Costa Rica, Colômbia e outros tomaram a palavra para descrever a dimensão do desafio de receber os venezuelanos, tradicionais aliados de Caracas rejeitavam o plano. “Seríamos hipócritas se não falarmos de como se manipula um tema humanitário para fins políticos”, atacou Havana. Para os cubanos, o plano da ONU não pode significar uma ingerência política ou na soberania da região.