O futuro dos extremistas

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Por Ian Bremmer
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Como uma organização terrorista que parece ter declarado guerra contra todo o mundo espera sobreviver? O Estado Islâmico (EI), a organização terrorista mais bem financiada, equipada e mais sofisticada tecnicamente da história não vai aumentar muito o território que domina no Iraque e na Síria em 2016. O grupo, no entanto, não vai apenas sobreviver, mas também estender sua influência internacional. Há muitas razões para isso acontecer.  Seus inimigos estão divididos a respeito da melhor maneira de atacá-lo. O EI atrai apoio de sunitas privados de seus direitos tanto no Iraque quanto na Síria, mas sua maior vantagem sobre outras organizações militantes como Al-Qaeda e Taleban encontra-se em suas promessas aos que passam a integrar suas fileiras.  O EI oferece mais do que uma chance de lutar contra um inimigo distante, numa guerra longa em direção a um futuro incerto, mas sim um plano para construir algo tangível e novo, um império com fronteiras estabelecidas por guerreiros muçulmanos, não por políticos ocidentais.  A cada nova atrocidade cometida pelo grupo, surgem promessas, na Europa e nos EUA, de levar os combates diretamente para onde estão seus comandantes, na Síria e no Iraque. Mas desmantelar o EI significa combate terrestre. Eles não podem ser destruídos pelo ar. Ninguém, nem os americanos, franceses, russos ou qualquer um, vai aceitar os custos em vidas e recursos que tal operação demandaria. Divisão. Mesmo no ar, os inimigos mais poderosos do grupo têm objetivos opostos. Os EUA vão soltar mais bombas, mas o presidente Obama não tem intenção de voltar a enviar tropas para guerra em solo no Oriente Médio. A Rússia quer principalmente apoiar seu aliado, o presidente sírio Bashar Assad, atacando rebeldes apoiados por EUA e Arábia Saudita. Além disso, Moscou tem feito pouco contra o EI.  A Turquia vai se concentrar em ataques contra os curdos sírios e os franceses não têm uma coalizão para liderar. Os combatentes iranianos têm poucas armas e os países do Golfo não têm tropas terrestres. No Iraque, o governo dominado pelos xiitas de Bagdá não terá êxito verdadeiro contra o EI até que ofereça aos sunitas participação no futuro do país e uma razão para lutar por ele.  Quando as forças americanas retiraram Saddam Hussein do poder, colocaram de lado os partidários do presidente no partido Baath, incluindo os integrantes das Forças Armadas. Somente o EI deu aos sunitas meios para se defenderem. Até que esse problema seja tratado, o grupo manterá o comando do território iraquiano dominado pelos sunitas.  Além disso, o EI e os grupos que o imitam têm terreno mais que suficiente para operar. Em graus variados, Síria, Iraque, Líbia, Iêmen e Afeganistão são Estados falidos. Todos oferecem vastas extensões de território sem governo que servem de esconderijo e campos de treinamento para militantes.  No nordeste da Nigéria, norte do Mali, na Península do Sinai no Egito, mais militantes estão aprendendo seu ofício. Grandes campos de refugiados na Turquia, na Jordânia e no Líbano são terrenos férteis para recrutamento de novos militantes.  O EI também tem dinheiro suficiente para ampliar suas ambições. Graças à venda de petróleo de poços capturados, ao dinheiro de resgate de sequestros, à cobrança de impostos das populações locais, ao apoio financeiro de amigos no Golfo e ao saque de bancos capturados em cidades iraquianas, a organização acumulou reservas de mais de US$ 1 bilhão. O grupo extremista também domina o uso das redes sociais e de mensagens criptografadas para expandir sua rede. Estabilidade. Mais importante é o fato de que o EI oferece uma ideia global em que grupos regionais como o Taleban e a Al-Qaeda não podem se igualar. O Taleban continua a ser um movimento da etnia pashtun no Afeganistão e no Paquistão e tem pouca atratividade fora de seu território principal. A visão da Al-Qaeda é apocalíptica. É mais difícil recrutar seguidores para o culto à morte do que para uma organização que promete um império e tomou grandes extensões de território em dois países com o objetivo de fazer suas promessas serem levadas a sério. Seu discurso de vendas é convincente. “Na Síria e no Iraque, você não tem futuro. Na Europa e nos EUA, eles o excluem porque odeiam você. Venha construir. Junte-se à primeira geração. Nós acolhemos você.” Esse convite – e não apenas a oportunidade de matar muçulmanos “apóstatas” e não muçulmanos – continua a ser um sucesso. Evolução. Para onde tudo isso leva? Em última análise, a construção do EI é a vulnerabilidade original do grupo. Ninguém pode eliminar totalmente o terrorismo porque depende apenas do desejo de morrer de um único indivíduo para aumentar o alcance internacional do grupo extremista.  Mas os muitos inimigos do EI têm poder mais que suficiente para evitar que a organização mantenha e concretize suas promessas de construir um Estado em pleno funcionamento. Os ataques aéreos a bomba contra alvos do grupo extremista na Síria apenas começaram.  Nesse meio tempo, porém, o EI tem mais surpresas desagradáveis para o restante do mundo. Em 2016, sua influência só deve aumentar. / TRADUÇÃO DE PRISCILA ARONE *Ian Bremmer é presidente do Eurasia Group e professor de pesquisa global na Universidade de Nova York

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