Perfil: Alejandro Andrade, o escudeiro de Chávez 

Como a maioria dos jovens da classe média venezuelana empobrecida da época, Andrade ele escolheu o Exército como carreira, onde conheceu o tenente-coronel que viria a comandar o país

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Por Luiz Raatz
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Alejandro Andrade Cedeño é um amante dos cavalos. Nascido no bairro de Coche, reduto de casas populares na zona oeste de Caracas, foi criado nos arredores do Hipódromo La Rinconada. Elaborado pelo arquiteto americano Arthur Froehlich e com os jardins ornados pelo paisagista brasileiro Roberto Burle Marx, o templo do turfe era um dos símbolos do auge petroleiro e democrático da jovem Quarta República venezuelana, na década de 60. 

Como a maioria dos jovens da classe média empobrecida da época, Andrade escolheu o Exército como carreira. Formado na turma de 1987, se aproximou na caserna de um jovem tenente-coronel do destacamento de paraquedistas, inconformado com as ordens do governo de Carlos Andrés Perez para reprimir manifestantes durante a onda de protestos populares contra alta da gasolina. Seu nome era Hugo Chávez. 

Chávez e a mulher, Marisabel, em 1999, em Caracas, protegidos por Alejandro Andrade (atrás de Chávez); parceria rendeu frutos ao segurança Foto: BERTRAND PARRES/AFP/Getty Images / PAGOS

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Em 1992, fez parte do chamado Movimento Revolucionário Bolivariano-200, com o qual Chávez tentou, em vão, tomar o poder.  Apesar da derrota, os vínculos forjados entre os dois seriam duradouros. Foi segurança pessoal de Chávez e a vitória do líder bolivariano nas urnas, em 1998, permitiu a Andrade ser indicado subsecretário da Assembleia Constituinte convocada pelo companheiro de armas no ano seguinte. Ali, seria o início de uma relação promíscua com o Estado venezuelano, que duraria pelo menos até a morte do líder bolivariano, em 2013. 

Da Constituinte, ele foi nomeado vice-ministro de Finanças, presidente do banco de desenvolvimento venezuelano e secretário particular de Chávez. Com o tempo, se tornaria um dos expoentes da “boliburguesia”, termo designado para oficiais chavistas que enriqueceram ao longo da revolução bolivariana.

As primeiras denúncias de corrupção viriam em 2001, quando ele foi acusado de malversação de fundos quando geriu o Fundo Único Social, autarquia chavista responsável por distribuir doações a entidades se assistência social. Segundo o diário El Nacional, apenas 16% dos recursos foram comprovadamente usados e o resto teria sido desviado por Andrade. A Assembleia Nacional chegou a abrir uma investigação, que nunca foi concluída. 

O ponto de virada de Andrade em sua ascensão na burocracia chavista veio em 2007, quando foi indicado para a Oficina Nacional do Tesouro, entidade vinculada ao Ministério da Economia. Ali, segundo seu acordo de delação premiada com a Justiça americana, passou a receber propina para favorecer empresas amigas do governo na compra de dólares – que passou a ser regulada pelo chavismo em 2003. 

A propina, segundo o Departamento de Justiça americano, vinha de contas na Suíça e a partir de 2010 começou a ser usada para pagar bens e itens de luxo para Andrade e sua família e permitiu que o antigo amor do tenente pelos cavalos fosse vivido em hípicas e hipódromos na Venezuela e depois nos Estados Unidos.

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Tornou-se frequentador assíduo do reservado Country Club de Caracas, onde, por ser “o homem do presidente”, era tratado com esmero. Tinha vaga reservada e sempre que necessário, colaborava com o clube com gastos para treinamento, logística e cuidados com os cavalos. Falante, bem vestido e sempre solícito com os companheiros de Country Club, perdeu um olho jogando beisebol na juventude. Ele colocou seu filho mais velho, Emmanuel, para treinar para ser cavaleiro profissional. Emanuel chegou a disputar os Jogos Olímpicos do Rio, em 2016. Ficou em 61º lugar nos saltos com o cavalo Hardrock Z. 

De 2012 em diante, o dinheiro oriundo de propina no câmbio negro de dólar possibilitou que o antigo guarda-costas de Chávez se mudasse para os Estados Unidos. Fixou residência no exclusivo condado de Palm Beach, na cidade de Wellington, numa vizinhança milionária, onde tinha como vizinhos Madonna e Bill Gates. 

A casa luxuosa, comprada perto do hipódromo local, tornou-se residência fixa depois da morte de Chávez. Ali, continuou comprando cavalos, joias e até aviões com dinheiro de propina vindo da Suíça. Segundo a Justiça americana, apenas em 2012 – último ano de Chávez no poder, os depósitos somaram US$ 29 milhões. 

Críticos do chavismo atribuem à corrupção cambial um dos motivos para a atual crise. “O controle de câmbio enriqueceu muita gente no governo”, diz o economista Angel García Banchs. “Como o governo nunca se desfez dele, tornou-se impossível normalizar a política cambial no país.”

No acordo com a Justiça americana, Andrade perdeu a casa de luxo, com cinco quartos, piso de mármore e uma piscina. O Departamento de Justiça também apreendeu um haras, 17 cavalos de competição, 11 carros de luxo – entre eles três Mercedes-Benz, um Cadillac e um Bentley – e 30 relógios de luxo. 

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