Putin está disposto a negociar com Biden sobre guerra na Ucrânia, mas nega retirada de tropas

Porta-voz afirmou que presidente russo está disposto a negociar pelos interesses do país, mas que não vai aceitar imposições dos EUA sobre ‘operação militar especial’

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Por Redação
Atualização:

MOSCOU ― O presidente da Rússia, Vladimir Putin, está disposto a abrir conversas sobre a guerra na Ucrânia com o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, mas não vai ordenar uma retirada de tropas do país vizinho para viabilizar o diálogo diplomático. O entendimento de Putin sobre o tema foi apresentado pelo porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, nesta sexta-feira, 2, um dia após Biden afirmar que poderia falar com Putin, se o russo encerrar invasão na Ucrânia.

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“O que Biden disse na realidade? Ele disse que as negociações são possíveis apenas depois que Putin abandonar a Ucrânia”, afirmou Peskov a jornalistas nesta sexta, antes de acrescentar que Moscou “evidentemente” não está tem intenção de aceitar essas condições. “A operação militar especial vai continuar”.

Segundo o Kremlin, a solução diplomática é dificultada pelo não-reconhecimento de Washington e de outros países ocidentais das anexações feitas pela Rússia em território ucraniano em setembro. As anexações, que ocorreram nas províncias de Donetsk, Luhansk, Kherson e Zaporizhzhia, são consideradas fraudulentas pelo Ocidente.

“O governo dos Estados Unidos não reconhece os novos territórios como parte da Federação da Rússia”, disse Peskov, indicando que o ponto tem um peso decisivo para o Kremlin.

Joe Biden e Vladimir Putin são fotografados durante encontro em Genebra, na Suíça, em 2021; contato direto entre líderes das maiores potências nucleares do mundo está interrompido desde a invasão da Ucrânia. Foto: Patrick Semansky/ AP - 16/06/2021

A declaração do Kremlin é uma resposta a afirmações feitas por Joe Biden na quinta-feira, 1°. Em uma coletiva de imprensa conjunta com o presidente francês, Emmanuel Macron, Biden disse que poderia abrir uma linha-direta com Putin sobre o conflito, após consultar seus aliados da Otan, e desde que não prejudicasse os interesses ucranianos. Ele não mencionou como condição a retirada prévias das tropas russas da região.

“Deixe-me escolher minhas palavras com muito cuidado”, disse Biden na quinta. “Estou preparado para falar com Putin se de fato houver interesse em que ele decida que está procurando uma maneira de acabar com a guerra. Ele ainda não fez isso.”

Mais cedo, Putin também conversou por telefone com o chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, e reiterou a dificuldade diplomática pelo não-reconhecimento das anexações. Além disso, segundo o Kremlin, Putin afirmou a Scholz que os países ocidentais adotaram uma posição “destrutiva” ao armar e treinar as tropas ucranianas. O chanceler alemão teria condenado os ataques aéreos a infraestrutura energética da Ucrânia.

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O diálogo entre Estados Unidos e Rússia desde o começo da guerra na Ucrânia está limitado desde o início da invasão da Ucrânia, sem nenhum contato direto entre Biden e Putin neste período. Em uma entrevista na quinta-feira, o chanceler russo, Serguei Lavrov, afirmou que foram estabelecidos canais separados de comunicação para tratar de temas de interesse compartilhado, como o caso de americanos presos na Rússia ― como a jogadora de basquete Brittney Griner.

Quando falou com a imprensa, o chanceler russo já havia afirmado que Moscou está aberta a negociações sobre o fim do conflito, mas não fez nenhum pedido neste sentido. “Nunca pedimos conversas, mas sempre dissemos que estamos prontos para ouvir aqueles que estão interessados em um acordo negociado”, disse ele.

Na mesma entrevista, Lavrov promoveu uma escalada retórica contra o Ocidente, acusando os EUA e a Otan de se envolverem diretamente no conflito ao fornecer armamentos e treinar soldados do país do Leste Europeu.

“Você não deveria dizer que os EUA e a Otan não estão participando desta guerra. Você está participando diretamente disso”, disse Lavrov a repórteres ocidentais durante uma coletiva de imprensa virtual na quinta-feira, 1°.”E não apenas fornecendo armas, mas também treinando pessoal. Você está treinando os militares [ucranianos] em seu território, nos territórios do Reino Unido, Alemanha, Itália e outros países.”

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Embora conversas de paz já tenham sido pedidas e mediadas por líderes mundiais e organizações internacionais ― rodadas de negociação chegaram a ser organizadas na Turquia ―, as negociações para um eventual acordo não evoluem por discordâncias acentuadas entre Kiev e Moscou.

Uma das exigências do lado russo, por exemplo, é que o governo ucraniano reconheça a Crimeia, tomado em 2014, e os territórios de Donetsk, Luhansk, Zaporizhzhia e Kherson, como parte do território da Rússia. Não se sabe também se o Kremlin aceitaria a manutenção do governo ucraniano atual, a quem acusa de ter orientação neonazista.

Do lado ucraniano, o governo de Volodmir Zelenski já se posicionou contra a perda de qualquer território para a Rússia, bem como cobra a responsabilização de autoridades do país vizinho por crimes de guerra.

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Bombardeios a Kiev são ‘inevitáveis’

Enquanto o diálogo entre os líderes das maiores potências nucleares do mundo não evolui, Putin conversou por telefone com o chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, e defendeu os bombardeios de Moscou a alvos na Ucrânia, classificando-os como “necessários e inevitáveis”, e disse que o Ocidente assume uma posição “destrutiva” ao dar apoio político, financeiro e militar ao país.

“Foi destacado que as Forças Armadas russas evitaram por muito tempo ataques com mísseis de alta precisão contra certos alvos na Ucrânia, mas tais medidas se tornaram necessárias e inevitáveis diante dos ataques provocadores de Kiev”, afirmou o Kremlin em nota, em um resumo das declarações do líder russo a Scholz.

Antes de telefonema nesta sexta, Scholz e Putin se encontraram em Moscou em fevereiro. Foto: Mikhail Klimentyev/ Sputnik/Kremlin via Reuters
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Putin também acusou a Ucrânia de ser responsável pelas explosões que destruíram parcialmente a ponte russa da Crimeia e instalações de energia russas, o que, segundo o raciocínio do presidente, daria a Moscou o direito de bombardear a infraestrutura energética da Ucrânia, deixando milhões de civis sem luz e sem aquecimento.

Durante a conversa telefônica de uma hora, Scholz “pediu ao presidente russo que encontre uma solução diplomática o mais rápido possível, o que envolve a retirada das tropas russas”, disse o porta-voz do governo, Steffen Hebestreit, em nota. Scholz também teria pedido que Putin “revise sua posição no contexto dos eventos ucranianos”.

A mensagem de Putin ao líder alemão também reverbera as declarações de Lavrov um dia antes. Além de abordar a questão da ajuda ocidental a Kiev, o diplomata defendeu os ataque, apontando que eles visam enfraquecer o potencial militar ucraniano e inviabilizar as entregas de carregamentos de armas ocidentais.

“A infraestrutura visada por esses ataques é usada para garantir o potencial de combate das forças armadas ucranianas e dos batalhões nacionalistas”, disse Lavrov, acrescentando que eliminar as instalações de energia diminui a capacidade do país “matar russos”./ Com AFP e AP

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