PARIS - A retirada americana da Síria pode obrigar a coalizão árabe-curda no país a deixar de combater os extremistas islâmicos e provocar, indiretamente, a libertação de centenas de jihadistas estrangeiros, alertou uma autoridade curda nesta sexta-feira, 21, em Paris.
"Combater o terrorismo será difícil, porque nossas forças se veriam obrigadas a se retirar das linhas de frente (na Província) de Deir Es-zor (último reduto do grupo jihadista Estado Islâmico), para se posicionar perto da fronteira turca e repelir um eventual ataque", afirmou à imprensa Ilham Ahmad, um dos responsáveis políticos da coalizão.
O temor de uma ofensiva da Turquia contra os curdos foi confirmado nesta sexta pelo presidente Recep Tayyip Erdogan, que prometeu eliminar os jihadistas e as milícias curdas no norte da Síria.
Contudo, Erdogan afirmou que decidiu, à luz do anúncio americano e um telefonema com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, adiar a ofensiva que planejava lançar contra as Forças de Proteção do Povo (YPG), uma milícia curda considerada terrorista por Ancara, mas aliada de Washington na luta contra o Estado Islâmico (EI). "Este adiamento não será, obviamente, por um período indeterminado", disse ele.
Os responsáveis curdos estão em Paris para discutir com as autoridades francesas a nova situação na região após o anúncio de Trump de retirar em breve os 2 mil soldados americanos mobilizados na Síria para combater ao lado da coalizão árabe-curda. Esta retirada muda completamente o equilíbrio de forças neste país em guerra.
Ahmad também alertou que, no cenário de um confronto direto com a Turquia, os curdos sírios poderiam perder o controle de vários jihadistas estrangeiros, principalmente europeus, que atualmente estão presos sob controle dos árabes-curdos. "Tememos não controlar mais a situação e que seja difícil para nós mantê-los (os detidos jihadistas) em um determinado local", em caso de ofensiva turca, ressaltou Ahmad.
Outra autoridade curda presente em Paris, Riad Drar, declarou que uma libertação dessas seria, evidentemente, involuntária. "Tememos um cenário de caos, de tal modo que será difícil proteger as localidades onde eles (os jihadistas) são mantidos em detenção."
O destino dos extremistas estrangeiros detidos na Síria é um verdadeiro quebra-cabeça para muitos países de origem desses prisioneiros, que não os desejam de volta. "Pedimos aos franceses apoio diplomático", ressaltou Ahmad, estimando que as autoridades francesas "podem pressionar a Turquia para que parem com suas ameaças". "Também pedimos que as forças (francesas) assumam seu papel na região até que uma solução política seja encontrada", acrescentou.
Desde 2014, o EI perdeu a maior parte de seu autoproclamado "califado", abrangendo a Síria e o Iraque, graças, em grande parte, às forças árabes-curdas. / AFP