Ator de 'Viúva Negra' e 'Stranger Things', David Harbour adora um papel de ‘perdedor’

O ator fala sobre seus papéis como um super-herói fracassado no novo blockbuster da Marvel e como um contador em 'Nem Um Passo em Falso', de Steven Soderbergh

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Por Dave Itzkoff
Atualização:

Nunca é uma hora muito boa para ser um perdedor, mas este é um momento excelente para ser David Harbour, que dá vida a personagens problemáticos em seus filmes mais recentes

Harbour, mais conhecido como Jim Hopper, o chefe de polícia relutantemente heroico de Stranger Things, da Netflix, pode atualmente ser visto em Viúva Negra, o filme da Marvel dirigido por Cate Shortland. Harbour interpreta Alexei, soldado russo que anteriormente levava uma vida emocionante como o herói fantasiado Red Guardian, mas que agora está confinado a uma prisão de inverno onde se tornou selvagem e obeso. Isto é, até ser resgatado por Natasha Romanoff (Scarlett Johansson) e Yelena Belova (Florence Pugh), as espiãs que ele criou como se fossem filhas.

David Harbour é casado com a cantora pop Lily Allen. Foto: Akasha Rabut/The New York Times

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Alexei é o mais recente de uma série de fracassados estranhamente atraentes interpretados por Harbour. O ator também aparece no novo thriller da HBO Max, Nem Um Passo em Falso, de Steven Soderbergh, como Matt Wertz, contador atraído para um empreendimento criminoso que está muito além de suas capacidades.

E esses são precisamente os tipos de personagens que Harbour adora interpretar. Como explicou em uma entrevista: "Os vencedores são ótimos e gostamos deles, rá-rá. Mas, para mim, a beleza dos seres humanos está na carne viva e nas falhas. Somos todos frágeis".

Agora com 46 anos e casado com a cantora pop Lily Allen, Harbour disse que estava mais feliz por ter encontrado o sucesso nesta fase da vida. "Se eu tivesse recebido tanta atenção quando era mais jovem... Meu Deus! Teria sido uma droga".

Em entrevista por vídeo, Harbour falou da produção de Viúva Negra e de Nem Um Passo em Falso, e sobre o conforto de trabalhar com Soderbergh durante uma pandemia. A seguir, trechos editados da conversa.

Existe uma história por trás de como você foi escalado para Viúva Negra?

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Foi estranhamente mundano. Uns amigos que fizeram teste para Guardiões da Galáxia me falaram de um covil ultrassecreto, e de como recebiam páginas de diálogo e depois as queimavam. Meu agente disse que Cate Shortland queria me encontrar para falar de um filme que ela estava fazendo. Ele nem sabia do que se tratava. Durante a reunião, ela me contou: "Estou fazendo o filme Viúva Negra para a Marvel com Scarlett Johansson".

E então começou a apresentar meu personagem como um cara que é grande e violento, com tatuagens e dentes de ouro, e que espera que todos riam quando conta uma piada. Ela me apresentou essas contradições incríveis e conversamos sobre todos esses dramas familiares com pessoas desesperadas, filmes como A Família Savage e Ricky Gervais em The Office. E me empolguei com tudo isso.

O ator David Harbor em New Orleans. Foto: Akasha Rabut/The New York Times

Você ficou lisonjeado em ouvir da diretora que ela o imaginava como essa pessoa?

Meu ego é muito estranho. Sempre fico lisonjeado, depois olho para trás e penso: por que você ficou feliz com isso? Também sou uma espécie de pária. Na minha juventude, com certeza eu era. Eu sempre quis ser ator porque queria que as pessoas se sentissem menos sozinhas.

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Mesmo quando interpreto um vilão, muita gente comenta: "De alguma maneira, você humanizou a experiência para que entendêssemos essa pessoa, em vez de julgá-la." É isso que me lisonjeia – ser usado como artista para que as pessoas entendam esse indivíduo profundamente perturbado e confuso, de quem alguém menos capaz zombaria. Talvez eu faça as duas coisas, mas espero poder ajudá-las a compreender melhor o personagem.

O que você filmou primeiro: as cenas em que seu personagem está em forma e bem arrumado ou as que ele está um caco?

Deixei crescer a barba e o cabelo para Stranger Things e achei que deveria ganhar peso. Então, comecei a comer ainda mais. Cheguei a quase 130 quilos e adorei. Eu disse ao primeiro assistente de direção: "Escuta, temos de filmar o flashback no fim, para que eu perca peso e fique magro." E ele respondeu: "Você nunca vai ficar magro." (Risos.) Rebati: "Vou, sim, cara." E perdi cerca de 30 quilos durante as filmagens. Nossa primeira locação foi a prisão, portanto aquela barriga que se vê na tela é de verdade. Enquanto filmávamos, comecei a perder peso. Fiquei faminto durante a maior parte das filmagens.

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Você fez muitas de suas cenas de ação no filme?

Eles realmente esperam que a gente faça isso e nos encorajam. Mas sou o anti-Tom Cruise quando se trata dessas coisas. Não quero pilotar o helicóptero. Quero que Alexei seja feito por oito pessoas diferentes. Sou o rosto. Acho ótimo usar dublês. Mas faço minhas cenas de luta. Eu não permitiria que ninguém mais brigasse por mim.

'Os vencedores são ótimos e nós gostamos deles. Mas para mim, a beleza dos seres humanos está nos fracassos. Somos todos frágeis', disse Harbor. Foto: Akasha Rabut/The New York Times

Como você conseguiu o papel em Nem Um Passo em Falso?

As filmagens foram interrompidas durante a covid, por isso eles mudaram muita coisa e montaram o filme de novo. Alguns atores não conseguiram retornar e foram substituídos; sou um dos substitutos. O processo de Steven Soderbergh é muito simples: ele me enviou o roteiro. "Você gostaria de fazer isso?" "Sim, muito." Eu o conheci pessoalmente no primeiro dia de trabalho.

O que você aprendeu sobre o personagem só com a leitura do roteiro?

Matt vive em uma prisão feita por ele mesmo. A tragédia de Matt é que ele não pode ser quem é, e vive essa mentira há muito tempo. É como se ele seguisse adiante de forma inconsciente, e, como um dos personagens diz no filme, ele teve uma chance, mas simplesmente a deixou passar. Essa é a verdadeira tragédia de Matt Wertz. Esperamos com empolgação que ele possa viver uma vida, finalmente, depois de tanta luta. E ele nos decepciona. (Risos.)

Esse foi o primeiro filme que você fez durante a pandemia?

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Essa foi minha primeira filmagem na pandemia. Stranger Things tinha voltado para a quarta temporada, em setembro, mas eles não precisaram de mim até janeiro. Surtei. Amo minha esposa e meus filhos, mas também preciso trabalhar para não ficar louco aqui, tentando educá-los em casa. Esse trabalho veio para mim e o aceitei.

Estivemos em Detroit por quase três meses, presos em um hotel. Mas, felizmente, eu estava com Soderbergh. Ele fez Contágio. Por isso, todos os caras do Centro de Controle e Prevenção de Doenças [CDC, na sigla em inglês] com quem ele tinha trabalhado estavam lá no set. Sempre conversávamos sobre as vacinas. Eu chegava para Soderbergh e perguntava: "Quando isso vai acabar?" E ele respondia: "Em algum momento do próximo ano, teremos vacinas." Eu queria saber qual delas ficaria pronta e ele disse: "A Pfizer está indo muito bem – duas doses". Foi incrível. Ao mesmo tempo que fazíamos o filme, descobríamos o que realmente estava acontecendo no CDC.

Depois de ter feito um filme da Marvel com um megaorçamento, você pôde trazer alguma coisa dessa experiência para Stranger Things?

Nesta temporada, faço muito mais cenas de ação. E, se é que posso dizer isso, fiz algumas coisas bastante impressionantes, que são fruto da humilhação no set de Viúva Negra, quando não fui capaz de fazê-las. Parece que meu ego está crescendo. Com sorte, quando eu tiver 55 anos, também estarei pendurado em um helicóptero, fazendo uma versão própria de Missão: Impossível.

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