THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Como uma autodeclarada marxista falida e estudiosa que passava seu tempo livre se convertendo ao judaísmo, eu não era popular entre meus colegas da faculdade de administração. Capitalizei minha invisibilidade brincando de antropóloga, observando silenciosamente as pessoas de longe. O que quer dizer: eu o notei anos antes de ele me notar.
Alto e perspicaz, ele tinha um sorriso generoso e um jeito relaxado no estilo Hugh Grant. Ele morava em uma das casas que davam todas as festas, daquelas em que você pagava US$ 50 para cobrir o consumo de bebidas. Eu não ia a essas festas, tanto porque não tinha dinheiro quanto porque não tinha ideia de como me socializar com pessoas que haviam trabalhado em private equity.
Aceitei que ele e eu nunca nos falaríamos.
E então, na primavera passada, cinco anos depois de nos formarmos, voei de Chicago para nossa reunião de classe na Califórnia. Eu estava tremendo ao lado de uma fogueira a gás fraca quando ouvi sua voz por cima do meu ombro, perguntando se o assento ao meu lado estava ocupado. De repente, de maneira improvável, estávamos conversando.
Depois de concordarmos vigorosamente com a opinião um do outro sobre a guerra na Ucrânia, o nacionalismo palestino, o fracasso institucional e nossos próprios fracassos de ação política, entramos em uma conversa sobre amor.
Eu disse a ele que passei oito dos últimos 13 anos totalmente solteira, sem nem mesmo um beijo. Eu tinha decidido em meus 20 e poucos anos que estava interessada em namorar apenas o tipo de pessoa com quem eu poderia passar um dia presa em um elevador sem ficar entediada ou irritada. Isso parecia ter limitado minhas opções de namoro a um número próximo de zero, especialmente se eu insistisse que a pessoa também fosse atraente, mais jovem que meu pai e solteira.
Eu disse a ele que estava pensando em abandonar o requisito de atração física; talvez o desejo pudesse crescer com o tempo. Ele fixou os olhos nos meus e disse que eu não deveria desistir da atração.
Ele me contou sobre seus relacionamentos mais importantes e como chegou perto do casamento. Eu perguntei o que deu errado. Ele disse que isso era o mais preocupante: ele não conseguia descrever bem, mas por mais maravilhosos que fossem esses relacionamentos, no final, algo estava faltando. Se houvesse um nome para a coisa que faltava, ele poderia procurá-la, mas ficou procurando por um item cujas dimensões e qualidades permaneciam desconhecidas.
Não tenho histórico de ajudar homens a localizar sentimentos perdidos.
Quando eu tinha 23 anos, meu namorado de quatro anos terminou comigo em um quintal infestado de mosquitos em Washington, DC, com o veredito de que eu era 99 por cento o que ele procurava em uma esposa, mas que o 1 por cento que faltava era condenatório.
Esqueci de acender os faróis no caminho de volta para casa; um policial me parou e me encontrou chorando atrás do volante, murmurando sobre o término da relação. Ele me disse que eu era jovem e bonita e que arranjaria outro homem e ficaria bem, desde que me lembrasse da segurança nas estradas.
Na década seguinte, conheci apenas um outro homem com quem poderia me casar. Depois de sete meses sendo suspeitosamente amigos íntimos, finalmente dormimos juntos. No dia seguinte, ele ficou distante; duas semanas depois, tudo acabou. Ele não “sentiu o suficiente” por mim, disse. Ficamos próximos por mais dois anos, ambos solteiros o tempo todo, e passei esses anos me perguntando o que nos faltava.
Então, quando meu colega de classe me disse que seus relacionamentos anteriores haviam sido destruídos pela sensação de que algo não quantificável estava faltando, meu estômago revirou. Mas talvez fosse significativo que estivéssemos grudados em nossos assentos por três horas, nenhum de nós querendo admitir nossa necessidade de água, esticar as pernas ou ir ao banheiro. Talvez seja assim quando um sentimento que falta é encontrado inesperadamente.
Perdemos o contato um com o outro em uma pós-festa lotada, mas alguns dias depois ele me enviou um vídeo dele tocando Nuvole Bianche de Ludovico Einaudi no piano, seguido de um convite para uma apresentação ao vivo em Nova York. Eu havia contado a ele sobre uma conexão perdida que tive uma vez com um pianista profissional; talvez, disse, ele pudesse compensar essa perda.
Comprei uma passagem de avião.
Nas semanas anteriores, trocamos mensagens de texto diariamente. Ele compartilhou seus links favoritos sobre Nova York e fotos do casamento de seu irmão. Nervosa, enviei a ele o rascunho de um ensaio de 20 páginas que havia escrito sobre minha conversão ao judaísmo.
Quando uma cópia digitalizada do meu ensaio cheia de comentários manuscritos chegou à minha caixa de entrada uma semana depois, dei a mim mesma permissão para amá-lo.
Nós nos encontramos em seu apartamento no Brooklyn em uma manhã de sábado e atravessamos a cidade, conversando com a mesma urgência da primeira noite, prolongando uma tensão sexual não reconhecida até não termos escolha a não ser voltar para casa.
Em seu apartamento, ele se sentou ao piano e começou a tocar. Eu assisti do sofá, oscilando entre a ansiedade e o terror.
As conversas do dia me convenceram de nossa compatibilidade - ambos queríamos uma vida de viagens com crianças aventureiras conosco - mas eu sabia que em segundos nossas fantasias um do outro dariam lugar à realidade da pele e da respiração. Rezei para que nosso primeiro toque fosse elétrico. Eu não precisava de fogos de artifício para começar um relacionamento, mas de repente temi que ele precisasse.
No dia seguinte, deitada na cama com nossas pernas entrelaçadas, ele disse que se sentia ansioso. Depois de um primeiro encontro tão perfeito quanto o nosso, ele esperava se sentir eufórico, mas em vez disso sentiu uma hesitação inexplicável. Ele precisava de tempo para pensar.
A rejeição veio uma semana depois, por meio de um e-mail escrito com ternura. Nosso relacionamento parecia 90% certo, certo o suficiente para que pudéssemos nos apaixonar, mas errado o suficiente para nunca durar. Devíamos acabar com isso antes que a separação inevitável ficasse mais difícil. Não que houvesse incompatibilidades gritantes, e ele nunca havia experimentado uma conexão intelectual tão poderosa quanto a nossa, mas faltava algo.
Li o e-mail na cama, grata por não haver nenhum policial para me ver chorando. Quando minhas lágrimas secaram, afundei no travesseiro, fechei os olhos e fui tomada pela convicção de que toda essa coisa de sentir falta era uma farsa - ou, na melhor das hipóteses, uma desculpa educada, uma maneira inocente de terminar as coisas.
Há uma história sufi que adoro sobre o tolo sábio Mullah Nasreddin. É assim: a escuridão caiu e Nasreddin perdeu suas chaves. Ele se ajoelhou perto de um poste de luz, procurando. Um amigo se juntou a ele e, depois de um longo tempo, perguntou: “Onde exatamente você perdeu as chaves?” “Na minha casa”, disse Nasreddin. O amigo disse: “O quê? Na sua casa? Por que estamos procurando aqui? Ao que Nasreddin respondeu: “Há mais luz aqui.”
Os únicos três homens com quem eu já imaginei um futuro me disseram que algo estava faltando, e eu deixei suas palavras me perseguirem por anos, vasculhando minhas memórias em busca de falhas. Mas talvez a busca por um sentimento que faltava fosse um pouco como a busca fútil de Nasreddin: eles estavam procurando um relacionamento para preencher um vazio emocional em vez de procurar dentro de si mesmos.
Foi assim que escolhi ver, pelo menos - uma interpretação que me ajudou a me curar. Mas há outras formas de ver.
Na verdade, adoro a história de Nasreddin porque às vezes itens perdidos aparecem em locais improváveis. Eu uso a história para explicar minha atração pelo judaísmo. Aos 20 anos, perdi meu senso de encantamento e fui procurá-lo. Eu flertei com uma variedade de religiões e não senti nada, mas um Shabat abriu em mim um poço de sentimentos que eu não sabia que possuía. Encontrei meu encantamento perdido em um lugar que nunca havia visitado.
Talvez os homens que amei não sejam tão tolos em pensar que uma mulher lhes mostrará as chaves de seus corações. Passei a admirar sua crença audaciosa em um amor mais perfeito. Eles merecem encontrar parceiras que estejam 100% certas, cuja presença os encha de alegria e elimine as dúvidas.
Mas esse não é o tipo de amor que desejo para mim. Acredito que a vida parece errada na maior parte do tempo, e basta encontrar alguém que o ajude a encontrar humor no erro, que testemunhe sua solidão em vez de aliviá-la completamente.
Acredito que o amor mais apaixonado é experimentado por pessoas que abraçam a imperfeição de seu relacionamento, que a veem como algo que pode ser acolhido.
Acredito que quando você está com uma pessoa maravilhosa, mas algo indescritível parece faltar, você pega a mão do seu parceiro e procura por isso juntos.
Estou procurando alguém que compartilhe dessa fé. /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES
The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.