‘Situações de emergência não podem ser naturalizadas’, diz especialista em privacidade

Para Veridiana Alimonti, da Electronic Frontier Foundation, é necessário cuidado e atenção para que projetos pensados em uma situação de emergência não se tornem permanentes

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Por Bruno Romani
Atualização:

A Electronic Frontier Foundation (EFF), organização que defende globalmente os direitos digitais e a privacidade, acredita que mesmo o uso de dados agregados, que não coleta informações individuais de cidadãos, precisa passar por um processo de transparência em projetos de combate ao covid-19. 

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Veridiana Alimonti, analista de políticas para a América Latina da EFF, vai além: é necessário cuidado e atenção para que projetos pensados em uma situação de emergência não se tornem permanentes. “Situações de emergência não podem ser naturalizadas”, disse ao Estado

Em conversa com a reportagem, ela também apontou para o fato de quaisquer projetos de uso de dados precisam ser criados respeitando a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), ainda que ela ainda não esteja em vigor. Veja os melhores momentos abaixo. 

Iniciativas de monitoramento para combate de covid-19 causam preocupação em relação à privacidade e ao direito digital? 

Iniciativas como essas têm que ser vistas com atenção. Situações de emergência não podem ser naturalizadas. Mesmo com padrões internacionais que autorizam o uso de dados, isso não pode significar a desconsideração de outros direitos. Tem que haver transparência no inicio, meio e fim, inclusive deve existir a discussão se algo deve ficar. 

Muitos dos dados usados são de geolocalização. Por que eles são tão sensíveis?

Esses dados são diários abertos de nossas vidas. Não são apenas das rotinas, como podem também indicar orientação sexual, preferências políticas, questões religiosas, questões relacionadas à saúde, e uma série de outros elementos que são a própria definição de dados sensíveis. 

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Usar dados agregados não é o suficiente? 

Várias pesquisas demonstram o quão simples é reidentificar esses dados quando são feitas combinações de alguns parâmetros com informações disponíveis publicamente. Dependendo dos parâmetros escolhidos, só aquele agente terá aquela informação. Em dados de geolocalização, isso é ainda mais sensível. 

É problemática a existência desses projetos sem a vigência da LGPD?

Sem dúvida. É preocupante que todas essas medidas estejam em curso em paralelo a iniciativas que visam prorrogar a entrada em vigor da LGPD, especialmente o projeto de lei recentemente aprovado no Senado. Medidas para o combate ao vírus vindas do poder público e da iniciativa privada devem ter suas regras como base. O movimento de postergar sua vigência passa a mensagem contrária, justamente quando precisamos de segurança jurídica e de um arcabouço robusto de proteção. Necessidade, finalidade, adequação, balanço em relação a outros direitos do titular, prevenção, não discriminação e medidas de controle, segurança, transparência e informação são todos pontos fundamentais articulados na lei. Uma política de combate ao coronavírus que se pretenda efetiva e adequada não pode prescindir de nenhum deles.

O que pode ser feito neste momento para garantir a privacidade, além de discutir a necessidade e entender as técnicas de anonimização? 

Esses projetos precisam ser acompanhados de uma série de garantias para que não se estabeleça uma estrutura de vigilância no estado, até porque temos na América Latina um histórico de dificuldade e falta de estrutura para fazer uma fiscalização efetiva de aparatos de vigilância.

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