Se fosse outra empresa, os consumidores se sentiriam maltratados. A Apple adota uma estratégia de distribuição de produtos que parece só dela. Tudo começa com rumores, que vão tomando corpo na imprensa e nas mídias sociais, com informações vazadas seletivamente pela empresa. De oficial, só o silêncio.
Depois, vem o show com Steve Jobs. Com seu uniforme de camisa preta de manga longa e gola alta, calça jeans e tênis, o fundador da Apple confirma os rumores, para as pessoas discutirem o quanto o novo produto vai mudar o mundo.
Depois, vem a chegada do lançamento às lojas. As pessoas passam a noite nas filas, esperando o início das vendas. Após horas e horas de expectativa, saem felizes, exibindo suas aquisições como troféus. Quem deixa para depois, corre o risco de encontrar as prateleiras vazias.
Como a Apple consegue fazer uma estratégia dessas dar certo? Em 2007, o professor John Quelch publicou um artigo no site da Harvard Business School, chamado "How to profit from scarcity" (Como lucrar com a escassez). Os principais exemplos eram o iPhone e os livros do Harry Potter.
Atualmente vice-presidente e reitor da China Europe International Business School, em Xangai, Quelch comentou a estratégia da Apple, em entrevista por e-mail. "A escassez vende quando um número suficiente de consumidores acreditam que, se um produto está em falta, ele deve ser bom", disse o professor. "Quando as pessoas fazem filas do lado de fora das lojas para comprar o iPad ou o iPhone recém-lançado, isso cria divulgação gratuita na mídia, o que alimenta ainda mais o interesse do consumidor."
Para Abel Reis, presidente da AgênciaClick Isobar, o sucesso da estratégia é consequência de uma "religião" que se forma ao redor dos produtos da Apple.
"É uma estratégia para poucas marcas", disse ele. "As filas têm a ver com o ritual da marca. É igual ficar apertado em estádio de futebol. Os torcedores não ficam bravos, porque é uma opção."
Ricardo Guimarães, presidente da Thymus, lembrou que a estratégia de escassez é muito comum no mercado da moda. "Na moda, o raro é caro. Em tecnologia, o novo é caro. É sinal de prestígio ter o produto antes."
No Estado de hoje ("A estratégia de escassez da Apple", p. N6).
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