Em seus 35 anos de carreira jornalística, João Bosco Rabello tem se dedicado sobretudo à cobertura de assuntos políticos. Acompanhou e escreveu sobre alguns dos momentos mais intensos da história recente do País, tais como a distensão promovida pelo general Ernesto Geisel, o Congresso Constituinte de 1987, a campanha de Tancredo Neves à Presidência, a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva. Hoje, na Sucursal de Brasília, ele continua acompanhando e analisado fatos políticos, movido por uma convicção jornalística clara, de que está a serviço do leitor, para quem deve traduzir os fatos, permitindo-lhe refletir e formar sua opinião.É essa proposta que Bosco leva para o blog Política Direto de Brasília, que estreia amanhã no estadao.com.br. "Não quero despejar sobre o leitor todo o fluxo diário de informações políticas, nem ser muito opinativo ou arrogante", diz ele. "Quero selecionar com rigor os assuntos postados e ajudar a traduzir o mundo político."O blog estreia em um período de agitação política, às vésperas de uma campanha presidencial e com os partidos já se preparando para colocar os blocos na rua. Na entrevista a seguir, Bosco fala sobre essas eleições e outros assuntos do cotidiano do blog.Como você está vendo os preparativos para a campanha de sucessão de Lula?A sucessão será uma das mais disputadas e passionais da história recente do País. Em primeiro lugar, por causa do caráter plebiscitário que o Lula quer dar à campanha, polarizando entre ele e Fernando Henrique Cardoso, cada qual com seu candidato. Lula vai tentar mostrar que a tese tucana do Estado mínimo foi sepultada com a crise econômica mundial e que o governo de FHC foi entreguista, ao passo que ele acertou ao fortalecer a presença do Estado na economia. Essa dualidade deve se espalhar por toda a campanha, alimentando o clima passional. Pela estratégia de Lula, ele ficará no campo oposto aos que representam o atraso - seja pela defesa do agronegócio, das teses neoliberais, das ações contrárias à demarcação de terras indígenas. Essa estratégia já vem sendo delineada, pouco a pouco, há algum tempo.De que maneira?Vou citar dois exemplos. O primeiro é a arquitetura que Lula vem construindo em torno do pré-sal, com um forte caráter nacionalista, devolvendo à Petrobrás o antigo slogan "o petróleo é nosso". Outro exemplo foi a briga que ele comprou com a Vale, por causa das demissões que a empresa fez no decorrer da crise econômica - um mote muito visível, que toca facilmente o homem comum. Nada disso foi casual. Ele pensou nisso como uma maneira de acentuar a diferença entre seu pensamento e o pensamento tucano. A Vale seria o exemplo da gestão tucana, na qual acima de tudo estaria o mercado, não se importando com as demissões.Uma das principais dúvidas em relação à campanha é saber se Lula vai conseguir transformar seu prestígio em votos para Dilma Rousseff. O que acha?Isso só será visível quando todos os candidatos entrarem em campo. Historicamente, já ficou claro que raras vezes ocorre a transferência. Mas não se pode ignorar que se trata de um governo em fase atípica, com índice de aprovação alto e um presidente carismático, que sabe usar uma linguagem que chega ao homem do povo. Ele vende bem seu peixe.No ano que vem também haverá eleições para o Congresso. Acredita que haverá uma renovação?A renovação será alta, mas não sei se para melhor - porque a forma de fazer política continua a mesma. Mudam os personagens, não a política.Não vê nenhuma mudança política positiva nos movimentos políticos recentes?Considero positivo o enfraquecimento do velho caciquismo, do coronelismo político. Veja o que aconteceu com os dois últimos grandes patriarcas desse modelo, Antonio Carlos Magalhães e José Sarney. Após a morte de ACM, o carlismo perdeu força na Bahia e não voltou a ser o que era - embora os herdeiros do velho patriarca continuem por lá. Quanto a Sarney, está no ocaso da carreira política. O velho caciquismo está fora de contexto. É um avanço - embora seja muito pequeno diante de outros problemas que permanecem.