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Alhos e bugalhos

Ignorando o fracasso dos estaleiros, Mercadante compara a indústria naval à Embraer

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Por Notas & Informações
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A lógica exótica segundo a qual um país que constrói e exporta aviões estaria automaticamente apto a construir navios foi manifestada por Aloizio Mercadante, que preside o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), para defender a obsessão lulopetista de incentivar a qualquer custo a indústria naval. O desejo é transformar o Brasil em uma potência no segmento. “Precisamos fazer navios”, declarou Mercadante, em cerimônia recente na sede do banco.

Ao contrário do que Mercadante parece acreditar, a Embraer não se tornou a terceira maior fabricante de aeronaves do mundo por força de políticas de conteúdo local ou por sucessivos programas de injeção de recursos, modelo que está na base do que o BNDES pretende fazer na indústria naval.

Privatizada na primeira leva de desestatizações, em 1994, a Embraer encontrou na produção de jatos o seu principal nicho, investindo pesadamente em inovação e tecnologia. Agora, por exemplo, aposta em aeronaves sustentáveis.

Nem mesmo como licença poética se pode aceitar a comparação de Mercadante entre a produção de aeronaves e a de navios. Ao citar a “indústria pujante da construção naval dos anos 1970″, o presidente do BNDES declarou que o País tem tecnologia acumulada para voltar a ter a mesma importância – aparentemente ignorando o fato de que, de lá para cá, como em diversos outros setores, a evolução da tecnologia se deu numa velocidade que o Brasil mal consegue acompanhar.

Como a própria experiência já mostrou, não é decretando a criação de novos estaleiros que o governo alcançará, num estalar de dedos, o nível de competitividade de estaleiros asiáticos, que nas últimas décadas conquistaram escala e conhecimento tecnológico.

O presidente Lula da Silva tentou exatamente isso, em gestões anteriores. Chegou a ter uma resposta de curto prazo satisfatória – em meados de 2010, eram mais de 80 mil empregados em 19 estaleiros espalhados pelo País, 5 deles erguidos do zero. Mas, como tudo o que é obtido a partir de modelos excessivamente artificiais, em um par de anos a realidade era outra e rapidamente o setor retornou à estaca zero. O auge da indústria naval foi focado em programas de incentivo do Estado e na exigência de conteúdo local, tendo a Petrobras como única demandante. O resto é o que se sabe: erros de fabricação, projetos caros, atrasos na entrega e, quando os pedidos minguaram no rastro da crise da petroleira, veio o esperado fracasso.

Mercadante deveria ter mais cuidado e parcimônia ao prometer mundos e fundos para uma nova tentativa de criação de um gigante naval. Aos empresários do setor, acena com os bilhões do Fundo da Marinha Mercante, que o BNDES administra. Atrela a indústria naval a um projeto político que ainda não convenceu com a sua “neoindustrialização”. Seguindo o que parece uma tendência, diz que o Brasil vai investir no “navio do futuro”. É justamente com essa ideia de “futuro” que o governo petista vem embalando todos os projetos que se mostraram imprestáveis no passado.