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Banco Central cumpre roteiro

Para alívio de todos e até do governo, BC decidiu ignorar, por ora, declaração de Lula contra a meta fiscal

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Por Notas & Informações
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Em meio a discussões no governo para alterar a meta fiscal de 2024, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) seguiu o roteiro esperado e reduziu a taxa básica de juros para 12,25% ao ano. O comunicado reforçou também as apostas dos investidores sobre novos cortes de 0,5 ponto porcentual nas duas próximas reuniões.

A decisão do Copom não surpreendeu. Há indicadores suficientes a delinear um quadro de desaceleração da inflação e da própria atividade econômica nos últimos meses. E, ainda que esteja em ciclo de queda, a Selic permanece em terreno contracionista, tanto que o País retomou a liderança no ranking mundial dos juros reais.

Para alívio de todos, inclusive do governo, o BC decidiu ignorar, por ora, a declaração de Lula da Silva menosprezando a importância de atingir o déficit zero no ano que vem. A despeito das turbulências que o próprio presidente criou para si mesmo, o compromisso, ao menos oficialmente, permanece o mesmo, o que permitiu ao BC manter inalterada a menção à importância da “firme persecução” das metas fiscais para a ancoragem das expectativas da inflação.

“Tendo em conta a importância da execução das metas fiscais já estabelecidas para a ancoragem das expectativas de inflação e, consequentemente, para a condução da política monetária, o Comitê reafirma a importância da firme persecução dessas metas”, disse o BC.

A trégua, no entanto, tem tudo para ser temporária. Se a frase dita por Lula não modificou a trajetória da Selic no curto prazo, ela já alterou as expectativas sobre a inflação e a curva de juros futuros. Segundo a última edição do Boletim Focus, a previsão para a inflação no fim do ano que vem subiu de 3,87% para 3,90%. A projeção para a taxa básica de juros no fim de 2024 aumentou de 9% para 9,25%, e algumas instituições financeiras já elevaram suas projeções para um nível superior a 10%.

Não há como deixar de relacionar esses movimentos às declarações de Lula, uma vez que a projeção para a Selic, no Boletim Focus, permanecia inalterada há 11 semanas. Assim, todas as atenções se voltam agora para a ata da reunião, a ser divulgada na próxima semana. O documento, bem mais longo que o comunicado, trará mais detalhes sobre a avaliação dos diretores sobre a conjuntura econômica.

O cenário externo tampouco tem colaborado. Além das tensões geopolíticas, o BC mencionou que o processo desinflacionário tem sido mais lento do que o esperado em diversos países do mundo. O Federal Reserve (Fed) manteve a taxa básica de juros norte-americana no patamar entre 5,25% e 5,5%, o maior em 22 anos, e não descartou a possibilidade de elevá-la em dezembro.

Nesse contexto, o governo ajudaria muito se fizesse sua parte e parasse de alimentar incertezas, mesmo porque o risco fiscal costuma ser mais relevante do que o cenário externo na definição da política monetária. Ninguém acredita que o governo conseguirá atingir o déficit zero no ano que vem, o que em nada diminui a importância de articular ações e esforços na busca pelo melhor resultado possível.