À medida que a decisão mais importante do Comitê de Política Monetária (Copom) em 2024 se aproxima, não faltam argumentos, concorde-se com eles ou não, para que o Banco Central (BC) eleve a taxa Selic ou para que a deixe em 10,5%. Se do ponto de vista técnico há espaço para que se opte pela elevação ou pela manutenção, do lado da comunicação só há um caminho: clareza, de modo que a decisão que o comitê vier a tomar seja não só estritamente técnica, mas informada de modo a não gerar ruídos.
Se estiver em dúvida sobre como se comunicar, o BC já conta com um guia informal do que não se deve fazer. É impossível não voltar à fatídica reunião de maio, quando os membros do comitê se dividiram – os quatro diretores indicados por Lula da Silva votaram por uma queda de 0,50 ponto porcentual (p.p.) da Selic, enquanto os outros cinco, por uma redução de 0,25 p.p. Decisões divididas por si sós podem gerar inquietação no mercado e não será diferente agora em setembro, se o Copom não votar de forma unânime. Em maio, contudo, a decisão dividida causou menos ruído do que o comunicado lacônico após a reunião.
A mensagem, de 8 de maio, não trouxe uma mísera linha sinalizando os motivos que levaram à divergência, algo que só foi esclarecido alguns dias depois (uma eternidade, quando se trata de tema tão fundamental), quando da divulgação da ata, em 14 de maio. Além disso, não faltaram manifestações desalinhadas de membros do Copom, que ora serviram para acalmar o mercado, ora para atiçar o sentimento de confusão.
Para o encontro que está prestes a acontecer, é essencial que os diretores tenham consciência de que precisam comunicar a decisão que tomarem de forma clara, efetiva e coordenada. A próxima reunião não é trivial. Ocorre em momento em que os juros nos EUA finalmente cairão, o que reforça o argumento da ala de especialistas que entendem que, com o alívio do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), a Selic, já bastante elevada no Brasil, não precisa subir ainda mais. Por outro lado, há o coro, majoritário, dos que veem o cumprimento da meta de inflação de 3% cada vez mais ameaçado, tanto por velhos fatores como por outros relativamente novos, como o impacto, nos preços de energia, da seca sem precedentes que assola o País.
O cenário para a decisão de setembro do Copom não é nada simples, como também não vinha sendo para as autoridades monetárias de EUA e Inglaterra, mas do ponto de vista da comunicação os bancos centrais daqueles países oferecem um guia do que fazer: comunicação clara e rápida – os presidentes do Fed e do Bank of England (BoE) concedem entrevista coletiva no mesmo dia em que tomam suas decisões de política monetária.
Uma comunicação eficiente e ágil do BC brasileiro se faz ainda mais necessária diante do contexto de politização das ações do Copom. Em boa parte deste ano, o presidente Lula da Silva atacou o “exagero” dos juros altos e, mais particularmente, seu desafeto na presidência da autarquia, o “insensível” Roberto Campos Neto. No meio desse imbróglio, Gabriel Galípolo, apadrinhado de Lula que vai substituir Campos Neto, viu-se compelido a demonstrar ao mercado que será firme no combate à inflação, declaração dada tantas vezes que praticamente consolidou a expectativa de que a Selic voltará a subir.
Comunicação clara e ágil e excesso de declarações não são sinônimos. De um modo geral, alguns membros do Copom falam demais, muitas vezes sem delimitar quando estão se pronunciando de forma pública, privada, pessoal ou em nome do colegiado. No caso de Galípolo, é de certa forma compreensível que, com currículo menos vistoso que o de outros presidentes do BC e por se encontrar no meio do tiroteio do governo contra Campos Neto, tenha buscado tranquilizar o mercado de que, uma vez no leme do BC, agirá de forma técnica.
Que assim seja. Que a política não contamine as ações do Banco Central, e que este as comunique com clareza e agilidade.