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Congresso reduz danos ao contribuinte

Congresso restitui o voto de qualidade no Carf a favor do Fisco, mas sem as penalidades que o governo queria

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Por Notas & Informações
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A aprovação pelo Senado, por 34 votos a 27, do projeto de lei que restitui o voto de qualidade do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) representou uma vitória da Receita Federal sobre o contribuinte. Mas mostrou também que o governo não possui salvo-conduto para impor toda e qualquer medida para aumentar a capacidade arrecadatória.

Prova disso é o fracasso na tentativa de impor o retorno do voto de Minerva por meio de uma medida provisória (MP). De janeiro a 1.º de junho deste ano, sua vontade vigorou por meio de MP, um instrumento reservado a questões urgentes e relevantes. Sem apoio do Congresso, que deixou a medida caducar, o governo foi obrigado a elaborar um projeto de lei e submeter a discussão ao Legislativo.

A mensagem não poderia ser mais inequívoca. Medidas que afetam diretamente os contribuintes têm de ser discutidas com aqueles que os representam. Numa democracia não se deve impor regras apenas pela força da autoridade. Ainda mais quando se trata de ampliar a arrecadação em um governo incapaz de buscar prioritariamente o equilíbrio fiscal pelo caminho mais correto, que é o da redução de gastos.

Apesar da manutenção do critério de desempate, o Congresso assegurou o perdão de juros e multas se não houver judicialização. Ao menos o resultado, para o contribuinte, não foi tão draconiano quanto antes. Afinal, é razoável a suspensão tanto da contagem de juros como da imposição de multa enquanto a apuração da cobrança estiver em discussão na esfera administrativa.

O Carf é a última instância recursal administrativa para contribuintes protestarem contra cobranças da Receita Federal. Foi criado em 2009 para examinar pedidos de revisão de contribuintes contra autuações do Fisco. As decisões finais cabem a câmaras formadas por representantes da Receita e dos contribuintes. O chamado voto de qualidade é acionado em caso de empate e cabe ao presidente do Conselho, sempre um representante da Receita.

Não se trata, portanto, de um organismo independente. E sendo do representante do Fisco a última palavra quando os votos dos conselheiros terminam equilibrados, é compreensível a crítica, por parte dos contribuintes, de que muitas vezes o recurso ao Carf representa apenas protelar o problema.

Em 2020, o voto de qualidade no Carf foi extinto. Uma das razões era a aplicação do princípio jurídico de in dubio pro reo – em caso de dúvida, deve haver absolvição do réu em um processo penal. Sendo o empate a expressão da dúvida, caberia ao réu – na hipótese, o contribuinte – o benefício da decisão favorável.

No início do governo, ao apresentar medidas de recuperação fiscal, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, qualificou como “uma excrescência” a decisão pró-contribuinte em caso de empate, defendendo a volta do voto de qualidade. Agora, o Congresso chancelou o retorno, mas não nos termos que o governo queria impor. Está longe de ser a decisão ideal, mas mostra como é importante o processo legislativo ante o apetite arrecadatório do Estado.