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Fracasso essencial

Um dos maiores exportadores de alimentos do mundo continua a submeter milhões de cidadãos à incerteza do que comer, como mostra o IBGE. E o governo do PT ainda vê razão para celebrar

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Por Notas & Informações
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O IBGE informou que, em 2023, mais de 20 milhões de brasileiros viviam em domicílios que tinham dificuldade de acesso adequado à comida. Entre eles, 8,7 milhões moravam em domicílios com insegurança alimentar grave – a forma como a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios e a boa literatura sobre o tema definem a situação de fome. Foi o primeiro dado sobre insegurança alimentar produzido pelo IBGE em cinco anos e, ao contrário do que sugere a constrangedora comemoração de auxiliares do presidente Lula da Silva, a fotografia estampada é vergonhosa: embora tenha exibido alguns números melhores quando comparados ao período 2017/2018, o País está pior do que estava dez anos atrás. Em 2013, eram 7,2 milhões de brasileiros vivendo em domicílios com grau de insegurança alimentar grave.

Ou seja, um dos maiores exportadores de alimentos do planeta, capaz de abastecer toda a sua população e alimentar centenas de milhões mundo afora, continua a submeter milhões de seus cidadãos à incerteza do que comer. Apesar de toda a bazófia lulopetista, não só não avançamos, como nos degradamos. A nova pesquisa mostrou que 27,6% das casas no País – onde moram mais de 64 milhões de pessoas – vivem com algum tipo de insegurança alimentar, porcentual menor do que os 36,7% de 2017/2018, mas superior aos 22,6% de 2013. A pesquisa classifica domicílios de acordo com a vulnerabilidade no acesso aos alimentos, tanto em quantidade suficiente como em qualidade adequada. Faz também a distinção entre adultos e crianças – ou seja, é insegurança alimentar “moderada” quando há redução da quantidade ou ruptura dos padrões de alimentação entre os adultos e “grave” quando atinge as crianças que residem no domicílio.

É inadmissível um país que aspira a ser respeitado pela comunidade internacional como potência econômica, geopolítica e ambiental permitir que haja entre seus cidadãos, um que seja, gente passando fome ou vivendo em insegurança alimentar. Além da tragédia humanitária óbvia, esse é um problema que macula a imagem do Brasil como nação digna. Mas há quem enxergue nos números divulgados agora um sinal de pujança, um bendito fruto assegurado pelo demiurgo Lula da Silva. “Os resultados são consequência direta do comando de Lula no seu discurso de posse. Um Brasil em que cada mulher, homem e criança possam tomar café, almoçar e jantar. (...) Um amplo conjunto de políticas (...) junto com a retomada do crescimento da economia”, vibrou Wellington Dias, ministro de Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, sem corar.

Tanto Dias quanto outros bajuladores se apressaram em comparar os números do IBGE a uma pesquisa divulgada em 2022, que apontou inacreditáveis 33 milhões de pessoas passando fome. Com padrões e metodologias distintos, a comparação junta alhos com bugalhos para converter o vergonhoso número trazido pelo IBGE em triunfo do lulopetismo. Não é. Ao contrário: basta recordar que as oscilações percebidas de 2013 para cá são fruto, em parte, dos dissabores produzidos por governos do PT, incluindo mais de dois anos de mandato da presidente Dilma Rousseff, cuja irresponsabilidade na condução da economia deixou sequelas graves por longos anos.

Em muitos países, os níveis de insegurança alimentar grave, moderada ou leve se dão pela indisponibilidade da oferta de alimentos, agravada pela pandemia de covid-19 e pelas mudanças climáticas. O problema brasileiro é de outra ordem: deriva, sobretudo, da renda baixa e incerta, da ausência de oportunidades de emprego, da falta de capacitação para os empregos existentes e das limitações de acesso a recursos produtivos. O que os artífices lulopetistas não conseguem compreender é que, ao trabalhar contra a responsabilidade fiscal e o controle rigoroso da inflação em favor da gastança estatal a título de “colocar o pobre no Orçamento”, eles penalizam justamente aqueles que estão em situação de miséria e insegurança alimentar, perpetuando esse círculo vicioso que tanto envergonha o Brasil.