Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Governo amarra a Petrobras

Falas do ministro de Minas e Energia expõem a mão pesada do governo na Petrobras e evidenciam controle artificial de preços; há risco de desabastecimento de diesel

Exclusivo para assinantes
Por Notas & Informações
3 min de leitura

A Petrobras está “no limite do preço marginal” dos combustíveis e qualquer alta dos preços internacionais será repassada ao mercado doméstico. Essa declaração do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, em entrevista recente, leva a duas conclusões óbvias. A primeira é o iminente reajuste de gasolina e diesel, diante dos preços aquecidos no mercado externo. A segunda é que a política de preços da Petrobras extrapola os limites da companhia. É uma decisão do governo, atada a interesses políticos.

Desde a extinção da Política de Paridade Internacional (PPI), em maio, ficou clara a ausência de critérios para balizar os preços da Petrobras. Antes, apesar de a fórmula exata não ser conhecida, havia alguma previsibilidade ao atrelar a evolução dos preços domésticos aos padrões do câmbio e das cotações de petróleo e derivados. “Abrasileirar” os preços, como havia prometido o presidente Lula da Silva na campanha do ano passado, significou, afinal, dar ao governo o poder de decidir o momento e a intensidade dos reajustes.

Nos últimos dois meses os preços do petróleo registraram altas consecutivas. Em julho, o produto do tipo Brent, usado como referência pela Petrobras, subiu mais de 12%. Passa de US$ 86 o barril e deve continuar subindo. O Departamento de Energia dos Estados Unidos elevou a previsão de alta do barril neste segundo semestre, como consequência de cortes de oferta por Arábia Saudita e Rússia. Apesar do cenário persistente, o discurso do presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, é de que não repassará aos preços essa volatilidade.

O diesel segue inalterado há quase três meses, e a defasagem em relação aos preços internacionais beira os 25%. Como mostrou reportagem do Estadão, o descasamento eleva o risco de desabastecimento, já que mais de 24% do combustível consumido no País é importado. A gasolina, depois dos cortes de maio e junho – este último sem impacto ao consumidor, apenas para compensar a reoneração dos impostos federais dos combustíveis –, também mantém estáveis os preços.

O freio teve grande contribuição no controle da inflação e, por tabela, no relaxamento da política monetária, com o início do ciclo de queda de juros. Trata-se, portanto, de política de governo, apesar da negativa retórica de representantes da empresa e do Executivo. O detalhe é que, embora o controle acionário seja exercido pela União, o capital privado responde por 63,4% do total de ações da companhia, e a estes investidores a empresa deve transparência e previsibilidade.

O ministro Silveira disse que estava querendo “tranquilizar os investidores” ao reconhecer que a Petrobras está atuando “no limite da competitividade externa”. Ora, mas este é um sinal inverso, de clara interferência. Não cabe a ele, ou a qualquer outro integrante do governo, falar sobre o tema. Somente a Petrobras deveria falar pela Petrobras.

O balanço financeiro do segundo trimestre, o primeiro depois do fim da PPI, revelou queda de 47% no lucro da empresa em relação ao mesmo período de 2022, de R$ 54,3 bilhões para R$ 28,8 bilhões. Alguns analistas atribuíram o resultado, em parte, à mudança na política de preços. O desconforto é natural, diante de experiências passadas malsucedidas de controle artificial de preços. Tanto a empresa quanto o governo alegam que a Petrobras não está perdendo dinheiro. Não convencem.

O fim da política de paridade também foi uma medida governamental. “PPI é um verdadeiro absurdo”, disse o ministro de Minas e Energia em abril, em entrevista inflamada à Globonews, quando declarou que a política de preços iria mudar. “Vamos exigir, como controladores, que ela (Petrobras) respeite o povo brasileiro”, disse. Parecia discursar de um palanque. As ações despencaram de imediato.

A Petrobras foi obrigada a desmentir formalmente o ministro. Estancou momentaneamente a queda na bolsa e se viu livre de uma eventual punição pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que regula e fiscaliza o mercado de ações. Menos de um mês depois, a política de preços de fato mudou, deixando patente quem decide. O nó estatal, que continua a amarrar e limitar a Petrobras, precisa ser desatado.