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Diante do acúmulo de notícias preocupantes do lado externo, o governo deveria empenhar-se mais seriamente em promover a reforma da Previdência

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Por Notas e Informações
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Emperrada há meses, a economia brasileira dificilmente será destravada se isso depender das vendas ao exterior. Num cenário com nuvens escuras, o volume global das trocas de mercadorias poderá crescer apenas 2,6% neste ano, segundo a Organização Mundial do Comércio (OMC). A expansão em 2018, já decepcionante, chegou a 3%. As maiores potências devem continuar em crescimento, mas com menor vigor na Europa, onde há alguns países próximos de uma nova recessão. O mercado chinês, o mais importante para o agronegócio brasileiro, continua vigoroso, mas seu ritmo de expansão é incerto. O terceiro maior parceiro comercial do Brasil, a Argentina, segue em recessão, e só esse fato já prejudicaria, como tem prejudicado, as exportações da indústria brasileira. 

Mas o quadro externo ruim é só um dos entraves ao crescimento brasileiro. As travas internas, mais visíveis para a maior parte das pessoas, incluem o desemprego elevado (um freio importante ao consumo) e a insegurança dos empresários diante uma cena política muito complicada. 

Cinco meses depois de proclamada a eleição do presidente Jair Bolsonaro, o governo opera sem uma base parlamentar bem definida, a reforma da Previdência continua incerta e o Executivo se enrola em disputas internas e tropeça em decisões desastradas. Muitos apostam na aprovação da mudança das aposentadorias, mas ninguém pode afirmar se o projeto, no formato final, estará muito ou pouco desidratado. Além disso, a esperança de aprovação do projeto no primeiro semestre, ou antes do recesso parlamentar do meio do ano, já se esvaiu. Quanto mais longa a tramitação, mais duradoura será a insegurança de empresários e consumidores. 

Diante do acúmulo de notícias preocupantes do lado externo, o governo deveria empenhar-se mais seriamente em promover a reforma da Previdência. Com sentido de urgência, deveria cuidar de quaisquer outras medidas importantes para a reanimação da economia no menor prazo possível. Para isso, porém, o presidente Jair Bolsonaro deveria olhar também para fora, fazendo o contrário do recomendado pelo ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, nos primeiros dias de governo. 

O comércio exterior contribuiu para o País ganhar algum vigor logo depois da recessão. Em 2017, depois de três anos em queda, o valor das exportações de bens cresceu 17,55% e atingiu US$ 217,74 bilhões. Cresceu de novo em 2018, mas em ritmo bem menor, 10,17%, e atingiu US$ 239,89 bilhões, ainda muito longe do pico alcançado em 2011, quando as vendas externas de mercadorias proporcionaram receita de US$ 255,94 bilhões. Mesmo com a atividade em lenta recuperação, as importações têm crescido mais velozmente que as exportações. 

O quadro fica mais preocupante quando se examinam as vendas de manufaturados, que em 2018 ainda cresceram 7,4%, com receita de US$ 86,58 bilhões, mas no primeiro trimestre do ano o valor exportado, de US$ 19,44 bilhões, foi 9,8% menor que o de igual período de 2018. O total das vendas, de US$ 53,03 bilhões, foi 3% inferior ao de um ano antes. 

Boa parte das perdas está associada à crise argentina. Em 2018, as vendas ao mercado argentino caíram 15,5% pela média dos dias úteis. No primeiro trimestre deste ano, a queda chegou a notáveis 48,4%. O encolhimento do mercado argentino é também a principal explicação do recuo das exportações do setor automobilístico. Em valor, as vendas externas de veículos e de tratores encolheram 38,9% no primeiro trimestre, em comparação com o mesmo período de 2018, e ficaram em US$ 2,44 bilhões. 

Se a tensão comercial Estados Unidos-China diminuir, o quadro geral ficará melhor. Mas haverá outros motivos de preocupação, como o enfraquecimento de algumas grandes economias e a duração da crise argentina. Alguns problemas do comércio brasileiro são solúveis com medidas de médio e de longo prazos. Os de curto prazo são dificilmente contornáveis. O governo deveria considerá-los ao avaliar o conjunto de seus desafios imediatos.