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O nome disso é antissemitismo

Ao defender boicote a judeus, Genoino mostra que o tal humanismo petista é só para alguns

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Por Notas & Informações
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Era um sábado quando, em 1.º de abril de 1933, deu-se a primeira ação coordenada do regime nazista contra os judeus: naquele dia, os alemães “puros” estavam convocados a um boicote nacional instituído pelo ditador Adolf Hitler, não devendo comprar em lojas ou outros estabelecimentos que o governo nazista identificasse como de propriedade de judeus. Criaram-se listas de lojas que os nazistas consideravam ser de propriedade judaica, enquanto soldados uniformizados e membros da Juventude Hitlerista se postavam do lado de fora dos estabelecimentos e ameaçavam possíveis clientes. Dispensável prosseguir com as consequências trágicas e desumanas do que se iniciava a partir dali.

Agora, em pleno 2024, foi também num sábado que o ex-deputado federal José Genoino, uma das mais célebres lideranças do PT e aliado inconteste do presidente Lula da Silva, defendeu um novo boicote dirigido aos judeus. Ao participar de uma transmissão ao vivo num canal companheiro, Genoino disse achar “interessante” a ideia de um boicote a “determinadas empresas de judeus” e a “empresas vinculadas ao Estado de Israel”. Ele comentava a ideia de deixar de fazer compras no Magazine Luiza por causa do apoio da empresária Luiza Trajano a um abaixo-assinado que pede a Lula que desista de apoiar a ação da África do Sul contra Israel por genocídio.

Ressalvadas as gigantescas diferenças que separam os dois momentos – e reconhecendo que Genoino, até este momento, jamais havia mostrado inclinação nazista –, a declaração é, sob todos os sentidos, uma manifestação antissemita, por discriminar expressamente os judeus. Desconsiderando a probabilidade de ter sido uma fala impensada, uma vez que o ex-parlamentar não se retratou desde então, pode-se considerar que a defesa que fez a um boicote tem fins abertamente políticos. Para Genoino, a mensagem é clara: que os empresários judeus sejam punidos, simplesmente por serem judeus, pelos atos do governo israelense em Gaza.

Desde que eclodiu, a guerra entre o Hamas e Israel vem incendiando ânimos e escancarando exibições frequentes de ódio aos judeus – das universidades nos EUA à rinha das redes sociais em todo o mundo. Tal ambiente tem ajudado a produzir disparates como esse.

É essa a consequência imediata de uma fala moralmente aberrante, politicamente descabida e juridicamente questionável como a de Genoino: a disseminação da ideia de que uma parte da sociedade, em razão de sua religião ou de sua etnia, deve responder pelos atos de um governo.

Genoino é um dos maiores representantes do PT, partido que se orgulha de sua defesa de minorias. O tal humanismo petista, no entanto, aparentemente não se aplica aos judeus. Essa minoria pode ser castigada e sofrer preconceito porque, conforme a cartilha antissemita compartilhada pela esquerda, os judeus dominam as finanças e o mundo. Portanto, para essa gente, judeus nunca serão vítimas; serão sempre algozes.

A fala de Genoino, portanto, não surpreende. O que talvez surpreenda seja a facilidade com que ele a pronunciou. O antissemitismo, ao que tudo indica, se tornou tão natural para a esquerda que salta boca afora sem que se perceba.