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O segredo das cidades empreendedoras

Estudo mostra que municípios propícios ao empreendedorismo cultivam ambiente regulatório, infraestrutura, mercados, acesso ao capital, inovação, capital humano e cultura empreendedora

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Por Notas & Informações
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O que torna as cidades amigáveis ou hostis ao empreendedorismo? Quais cultivam ambientes de negócios promissores, quais estão defasadas? Para responder a estas questões, a Escola Nacional de Administração Pública (Enap) avalia há 10 anos os 101 municípios mais populosos do Brasil, indexando evoluções e retrocessos em um ranking.

O ecossistema do empreendedorismo é mensurado por sete fatores: ambiente regulatório, infraestrutura, mercado, acesso ao capital, inovação, capital humano e cultura empreendedora.

Um bom ambiente regulatório depende tanto de uma burocracia ágil quanto de volumes simples e suaves de tributos associados a gastos públicos de qualidade. Estratégias digitais são imensamente eficazes para facilitar a vida dos empreendedores. A qualidade dos gastos públicos está associada a quatro fatores: autonomia (a capacidade de financiar a administração com receitas locais); gastos equilibrados com pessoal (deixando margem a investimentos); liquidez (recursos em caixa); e investimentos (focados no bem-estar da população).

Além do ambiente regulatório, os negócios prosperam em bons ambientes físicos, ou seja, infraestrutura que garanta conectividade física e virtual com outros mercados e condições financeiras e humanas para operações de produção. Além de acesso a rodovias, portos e aeroportos, uma internet veloz é crucial.

Cidades com boas taxas de crescimento, renda, gastos e sofisticação mercadológica oferecem maiores potenciais de clientela e também de parcerias com outros empreendedores.

O empreendedorismo também prospera quando uma cidade oferece acesso ao capital. Populações com altos índices de poupança geram oportunidades de investimentos diretos. Se não forem suficientes, é preciso boas instituições financeiras para operações de crédito. Por último, os empreendedores podem financiar seus negócios vendendo ações ou parte da empresa. Metrópoles como São Paulo, com seus hubs de corretoras, fundos e fintechs, são especialmente propícias.

A revolução industrial 4.0 exige condições favoráveis não só a novos empreendimentos, mas a empreendimentos inovadores, através dos chamados Sistemas de Hélices Quíntuplas: governo, universidade, indústria, sociedade civil e meio ambiente. A proporção de acadêmicos, profissionais e investimentos ligados à ciência e tecnologia é decisiva, assim como o é o capital humano. Empreendedores com maior nível educacional têm mais chance de sobreviver e prosperar. O ecossistema urbano ideal é aquele que oferece boa educação básica e superior, além de cursos técnicos e de capacitação através de sinergias entre o mundo empresarial e o educacional.

A confluência desses fatores leva ao cultivo das crenças e valores do empreendedorismo, como a disposição a assumir riscos e a sede por inovação. Mas essa cultura pode ser galvanizada por iniciativas municipais, como agências de fomento.

No ranking, São Paulo e Florianópolis mantêm-se estáveis na liderança. Mas ele mostra que intervenções focadas podem produzir resultados imediatos. Com investimentos em estrutura física e tecnologia, em 10 anos o judiciário de Goiânia passou de um dos mais morosos a um dos mais ágeis do País. Brasília, Boa Vista (RR) e Aparecida de Goiânia (GO) foram as cidades que mais subiram. A primeira, por simplificações tributárias e burocráticas; a segunda, por criar uma agência de fomento a pequenos empreendedores; e a terceira, por uma conjunção desses dois fatores.

Comparativamente, o ambiente de negócios no Brasil é notoriamente ruim. Não há muito a esperar de um governo federal atavicamente hostil à iniciativa privada. Mas as prefeituras, mais próximas dos cidadãos e com poder de resolver problemas concretos dos empreendedores, podem, numa pressão difusa, de fora para dentro e de baixo para cima, colaborar para reverter esse quadro.

Nessa missão, o Índice da Enap oferece dados valiosos para os governos emularem as melhores práticas, para os empresários buscarem as melhores oportunidades e para os cidadãos cobrarem seus gestores e incentivarem seus empreendedores.