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O território do crime em SP

Prefeitura diz que que não consegue entrar em certas regiões porque os bandidos não deixam

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Por Notas & Informações
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Em documento encaminhado à Justiça, a Procuradoria-Geral do Município de São Paulo afirmou que o crime organizado dita regras de acesso em determinadas regiões da cidade.

As ameaças a agentes públicos foram relatadas pelo procurador Ricardo Bucker Silva à 2.ª Vara de Fazenda Pública, no dia 22 de abril deste ano, em processo que cobra da Prefeitura a finalização do chamado Plano Municipal de Redução de Riscos. Trata-se de uma ação estratégica prevista no Plano Diretor de 2014 para mitigar danos em decorrência da mudança climática, como deslizamentos de encostas e enchentes.

Em razão da demora no mapeamento das áreas, o Ministério Público ajuizou uma ação civil pública. A Justiça, então, estabeleceu até o fim de abril passado o prazo para a conclusão dos trabalhos, mas a Prefeitura solicitou prorrogação até dezembro em razão de “intercorrências” em 24 áreas.

Não há hipótese virtuosa nesse caso. Pode ser apenas uma desculpa esfarrapada da Prefeitura para o atraso da implementação da importante ação ou pode ser uma vergonhosa admissão de que a Prefeitura é incompetente para se fazer presente em todas as áreas da cidade a qual lhe cabe administrar.

Sendo verdadeira a segunda hipótese, deve-se registrar a corresponsabilidade do governo do Estado, a quem cabe prover a segurança necessária para que os agentes públicos entrem e atuem onde precisam, a serviço da comunidade. Ou seja, se São Paulo está nas mãos do crime organizado, como deu a entender a Procuradoria municipal, trata-se de um vexame coletivo da administração pública.

Há muito se sabe que o PCC domina presídios, administra o tráfico, contamina a política e captura até contratos públicos em setores de transporte, saúde e coleta de lixo, como este jornal vem mostrando em seguidas reportagens. Não seria mesmo surpresa se, como alega o poder público paulistano, os criminosos realmente estejam atuando como se fossem agentes de controle de imigração ao traçar fronteiras imaginárias entre Estado legítimo e Estado paralelo.

O procurador Ricardo Bucker relatou que os agentes da Prefeitura precisaram negociar sua entrada em determinadas favelas: “Isto é, para deixar de modo mais claro, em razão do crime organizado, a municipalidade tem enfrentado dificuldades para ingressar nas áreas”.

Segundo Bucker, entre os obstáculos enfrentados está a “solicitação de saída dos técnicos da região por representantes do crime organizado”. Citou, ainda, hostilidade de moradores em razão do histórico de processos de desapropriação, além de interrupção nas atividades por causa de operações policiais.

Para Marcus Vinicius Monteiro dos Santos, da 5.ª Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo da Capital, contrário à extensão do prazo para que a gestão municipal faça seu trabalho, são “questões corriqueiras no dia a dia da Prefeitura” que poderiam ser “facilmente solucionadas com o apoio da Polícia Militar ou mesmo da Guarda Civil Metropolitana”. O espantoso é que ainda não tenha sido feito.