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Política externa e sensatez

Há razões para acreditar que as decisões nessa seara serão pautadas pelo voluntarismo

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Por Redação
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A diplomacia terceiro-mundista do mandarinato lulopetista é o exemplo daquilo que o Brasil deve evitar se pretende deixar a condição periférica no grande jogo político e econômico mundial. Alinhar-se a ditaduras companheiras na América Latina a pretexto de promover a integração regional e a cleptocracias africanas a título de aprofundar laços com o continente africano nada trouxe de bom para o País, servindo somente para atender ao corrupto projeto de poder do PT. Esse, aliás, certamente foi um dos motivos pelos quais grande parte dos eleitores manifestou seu profundo repúdio ao PT nas urnas, elegendo como presidente o perfeito antípoda do lulopetismo, o deputado Jair Bolsonaro.

Isso não significa, porém, que o próximo presidente tenha de fazer exatamente o oposto da diplomacia lulista. O que é preciso é retornar a uma política externa historicamente equilibrada, das soluções de compromisso, do respeito ao direito internacional e disposta ao entendimento multilateral. A julgar pelas declarações de Bolsonaro sobre como deverá ser o comportamento de seu governo nas relações com o resto do mundo, há razões para acreditar que as decisões nessa seara serão pautadas pelo voluntarismo, que por definição não mede consequências, e não por uma política externa sóbria e responsável, baseada na melhor tradição do Itamaraty - que, para Bolsonaro, foi “aparelhado” pelo PT. Isso, de fato, aconteceu, mas esse desatino não se corrige com outro.

Na prática, Bolsonaro parece inclinado a adotar um alinhamento automático com os Estados Unidos, em razão de suas supostas afinidades com o presidente Donald Trump - que, como se sabe, está em guerra comercial com a China. Na campanha, Bolsonaro acusou os chineses de “comprarem o Brasil”. A China, principal destino das exportações brasileiras e um dos grandes investidores no País, reagiu logo: em editorial em um jornal estatal, Pequim informou que o custo econômico de um enfrentamento com a China “pode ser duro para a economia brasileira”.

Em outro vespeiro que teve a imprudência de mexer, Bolsonaro prometeu transferir a Embaixada do Brasil em Israel de Tel-Aviv para Jerusalém - cidade reivindicada tanto por Israel como pelos palestinos como capital, razão pela qual a maioria absoluta dos países mantém suas embaixadas em Tel-Aviv. Mantém-se aberta, assim, a possibilidade da solução palestino-israelense pela via dos dois Estados. No Twitter, o presidente eleito disse que tomou a decisão porque “Israel é um Estado soberano”, e por isso pode escolher a capital que bem entender. Trata-se de um reducionismo agreste, que se presta somente a alinhar o futuro governo ao de Trump. Para o Brasil, tal medida, se vier mesmo a ser tomada, trará escassos ganhos e representará indesejada guinada na posição do País em defesa de uma solução pacífica para o conflito entre Israel e os palestinos, sem tomar partido de nenhum dos lados. E há também uma questão prática: os países árabes ameaçam fechar aos exportadores brasileiros um mercado de R$ 13 bilhões.

A perspectiva de terra arrasada na política externa passa também pela ameaça de tornar o Mercosul irrelevante. O futuro governo já deixou claro que prefere apostar nas relações bilaterais. Não será tarefa simples: a Constituição diz, em seu artigo 4.º, que o Brasil “buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina”, o que inclui o Mercosul.

Tal hostilidade do futuro governo ao Mercosul resulta em parte da certeza de que o bloco foi aparelhado pela esquerda latino-americana. É movido por essa visão binária que Bolsonaro prometeu rever laços diplomáticos com países governados pela esquerda no continente. Ora, o que endireitará os excessos da política externa lulopetista será a prudência e a estrita observância do interesse nacional - jamais a multiplicação por -1 daquela insensatez.

É provável que, uma vez no exercício do governo, Bolsonaro modere seu discurso. Não será com bravatas e atitudes irrefletidas que a futura administração cumprirá sua promessa de colocar o País entre os mais importantes do mundo.