As providências que se esperam das autoridades municipais a respeito das denúncias de graves irregularidades envolvendo um ex-diretor do Departamento de Aprovação de Edificações (Aprov) da Prefeitura de São Paulo não devem se restringir às punições que a conclusão das investigações indicarem como necessárias. É preciso ir mais longe, reformando os processos de aprovação dos empreendimentos a fim de evitar novos casos como esse.As punições devem ser exemplares, com todo o rigor permitido pela legislação, dada a gravidade dos fatos, que chocaram os paulistanos. As denúncias que estão sendo investigadas no âmbito administrativo e em inquérito civil aberto pelo Ministério Público Estadual (MPE) indicam que o ex-diretor do Aprov Hussain Aref Saab - que assumiu o cargo em 2005 e dele foi afastado no mês passado - adquiriu 106 imóveis naquele período e tem patrimônio estimado em R$ 50 milhões, o que parece claramente incompatível com sua renda mensal de cerca de R$ 20 mil e, portanto, sugere enriquecimento ilícito.O Aprov decide sobre a concessão de licença para a construção de empreendimentos com mais de 500 m², e Saab teria se valido de seu cargo para amealhar aquele patrimônio. Ele agiria com a ajuda de dois outros funcionários - sua assessora Áurea Peixoto Zapletal e Paulo Roberto Castaldelli, do Conselho Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Cades). Daqueles imóveis, um chamou especialmente a atenção da Corregedoria-Geral do Município (CGM), que investiga Saab por corrupção, formação de quadrilha e prevaricação - um apartamento na Rua Coriolano, na Lapa. Apenas um mês depois de comprá-lo, em abril de 2009, Saab concedeu licença para a empresa que o construíra iniciar uma outra obra, na Rua Piemonteses, região da Raposo Tavares.A CGM e o MPE querem saber se existe relação entre os dois fatos, pois é forte a suspeita de que o ex-diretor do Aprov conseguiu da mesma forma muitos imóveis de construtoras que dependiam de suas decisões para levar avante seus projetos. Em outras palavras, se ele recebia favores para beneficiar empresas, apressando os trâmites burocráticos ou removendo dificuldades criadas justamente para disso tirar vantagens. Segundo a denúncia anônima enviada à Prefeitura, que desencadeou as investigações, Saab apressaria a aprovação de empreendimentos mediante pagamento de propina em dinheiro ou em imóveis. Dessa maneira, sérios prejuízos foram causados à cidade, com a permissão de construções em áreas contaminadas e de preservação ambiental, e até em áreas consideradas públicas, apesar de pareceres contrários de órgãos técnicos.Só a punição dos responsáveis por esses atos não basta, porque, mantidos os mesmos procedimentos e a mesma forma de decisão no Aprov, as condições estarão dadas para quem substituí-los - se ceder à tentação - voltar a fazer a mesma coisa. Para arquitetos ligados a importantes escritórios em sua área, ouvidos pelo jornal Folha de S.Paulo, é preciso acabar com o excesso de burocracia e a falta de transparência nos processos de aprovação dos empreendimentos, o que é terreno fértil para a corrupção.Segundo Renata Semin, enquanto os arquitetos têm até 30 dias para dar resposta a questões levantadas por órgãos municipais, estes "não têm compromisso com prazos". O que abre a porta para o expediente de tornar mais rápida a aprovação dos projetos em troca de vantagens, como se vê nos casos que estão sendo investigados. Para ela, a demora se deve também ao número insuficiente de funcionários nesses órgãos técnicos. A fixação de prazos razoáveis para cada etapa do processo, assim como o estabelecimento de sanções para os funcionários que não os cumprirem, são medidas que podem ajudar a moralizar esse setor da Prefeitura, como reconhece um ex-diretor do Aprov, Flávio Formícola.É a reforma do Aprov dentro dessas linhas que mostrará se a Prefeitura está mesmo disposta a resolver o problema ou apenas a apagar um incêndio e esquecer o caso.