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STF não é bedel da política

Presidente da Corte palpita sobre câmeras da Polícia Militar em vez de se limitar ao edital questionado

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Por Notas & Informações
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O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, avalizou o pregão para a compra de câmeras corporais para a Polícia Militar (PM) de São Paulo. O magistrado, porém, não se limitou a dizer o direito no recurso apresentado à Corte pela Defensoria Pública paulista. Barroso achou que era o caso de se imiscuir na própria formulação da política pública, como se fosse bedel do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos).

De acordo com a Defensoria Pública, a possibilidade de policiais ou centros operacionais iniciarem e finalizarem as gravações, entre outras medidas, representa possível retrocesso. Barroso, contudo, considerou que o governo estadual esclareceu todos os “pontos controvertidos” do novo edital. O ministro recebeu Tarcísio e a procuradora-geral do Estado de São Paulo, Inês Maria dos Santos Coimbra, em Brasília, para que sanassem suas dúvidas. Satisfeito, por ora, o magistrado manteve o pregão, mas não sem antes discorrer sobre segurança pública e emitir seus habituais palpites sobre temas alheios à judicatura.

Em despacho, Barroso afirmou que considera “essencial reforçar a importância e a relevância da continuidade da política pública do uso de câmeras corporais por policiais militares”. Ora, em que pese a pertinência de seu juízo, de resto coincidente com o deste jornal, essa é uma prerrogativa do chefe de governo eleito, que deve arcar com os ônus políticos dos erros que eventualmente cometer.

Feita a peroração e à guisa de iluminar sua trilha decisória, Barroso usou os parâmetros da recente portaria editada pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública como baliza de avaliação da nova política de câmeras corporais em São Paulo. “Apesar de a norma estabelecer preferência pela gravação ininterrupta, não há vedação ao uso de modalidade diversa”, escreveu, relatando o óbvio.

Confortou-se, então, ao saber que a licitação de Tarcísio prevê três modelos de gravação, que aparentemente se alinham às diretrizes federais. O presidente do STF, porém, alertou que seguirá vigilante.

Malgrado admitir que ainda não é possível aferir o funcionamento do novo modelo de câmeras adotado, isso não o impedirá de agir. Mencionando o princípio da economicidade, Barroso sublinhou que, apesar de ser legítima a argumentação sobre os custos envolvidos no novo modelo, a análise da efetividade do uso das câmeras não pode ser esquecida. O busílis é que essa avaliação, por óbvio, cabe ao Executivo, não ao Judiciário.

Seis meses após o início do contrato, o governo Tarcísio de Freitas terá de apresentar um relatório a Barroso como uma espécie de prestação de contas. “Em caso de desempenho insatisfatório”, advertiu o ministro, “esta Presidência voltará a atuar.”

A população de São Paulo é plenamente capaz de avaliar os governadores que elege e as instituições paulistas são suficientemente fortes para exercer os devidos freios e contrapesos. Aos juízes, cabe atuar apenas nos limites de suas atribuições.