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Terrorismo não tem outro nome

Manda a decência que o Brasil se alinhe aos países civilizados no repúdio ao ataque do Hamas a civis, e foi o que Lula fez, reafirmando diretriz de uma política externa avessa ao terror

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Por Notas & Informações
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O presidente Lula da Silva felizmente poupou a inteligência alheia ao chamar de terrorismo o que terrorismo é. Diante do assassinato indiscriminado de centenas de civis inocentes em Israel no intervalo de poucas horas, numa covardia que encontra poucos paralelos na história, não restou alternativa a Lula senão se dizer “chocado com os ataques terroristas realizados contra civis em Israel, que causaram numerosas vítimas” e ao repudiar “o terrorismo em todas as suas formas”.

Lula deve ter feito um esforço considerável para publicar essa mensagem nas redes sociais. Não poucos petistas certamente esperavam que seu grande líder divulgasse um comunicado mais ambíguo, cuja leitura resultasse na conclusão de que as vítimas, no caso os israelenses, são responsáveis por seu infortúnio em razão do comportamento pregresso de Israel em relação aos palestinos. Para o chanceler informal de Lula, Celso Amorim, por exemplo, o ataque “vem depois de anos e anos de tratamento discriminatório” por parte de Israel. “O que acabou de acontecer é apenas uma demonstração, grave, com consequências, do que acontece pela perda da esperança na paz”, acrescentou Amorim.

Essa linha de raciocínio é propositalmente enganadora, pois considera que havia alguma “esperança de paz” com o Hamas, o grupo terrorista responsável pelo ataque a Israel. O Hamas não quer nem nunca quis a paz, em primeiro lugar porque a destruição de Israel está em seu estatuto fundador, e em segundo lugar, mas não menos importante, é uma organização satélite do Irã, que igualmente deseja a destruição de Israel. Sem levar em conta essa circunstância nada desprezível, atribuir exclusivamente a Israel a extrema violência de quem pretende aniquilá-lo é, no mínimo, cínico.

Felizmente, o único favor que Lula fez aos cínicos foi omitir o nome do Hamas em seu comunicado. Podia ser pior, considerando-se que o PT, partido do presidente, em nota oficial, conseguiu a proeza não só de omitir o nome do Hamas, mas de ignorar que havia claramente um agressor e um agredido. “O Partido dos Trabalhadores expressa sua preocupação com a recente escalada de violência envolvendo palestinos e israelenses, com diversas vítimas civis, incluindo crianças e idosos”, diz a mensagem, que não faz nenhuma mísera concessão à verdade dos fatos.

Manda a decência que o Brasil se alinhe aos países civilizados no repúdio veemente e sem meias palavras ao ataque deliberado do Hamas contra civis inocentes, e foi o que Lula fez, reafirmando a diretriz de uma política externa avessa ao terror e historicamente defensora da solução pacífica para o conflito entre Israel e Palestina.

O Brasil preside, neste mês, o Conselho de Segurança da ONU, lembrou Lula, ao comprometer-se a não poupar “esforços para evitar a escalada do conflito”. Embora seu poder de influência no conflito entre Israel e Palestina seja limitado, o Brasil mantém-se rigorosamente como defensor da adoção dos termos dos Acordos de Oslo, selados há 30 anos por israelenses e palestinos. Apesar da negligência de ambos os lados e da omissão da comunidade internacional, a construção de um Estado soberano palestino com fronteiras definidas, previsto pelo pacto, tem sido a tônica da política externa brasileira sobre segurança no Oriente Médio.

O pêndulo das duas gestões anteriores de Lula na Presidência pendeu para a causa palestina em razão dos desvios de Israel ao acerto de Oslo e das suas consequências inevitáveis – o domínio tirânico do Hamas sobre a população da Faixa de Gaza, com apoio e financiamento do Irã, e o recrudescimento de sua violência contra os israelenses. Vergou igualmente sob a pressão da militância petista e de uma ala ideológica da diplomacia, ainda presas aos dogmas da guerra fria. No entanto, verdade seja dita, o Brasil dos anos 2000 jamais deixou de preservar sua relação de amizade e de cooperação com Israel.

A condenação de Lula ao terrorismo palestino contra Israel indica a prevalência da maturidade e do bom senso. Não pode haver tergiversação nem cálculo político diante do terror.