Ação de senadores contra procurador e auditor é vingança, dizem entidades

Oliveira admitiu ter compartilhado, em 2015, convocação pela rejeição das contas de Dilma; D'Ávila afirmou ter auxiliado Oliveira a escrever representação que originou processo para analisar pedaladas

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BRASÍLIA - Associações que representam auditores, procuradores e conselheiros de tribunais de contas manifestaram "perplexidade" com a iniciativa de senadores aliados da presidente cassada Dilma Rousseff de representar contra o procurador Júlio Marcelo de Oliveira e o auditor Antônio Carlos d'Ávila Júnior por supostas infrações no exercício de seus cargos e em depoimentos prestados no julgamento do impeachment. Em nota, as entidades classificaram as acusações contra eles de "fantasiosas", "descabidas" e motivadas por "vingança processual".

O procurador do Ministério Público junto Tribunal de Contas da União (TCU) Júlio Marcelo de Oliveira Foto: André Dusek|Estadão

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Oliveira e d'Ávila atuaram em fiscalizações nas quais o Tribunal de Contas da União (TCU) detectou supostas irregularidades na política fiscal do governo da petista, mais tarde usadas para embasar  o processo de cassação do mandato em curso no Senado. Na terça-feira, 30, parlamentares dilmistas decidiram denunciá-los ao Ministério Público Federal e ao Conselho Nacional do Ministério Público e pedir sua responsabilização nas esferas administrativa, cível e criminal, em razão de alegadas violações. Eles alegam que os dois agiram com "prevaricação, falso testemunho, deslealdade às instituições, violação de deveres de imparcialidade e funcionais" no exercício de suas atividades, cabendo a aplicação de sanções a ambos.

O procurador foi arrolado pela acusação como testemunha no impeachment, mas o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski, o declarou suspeito, por possível parcialidade, e decidiu que ele só poderia falar na condição de informante, ou seja, sem que suas declarações pudessem ser usadas como prova. O motivo é que Oliveira admitiu no Senado ter compartilhado no Facebook, em 2015, uma convocação para protesto pela rejeição das contas da presidente afastada, que ocorreria em frente ao TCU.

O auditor do TCU Antônio Carlos Costa D'Ávila Carvalho durante depoimento como testemunha de acusação no julgamento do impeachment Foto: André Dusek/Estadão

Já d'Ávila, ouvido como testemunha da acusação, afirmou ter auxiliado Oliveira a escrever a representação que originou o processo para analisar as pedaladas fiscais de 2014. Mais adiante, ele participou da auditoria que considerou as manobras irregulares. Para os senadores pró-Dilma, o profissional não poderia ter atuado nas duas fases do processo, denunciando e auditados as operações. Os ministros da corte de contas, que atuam como julgadores, concordaram com as conclusões da auditoria e condenaram as pedaladas.

A nota é assinada pela Associação Nacional do Ministério Público de Contas (AMPCON), o Conselho Nacional de Procuradores-Gerais de Contas (CNPGC), a Associação Nacional dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas do Brasil (ANTC),  a Associação da Auditoria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União (AUD-TCU), a Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (ATRICON) e a Associação Contas Abertas. Diz que tanto o procurador quanto o auditor têm legitimidade para, "de forma autônoma, representar possíveis ilegalidades à Corte de Contas e dar início a um processo de investigação", conforme previsto no artigo 237 do Regimento Interno do TCU.

"Dessa forma, demonstra-se absolutamente sem base, fantasiosa e vazia a acusação de que o auditor teria lançado mão de estratagemas com o Ministério Público para depois ele próprio atuar no caso das ‘pedaladas fiscais’", observam as entidades.

O comunicado explica que a função do auditor no TCU é fazer investigação por meio de inspeções, auditorias, representações, diligências e demais procedimentos: "O auditor não é juiz, não julga a auditoria e não está sujeito às regras de impedimento e suspeição da magistratura".

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As associações alegam que é "salutar e necessário" para a efetividade do controle externo que que o Ministério Público de Contas e a área de auditoria atuem de forma articulada e em regime de colaboração.  "Da mesma forma que não há qualquer tipo de suspeição na atuação conjunta entre servidores da Polícia Federal e procuradores da República do MPF, o auditor pode perfeitamente atuar em colaboração com o procurador, porque ambos exercem função de investigação no âmbito do controle externo."

A nota diz ainda ser "absolutamente descabida a acusação de suspeição ou impedimento de Oliveira. "Sua atuação se deu com estrita obediência ao ordenamento jurídico brasileiro, dentro da lei, de acordo com a lei e em favor da lei", sustenta.

Conforme o comunicado, a única manifestação do procurador nas redes sociais sobre as contas anuais de 2014 do governo - que não foram objeto do processo de impeachment - "apenas registrou considerar ele muito adequado que a sociedade brasileira se aproprie da discussão sobre as contas públicas e cobre rigor dos órgãos de controle". "Nem de longe (isso) se confunde com manifestação pró-impeachment ou com atividade político-partidária."

As entidades afirmam não aceitar  a "repressão" contra os agentes de Estado que cumprem seu dever institucional. "Não aceitamos a interdição da verdade e a ‘vingança processual’. A democracia não pode prescindir da voz de todos", acrescentam.