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ANJ vê ''canhestra tentativa de intimidar jornalistas''

Associação Nacional de Jornais repudia criação do blog; para OAB, estatal deveria rever procedimento

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Por Alexandre Rodrigues
Atualização:

A Associação Nacional dos Jornais (ANJ) divulgou nota ontem repudiando a criação do blog da Petrobrás, que tem servido para a divulgação na internet das perguntas enviadas por jornalistas à assessoria de imprensa da companhia antes de as reportagens em elaboração serem publicadas pelos veículos desses profissionais. Para a entidade, a atitude quebra o caráter confidencial que deve ter a correspondência entre os jornalistas e as fontes oficiais da empresa, revelando uma "canhestra tentativa de intimidar" a imprensa. "Como se não bastasse essa prática contrária aos princípios universais de liberdade de imprensa, os e-mails de resposta da assessoria incluem ameaças de processo no caso de suas informações não receberem um ?tratamento adequado?", diz um trecho da nota (veja box), assinada por seu vice-presidente, Júlio César Mesquita, responsável pelo Comitê de Liberdade de Expressão da entidade. Em meio ao noticiário sobre ingerências políticas, suspeitas em contratos e mecanismos de licitação e a criação de uma comissão parlamentar de inquérito no Senado para investigar a Petrobrás, a companhia criou o Blog Fatos e Dados, no qual tem publicado listas de perguntas e respostas encaminhadas por jornais como o Estado, Folha de S. Paulo e O Globo antes da veiculação das reportagens. Na prática, a empresa dá publicidade às pautas dos veículos antes que eles as concretizem. Para o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto, a companhia pode encontrar outras formas de garantir a transparência e a publicação de suas posições em matérias jornalísticas sem quebrar o princípio de exclusividade, que faz parte da essência da atividade. "Não há nada contrário a uma instituição criar um blog como fonte de informação de seu pensamento, é até recomendável. Porém, não é recomendável que se quebrem as cláusulas de exclusividade com os jornalistas. Há uma quebra dos princípios da boa convivência", opinou Britto. Para o dirigente da OAB, a empresa pode não estar buscando desestimular a imprensa a investigá-la, mas produz esse efeito na prática. "Seria bom a Petrobrás rever esse procedimento. A partir do momento em que o jornal não tem a exclusividade, perde o interesse de divulgar como furo jornalístico algumas matérias. Acho que não é uma política correta." Já o presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Maurício Azêdo, atribui a atitude da Petrobrás a falhas recorrentes da imprensa ao contemplar o chamado "outro lado" em reportagens. "Acho que é uma forma de a empresa se proteger de distorções, se acautelar sobre suas respostas que, muitas vezes, são publicadas de forma deturpada. E aí o mal já está feito", afirmou. Azêdo disse que é preciso reconhecer que a imprensa tem flertado com o "denuncismo" e pode estar se deixando usar numa disputa política acirrada que envolve a estatal. "Acho legítimo que os responsáveis pela comunicação da Petrobrás se acautelem. A imprensa precisa ter mais transparência." RESPOSTA A Petrobrás respondeu à nota da ANJ no próprio blog que gerou as críticas da entidade. A empresa disse que "respeita os princípios universais de liberdade de imprensa, tanto que, em nenhum momento, se esquivou de responder às perguntas enviadas, de forma direta e clara". Sobre a polêmica que envolve a divulgação prévia das pautas de órgãos de comunicação, a Petrobrás disse não ter compromisso de confidencialidade com jornalistas. "Isso limitaria o próprio caráter público e aberto da informação". A empresa negou ter ameaçado processar jornalistas. "A Petrobrás respeita a imprensa e jamais faria ou fez qualquer ameaça a jornalistas ou jornais. A nota (da ANJ) se refere, na verdade, a uma mensagem de segurança padrão e automática, sem qualquer vínculo com o relacionamento com a imprensa e veiculada há anos na correspondência eletrônica emitida a partir do correio eletrônico da Petrobrás." ÍNTEGRA DA NOTA A Associação Nacional de Jornais (ANJ) manifesta seu repúdio pela atitude antiética e esquiva com que a Petrobrás vem tratando os questionamentos que lhe são dirigidos pelos jornais brasileiros, em particular por O Globo, Folha de S.Paulo e O Estado de S.Paulo, que nas últimas semanas publicaram reportagens sobre evidências de irregularidades e de favorecimento político em contratos assinados pela estatal e suas controladas. Numa canhestra tentativa de intimidar jornais e jornalistas, a empresa criou um blog no qual divulga as perguntas enviadas à sua assessoria de imprensa pelos jornalistas antes mesmo de publicadas as matérias às quais se referem, numa inaceitável quebra da confidencialidade que deve orientar a relação entre jornalistas e suas fontes. Como se não bastasse essa prática contrária aos princípios universais de liberdade de imprensa, os e-mails de resposta da assessoria incluem ameaças de processo no caso de suas informações não receberem um "tratamento adequado". Tal advertência intimidatória, mais que um desrespeito aos profissionais de imprensa, configura uma violação do direito da sociedade a ser livremente informada, pois evidencia uma política de comunicação que visa a tutelar a opinião pública, negando-se ao democrático escrutínio de seus atos. Júlio César Mesquita, vice-presidente da ANJ e responsável pelo Comitê de Liberdade de Expressão

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