O Coronavírus mudou a rotina das pessoas, principalmente no que se refere aos seus hábitos alimentares. Se antes do covid 19 já tínhamos problemas com o crescimento da obesidade e de distúrbios alimentares em jovens, crianças e idosos, esse fato se acentuou no último ano. Em 2020 e ainda agora em 2021 atravessamos um período de muitas incertezas. Muitos, isolados, achavam que cuidar da saúde física e mental não era uma prioridade. Bastava ficar em casa para sobreviver ao vírus.
Mas vimos que isso não é verdade. Precisamos sempre lembrar que não existe ainda cura para o vírus e temos agora a imunização pela vacina que ainda demora em nos proteger 100%. Até agora, o que sabemos é ainda da necessidade de manter o isolamento social, usar máscara e continuar as medidas higiênicas como lavar as mãos com água e sabão e passar álcool gel. Entretanto, é importante lembrar que uma boa alimentação e evitar o sedentarismo é que vai manter nosso sistema imunológico equilibrado.
O ponto crucial é tentar manter o padrão alimentar o mais saudável possível. Isso inclui refeições ricas em legumes, verduras, frutas, alimentos integrais e sempre minimizando ingestão de açúcar e industrializados. As pessoas precisam focar em comida de verdade! Porém, pesquisas recentes mostraram que os brasileiros se descuidaram disso nesse período. Um estudo transversal realizado no Brasil com dados do inquérito de saúde virtual 'ConVid, Pesquisa de Comportamentos'Fundação, Instituto Oswaldo Cruz (Fiocruz) em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), no período 24 de abril a 24 de maio de 2020, mostrou que houve um aumento no consumo de alimentos ultraprocessados e de alta densidade energética, como batatas fritas, chocolates e sorvetes.
Alimentos ricos em açúcares, gorduras e calorias, além de conservantes e sal, resultam em prejuízos para a saúde, como aumento da obesidade, hipertensão e doenças cardiovasculares. Foi constatado também um aumento do número de cigarros fumados por dia e um grande consumo de bebida alcoólica, possivelmente associada aos efeitos e estressores do confinamento, como tristeza e ansiedade, medos relativos ao futuro, insegurança no emprego e risco de morte. Os pesquisadores relataram uma diminuição das práticas de atividades físicas e crescimento do comportamento sedentário com o tempo ocupado com a TV, tablet e computadores. Vale lembrar que todos esses comportamentos são propícios ao aparecimento de doenças cardiovasculares.
Na minha prática clínica, tenho notado que houve muita dificuldade em manter um estilo de vida saudável em todas as faixas etárias. Uma diminuição do consumo de frutas, verduras e legumes e um aumento da ingestão dos produtos ultraprocessados. Uma dieta, pobre em frutas e vegetais, está sendo frequentemente relatada durante o isolamento, apesar da relevância da ingestão de micronutrientes na manutenção da atividade imunológica. Além do excesso de peso, a má alimentação pode desencadear outros fatores que aumentam o estado inflamatório, levando indivíduos que não eram do grupo de risco a se tornarem, e piorando o quadro daqueles com doença prévia.
Tenho recebido muitas crianças, por indicação dos pediatras, com excesso de peso, dislipidemia e risco de desenvolvimento da diabetes. As pessoas, de uma maneira geral, tiveram um ganho de 15 quilos em média no período.No que concerne, a redução da prática de atividade física e o aumento do comportamento sedentário. É importante ressaltar que a redução de atividade física pode provocar uma rápida deterioração da saúde cardiovascular e mortes prematuras entre populações com maior risco de enfermidades do coração. Houve também uma diminuição da exposição ao sol, que pode gerar deficiência de vitamina D. Devido a importância dessa vitamina para atividade imunológica e saúde geral, a suplementação deve ser considerada. Existem outras vitaminas importantes, como o Zinco, aliado da imunidade, que pode ser encontrado em aves, carne vermelha, nozes, sementes de abóbora e de gergelim, feijão e lentilhas.Beta-caroteno está abundante na batata-doce, cenoura e vegetais de folhas verdes.Fontes de vitamina C incluem laranja, morango, manga, limão, goiaba e pimentão vermelho.Fontes dietéticas de vitamina E são nozes, sementes, espinafre e brócolis.
A má alimentação e a falta de atividades físicas trouxeram problemas para o intestino, que acaba acarretando um desequilíbrio em todo o corpo. Sabemos que o intestino está intimamente ligado a neurotransmissores cerebrais. O mau funcionamento do mesmo traz uma série de descompensações, que podem levar até ao surgimento de uma depressão.Deve-se também ter cuidado com a qualidade do sono, que pode impactar a saúde física e mental e vice-versa. Alimentos que contenham triptofano, como carnes, semente de abóbora e leguminosas promovem a síntese de serotonina e melatonina. As raízes, folhas, frutas e sementes, como amêndoas, bananas e aveia devem ser consideradas. Ao modular o ambiente intestinal, a nutrição pode diminuir a inflamação, aumentar a síntese de serotonina , atuando na prevenção e progressão de distúrbios psiquiátricos, como ansiedade e depressão.
A inflamação crônica, que acompanha a obesidade e a síndrome metabólica, leva à produção anormal de citocinas e ao aumento dos reagentes de fase aguda. Pacientes com obesidade têm maior expressão de citocinas pró-inflamatórias, como TNF-?, IL-1 e IL-6.É provável que a junção das respostas inflamatórias da obesidade e do COVID-19 contribuam para severidade e gravidade nos casos da doença.Condições crônicas como diabetes, hipertensão e doenças cardíacas estão associadas à gravidade do coronavírus. O excesso de gordura em si é um fator de risco significativo, pois afeta negativamente a função imunológica e os mecanismos de defesa.
O pesquisador Jones DS comentou no New EnglandJournalof Medicine: "Talvez a lição mais importante para o mundo seja o controle contínuo da nossa saúde metabólica, pois a prevenção de infecções por meio de um sistema imunológico saudável está fortemente associada a um estilo de vida saudável."
Além do papel conhecido de um estilo de vida saudável para prevenção de doenças crônicas, a desregulação metabólica provocada pelo excesso de gordura pode comprometer o sistema imunológico e aumentar o risco de infecções e doenças respiratórias.
*Ana Paula Cony, nutricionista da Clínica Neurovida